Oficinas, dança e curta para refletir sobre a arte com acessibilidade

Espaço OAndarDeBaixo realiza o evento ‘Arte do afeto’ neste fim de semana


Por Júlio Black

04/05/2018 às 07h00

Curta de Lilian Werneck, “Móbile Haikai” foi premiado no TP Cine e foi a primeira produção audiovisual de JF com recursos de acessibilidade (Foto: Divulgação)

Para a arte ser acessível a todos, é necessário mais que um espaço bem localizado, confortável, seguro, com boa estrutura e acessibilidade como rampas e espaço para cadeirantes. Foi o que mostrou, por exemplo, o espetáculo “Ninguém mais vai ser bonzinho”, exibido no Teatro Paschoal Carlos Magno em 26 de abril, que contava com nada menos que dez recursos para pessoas com deficiência. Mas a preocupação com esse público vai além, como mostram o curta “Móbile Haikai”, produzido em Juiz de Fora, e o espetáculo de dança “E a cor a gente imagina”, de Belo Horizonte. Ambos poderão ser conferidos neste final de semana no Espaço OAndarDeBaixo, que realiza no sábado (5) e domingo (6) o evento “Arte do afeto”, em que as duas atrações contam com recursos de acessibilidade. Além das apresentações, o espaço também será aberto para três oficinas, sendo que todos os eventos têm entrada franca.

No sábado, às 9h30, haverá oficina de sensibilização corporal com o bailarino Oscar Capucho, que é deficiente visual, com a utilização do recurso de audiodescrição. O objetivo é aguçar os sentidos além da visão e trabalhar a espacialidade através de elementos da dança e do teatro, e por isso as pessoas videntes (com capacidade de visão) utilizarão vendas. Já o espetáculo “E a cor a gente imagina” será apresentado às 20h, sendo que as senhas começam a ser distribuídas uma hora antes. A apresentação, que além de Oscar Capucho conta com o bailarino e coreógrafo Victor Alves, utiliza a dança e a crônica poética para responder às perguntas às quais os cegos são submetidos, dialogando sobre as diferenças e as relações entre o corpo que enxerga e o corpo cego num mundo em que o visual é predominante. Para o espetáculo, serão disponibilizados os recursos de audiodescrição (AD) e Legendagem para Surdos e Ensurdecidos (LSE).

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No domingo, às 9h30, Victor Alves vai ministrar oficina de expressão corporal no Espaço Estação Cultural, na Praça da Estação. Mais tarde, às 16h, n’OAndarDeBaixo, Lilian Werneck, Patrícia Almeida e Ana Carolina Durante realizam a oficina de acessibilidade na produção audiovisual, com a utilização de audiodescrição e LSE. Elas vão falar sobre a preocupação da acessibilidade no audiovisual. “Não será uma oficina prática, e sim uma roda de conversa para troca de conteúdo com todo o público, explicar como foi produzir o filme com foco na acessibilidade”, adianta Lilian.

Oscar Capucho e Victor Alves apresentam espetáculo de dança que mostram as diferenças entre um corpo cego e um que enxerga num mundo predominantemente visual (Foto: Gopala Deva/Divulgação)

Amor em todos os sentidos

Depois da oficina, será feita a exibição, às 19h, de “Móbile Haikai”, produção que recebeu o apoio da Lei Murilo Mendes e que ganhou no último final de semana o prêmio de melhor média-metragem do júri oficial do festival TP Cine, realizado em Três Pontas, além de uma indicação a melhor roteiro. Na história, duas mulheres (interpretadas por uma atriz com deficiência visual, e outra com deficiência auditiva) se apaixonam e desenvolvem uma relação marcada pelas mais diversas sensações. Foi a primeira produção audiovisual da cidade feita com os recursos de audiodescrição e Legendagem para Surdos e Ensurdecidos. A classificação indicativa é de 14 anos.

“Não tinha sentido fazer um filme que retratasse personagens em que o público não pudesse se sentir retratado. Procurei saber quais são as especificidades dessas pessoas, e a partir dessa pesquisa procuramos inserir os recursos (AD e LSE) depois do filme já gravado, para retratarmos com mais realidade essa história”, conta Lilian, acrescentando que para a exibição de domingo foram contratadas duas intérpretes de Libras (Linguagem Brasileira de Sinais), que também trabalharão na oficina. A ideia é também inserir, no futuro, o recurso diretamente no filme.

Inserção e imersão de um novo público

De acordo com o organizador do evento, Vinícius Cristóvão, a “Arte do afeto” surgiu de uma preocupação sua de fazer a arte chegar a um maior número de pessoas, e que acabou por atrair artistas com preocupações parecidas. “Foi dessa forma que chegou até mim o trabalho do Victor Alves, que procurava um local para se apresentar em Juiz de Fora. Isso despertou nossa preocupação da arte alcançar mais pessoas, e vimos a oportunidade de fazer algo mais. Lembrei do curta metragem da Lilian Werneck, em que trabalhei como ator e preparador de elenco, e resolvemos convidar os dois e criar esse evento. Montamos um final de semana que ocupasse o espaço com uma reflexão sobre a acessibilidade, incluindo aí as oficinas, a fim de juntar informação com as atrações.”

Para Vinícius, é primordial que as expressões artísticas se adaptem a essa nova realidade da inclusão, um desafio que ele tem considerado também um grande aprendizado. “Temos inicialmente a questão da consciência, de virar essa chave e inserir a acessibilidade nos espetáculos, gostaríamos muito que este se tornasse um evento anual. Inseri-la significa também trabalhar a concepção da própria arte. E pensar mais nessas questões de forma prática, pois audiodescrição e Libras geram custos e são coisas que não costumamos colocar nas rubricas dos projetos”, lembra. “E é algo que precisamos ter, é determinado por lei.”

Lilian Werneck reforça, por sua vez, a importância de tornar os produtos culturais mais acessíveis. “Como é uma produção com o apoio da Lei Murilo Mendes, já é mais que importante termos um retorno. E queremos oferecer essa contrapartida num nível mais acessível para todos os públicos, e OAndarDeBaixo nos oportunizou esse encontro. Quanto maior a acessibilidade, maior o público que pode assisti-lo, senti-lo, permitindo que cada um possa ter um filme só seu. Esperamos, assim, que os demais artistas tenham a preocupação de pensar na acessibilidade, seja com um filme, um livro. Qualquer tentativa de tornar a arte mais acessível é válida.”

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Arte do afeto
Neste sábado (5), às 20h, espetáculo de dança “E a cor a gente imagina”, e no domingo (6), às 19h, exibição do curta “Móbile Haikai”, no espaço OAndarDeBaixo (Rua Floriano Peixoto 37)

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