Quando a paixão pelo esporte cabe no coração

Jovens do Futebol UFJF realizam exames cardiológicos antes de iniciar competição estadual, e Serviço de Cardiologia do HU-UFJF destaca a importância de check up antes de começar exercícios físicos


Por Bruno Kaehler

25/03/2018 às 07h00

João Victor Moreira, 15 anos, é um dos 69 adolescentes do projeto Futebol UFJF que fez exames cardiológicos no HU (Foto: Leonardo Costa)

“A prática esportiva, em geral, é saudável para todos. Mas existe um grupo de pessoas que, por ter nascido com algum problema na parte cardiovascular, corre o risco de ter uma arritmia e, eventualmente, até uma morte súbita durante a atividade se a prática for excessiva antes de tratar a doença.” A constatação do médico responsável pelo Serviço de Cardiologia do Hospital Universitário (HU) Santa Catarina, Hélio Brito, serve de alerta aos praticantes de atividades físicas, amadores ou profissionais.

É justamente com foco nessa questão que, a pedido da Federação Mineira de Futebol (FMF), que condicionou a inscrição de atletas para o Campeonato Mineiro à apresentação de atestado cardiológico, a equipe de base do Futebol UFJF, projeto de extensão da Federal, levou 69 adolescentes, entre 14 e 17 anos, para realizar exames cardiológicos na unidade do HU entre 12 e 16 de março. Dos jovens avaliados, seis precisaram de exames complementares de ecocardiografia, sem restrição posterior para a prática esportiva. A parceria na iniciativa objetivou ratificar aos pais e responsáveis pelos meninos a necessidade da avaliação cardiológica antes do início de qualquer atividade física.

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“Já existia uma parceria entre a Faculdade de Educação Física (Faefid) e o serviço de Cardiologia do HU. A prática regular de atividades físicas, sabidamente, faz parte das recomendações de qualquer especialidade médica. O exercício físico regular ajuda a reduzir peso, regular a glicose de diabéticos, baixar a pressão arterial de que é hipertenso, melhora o condicionamento físico geral, o bem-estar, reduz depressão e os fatores de riscos por doenças cardiovasculares. Mas, se a pessoa nasceu com alguma doença no coração ou algumas doenças cardíacas, ou seja, são doenças muitas vezes hereditárias e congênitas, pode ser deflagrada uma arritmia que pode ser fatal durante uma prática de atividade esportiva”, reitera Brito. O HU segue diretrizes das sociedades europeia e brasileira de cardiologia que recomendam aos esportistas iniciantes ao menos um eletrocardiograma.

Coordenador do projeto que irá participar novamente do Estadual de futebol base este ano, Marcelo Matta lembra que em 2017 um dos alunos teve que deixar a equipe após exame. “É uma preocupação nossa e exigência de CBF e FMF. Para que os atletas sejam registrados, existe a necessidade da liberação do médico. Exigem o exame clínico e cardíaco, e lógico que salvaguarda o projeto. Neste ano não tivemos proibição, mas no último tivemos um atleta. Na ocasião, detectaram uma fibrose miocárdica, pequeno problema que necessitava de tratamentos mais aprofundados”, relembra.

Alívio e segurança para atletas e suas famílias

A Tribuna foi até a unidade do Santa Catarina do HU e acompanhou parte dos atendimentos da equipe médica. Um dos primeiros a ser recepcionado foi o jovem Victor Hugo, 16 anos. À Tribuna, o volante da UFJF comemorou a oportunidade. “É uma tranquilidade a mais que tenho, me faz ter certeza de que posso dar a minha vida dentro de campo. Isso é muito importante para todos os atletas”, conta Victor, que se inspira no tio, Cleber Maia, e no volante da Seleção Brasileira e do Real Madrid, Casemiro. Ele foi acompanhado da mãe, Lúcia Helena Maia.

“Acho uma iniciativa como essa muito importante porque nos deixa mais seguros para que eles possam fazer as corridas, jogar futebol. Nos dá um conforto. Ele é apaixonado por futebol, tudo no dia dele tem o esporte, o que faz ele não ir para a rua. É um sonho que ele tem seguir como jogador, então vira meu sonho também”, destaca ela.

Pai do jovem de 15 anos, João Victor Moreira, o porteiro Emerson Santos também valorizou o projeto da Federal e lembrou, ainda, a escassez de acompanhamento médico em outros times juiz-foranos. “A equipe primeiro tira os garotos da rua para praticar esportes e, em segundo lugar, dá oportunidade aos meninos de realizarem sonhos de infância, com um acompanhamento que outros clubes da cidade ainda não têm. Como pai me sinto mais tranquilo. Fico ansioso para ver se meu filho vai poder continuar e quando o exame mostra que está tudo bem, fico ainda mais feliz.”

Processo em três etapas

Anamnese (entrevista), exames clínicos e exames físicos. Estas são as três fases da avaliação básica realizada pelo HU junto aos atletas. Aprovados sem alterações nos exames, os jovens, de acordo com o cardiologista Hélio Brito, não precisam de um novo atestado em período entre dois e cinco anos. O chefe do Serviço de Cardiologia do hospital explicou o procedimento adotado com cada um dos atletas. O primeiro passo é uma entrevista.

“Esta avaliação é feita por um cardiologista. É uma anamnese, a gente conversa com o atleta, com a mãe ou o responsável por ele, que por ser jovem às vezes não expressa tudo o que precisa, ou por receio de sentir algo e não querer se afastar do esporte. Tentamos procurar algum sintoma pelo histórico, entre eles desmaio, tontura, sensação de disparo do coração e falta de ar”, conta. Em seguida, os exames clínico e físico são feitos.

“Nos exames físicos, damos atenção especial à parte cardiovascular. Vamos checar se os pulsos estão corretos, uma ausculta cardíaca para ver se o ritmo está regular e procuramos a presença de sopros. Se houver, precisamos analisar melhor. Mas existem sopros inocentes. O tórax do jovem é tão delgado, magrinho, e a posição do coração é tão encostada na parede do tórax, que às vezes a gente consegue auscultar o fluxo de sangue passando por dentro do coração e na válvula, mas não necessariamente aquilo é uma doença na válvula. Mas sabemos tudo isso com os exames. E, no final, terminamos fazendo um eletrocardiograma, exame simples”, esmiuça.

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Especialista faz alerta para atletas de fim de semana

Para aprofundar o tema, a Tribuna conversou com o cardiologista Antônio Muniz, especialista em hemodinâmica, cardiologia intervencionista, cardiopatias estruturais e cardiologia clínica, responsável por estudos sobre os riscos de problema de coração que atletas de fim de semana possuem, ao reservarem parte dos sábados e domingos para o exercício em diferentes intensidades. Ele cita que atletas de fins de semana têm 2,7 vezes mais riscos de desenvolver um problema cardíaco por sobrecarga sem preparo físico e faz alguns alertas (ver quadro) aos esportistas iniciantes, sedentários ou não.

“Normalmente atendo atletas de caminhada, da tradicional pelada, com impacto na saúde por não terem feito uma avaliação prévia. Esse indivíduo que realiza atividades físicas intensas pode aumentar os riscos de infarto do miocárdio e até mesmo de morte súbita. É fundamental que a pessoa passe por um exame cardiorrespiratório para avaliação dos hábitos alimentares, já que o sedentarismo pode carregar consigo uma série de problemas ocultos que podem surgir de uma hora para outra, inclusive durante as atividades físicas”, destaca.

Para Muniz, as pessoas devem realizar um check-up ao menos uma vez por ano se não tiverem alguma. “Aquele que é doente já faz a checagem. Mas quem não tem nada, anualmente deve-se fazer um teste de esteira, um eletrocardiograma, exames básicos”, aponta. Seja qual atividade for, toda cuidado é pouco. “O importante é se exercitar com o propósito de fazer isso para o melhor da sua saúde, seja nos finais de semana ou não. Se a pessoa tiver consciência que precisa checar a saúde antes de realizar as atividades, tudo melhora”, reitera.

Entrevista de atleta com médico: “É uma tranquilidade a mais que tenho, me faz ter certeza de que posso dar a minha vida dentro de campo”, diz Victor Hugo, 16 anos (Foto: Leonardo Costa)

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