É hora de reivindicar


Por Verlan Valle Gaspar Neto, Colaborador

21/06/2018 às 07h00

Há quem diga que vivemos o apogeu das reivindicações. Reivindica-se tudo hoje em dia, porque, ao que parece, todo mundo tem algo a reivindicar. Eu, cá com os meus botões, que não sou todo mundo, mas que, feliz ou infelizmente, faço parte do mundo, quero aproveitar a onda e também reivindicar. E o que eu quero reivindicar não é nada absurdo. Eu quero reivindicar o direito à mediocridade.

“Você só pode estar brincando”, dirão os mais afoitos. Não é brincadeira. Mediocridade é coisa séria! Quero reivindicar o direito de ser medíocre sem ser importunado pelos “esclarecidos”. Basta de opressão! A mediocridade não pode mais ser uma categoria de acusação. Isso tem nome. No jargão atual se chama bullying. Mediocridade é uma condição a ser respeitada. Não sei se nós, os medíocres, nesse país, compomos um nano, micro, mini, macro ou megauniverso. Pouco me importam as escalas, odeio matemática. O que me importa mesmo é ser respeitado no meu direito de exercer a mediocridade.

PUBLICIDADE

Eu tenho o direito de, por exemplo, vir a público e lançar mão do ataque pessoal em vez de argumentar, inclusive usando perfil falso nas redes sociais. Argumentos para que, cara pálida? O importante é lacrar, outro jargão atual. Argumentos é para quem lê, estuda e se sensibiliza com os problemas alheios. Deus me livre! Tenho horror a gente com argumento.

Gente com argumento defende, entre outras coisas, que vivemos sob um regime econômico neoliberal. Gente com argumento defende os Direitos Humanos. E daí, senhoras e senhores? E daí se, ao olhar para os países europeus, eu nutro inveja dos seus sistemas de bem-estar social e chamo de bolivarianismo quando se ensaia fazer o mesmo aqui? E daí se a Declaração Universal dos Direitos do Homem é um tratado internacional, inspirado numa revolução liberal e burguesa do século XVIII, e aqui eu chamo de desculpa comunista para defender bandidos? E daí se a Terra é redonda? Eu prefiro ela plana como a tela da minha smart tv. Não quero saber! Sequer suporto conhecimentos gerais, que dirá arte, ciência, política e filosofia. Sou um cidadão do meu tempo, tenho Ph.D. em entretenimento. Tudo o que eu sei cabe em 140 caracteres.

Vejam, senhoras e senhores. Eu já faço muito. Sou um cidadão de bem, o que significa que trabalho, pago os impostos que não consigo sonegar, tenho família e religião. Se patrão, pago até salário mínimo! E, acima de tudo, sou consumidor. É meu direito consumir TV aberta ou fechada e só assistir a novelas, esporte, culinária e reality shows. É um direito meu só ter lido “Cinquenta Tons de Cinza” e achar que o filme homônimo representa o ápice do primor artístico. É um direito meu sonhar com Miami.

Não me exijam muito. Respeitem-me. Porque é um direito meu atacar quem eu quiser, sem quaisquer argumentos ou fundamentos. E é um direito meu me vestir de verde e amarelo, defender a volta da ditadura militar e, como faço no dia a dia, dizer a todos que é melhor “já ir se acostumando” e que “fiquem com Deus”.

Este espaço é livre para a circulação de ideias e a Tribuna respeita a pluralidade de opiniões. Os artigos para essa seção serão recebidos por e-mail (leitores@tribunademinas.com.br) e devem ter, no máximo, 35 linhas (de 70 caracteres) com identificação do autor e telefone de contato. O envio da foto é facultativo e pode ser feito pelo mesmo endereço de e-mail.

O conteúdo continua após o anúncio

Os comentários nas postagens e os conteúdos dos colunistas não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir comentários que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.