UFJF vai debater critérios para verificar autodeclaração racial

Além da banca que só deve começar a atuar no próximo processo seletivo, universidade atua em outra frente para apurar as denúncias de fraude


Por Renan Ribeiro

02/03/2018 às 07h00- Atualizada 02/03/2018 às 20h29

O diálogo entre a Diretoria de Ações Afirmativas (Diaaf) da UFJF e os movimentos sociais estudantis continua a respeito das cotas. Juntos, estudantes e militantes aprofundam os estudos sobre a composição da banca de verificação da autodeclaração racial, confirmada pela universidade. A banca fará uma avaliação do estudante cotista a partir da entrada dele na instituição. Ela comprovaria a autenticidade do documento assinado pelo candidato, a partir de critérios estabelecidos em conjunto, pela UFJF e pelos coletivos.

“Queremos apresentar algumas propostas, para que possamos partir para a discussão dos critérios dessas bancas. Estamos dialogando nesse sentido e acompanhando os casos de denúncias. Com o término das matrículas, os casos poderão ser averiguados”, destacou a integrante do coletivo Afronte e da coordenação executiva do Diretório Central dos Estudantes (DCE), Ana Emília Carvalho. Outras questões também têm sido discutidas pelos alunos, como a situação de pessoas que já ingressaram na UFJF pelas cotas PPI (pretos, pardos e indígenas) e sociais, sem fazer jus a essas vagas e estão com o curso em andamento. De acordo com Ana Emília, a dificuldade seria a forma como essas vagas seriam restituídas aos estudantes que atendem aos requisitos.

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Em entrevista à Rádio CBN Juiz de Fora, o diretor de Ações Afirmativas da UFJF, Julvan Moreira, reforçou que a comissão deve atuar a partir da próxima seleção, para o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e do Programa de Ingresso Seletivo Misto (Pism) e que os critérios precisam ser definidos com muito cuidado.

Investigação
O diretor de Ações Afirmativas esclareceu ainda como se dá a investigação: “O que acontece atualmente é que denúncias recebidas pela Ouvidoria são encaminhadas para a Diretoria de Ações Afirmativas (Diaaf) e para a Pró- Reitoria de Graduação, e, no caso delas, são abertas comissões de investigação, e esses grupos de servidores e técnicos verificam se elas são procedentes ou não. Alguns são deferidos, outros não. Mas quando são, abre-se um processo administrativo.”

A integrante da Organização de Mulheres Negras e Conhecimento (Candaces), Sheila Cristina Gonçalves, reitera que para que as pessoas pretas, pardas e indígenas sejam efetivamente inseridas no meio acadêmico, as investigações e a composição da comissão são os primeiros passos. Ela aponta que há uma dificuldade de detectar quem realmente é negro no país. “Se a mãe de um candidato é negra, e ele não é, ele pode se declarar negro e ingressar. Mas negro é quem está passível de sofrer preconceito por conta de uma série de questões. Mesmo não se enquadrando nesse entendimento, as pessoas entram nessas vagas. Por isso a banca é importante. Além disso, ela pode amparar estudos futuros sobre as cotas.”

Denúncias anteriores

Além das queixas que chegaram à UFJF na última edição da seleção, um grupo formado por estudantes secundaristas formalizou uma denúncia em 2016. Participantes contaram que buscavam informações básicas para uma pesquisa de vestibulando, como ponto de corte e quem eram os veteranos. No processo, eles perceberam que, dentro de suas opções de cursos, não havia alunos negros. “Ficamos assustados e nos sentimos lesados. Buscamos o contato com uma advogada, redigimos um documento, reunimos fotos e entregamos à Diaaf. Tivemos algumas reuniões, mas não sabemos o que aconteceu depois.” Os proponentes da denúncia preferiram não ser identificados, para evitar represálias. “Agora há uma pressão maior, mas essas denúncias ainda são muito veladas, e é algo facilmente perceptível”, destaca.

Outro estudante que também participou da denúncia reforça que é preciso averiguar a autodeclaração, assim como já é feito na Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “A comissão de verificação é o primeiro passo. Ainda não sabemos o quão distante estamos do cumprimento das cotas. Em alguns grupos nas redes sociais, quem foi aprovado de forma irregular está comemorando, como se nada fosse acontecer, e isso é um absurdo,” lamentou.

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De acordo com a integrante da Organização de Mulheres Negras e Conhecimento (Candaces), Sheila Cristina Gonçalves, as denúncias só acontecem agora, tão tardiamente, por estarem sendo incentivadas pelo movimento negro, que está mais fortalecido. “Os negros militantes começaram a questionar. Há uma dificuldade de entender que aquela vaga é para você, que aquele espaço é seu. Mas quem entra pelas cotas, também passa pelo processo seletivo, também estuda. Por isso, é importante dar voz às denúncias, investigá-las e começar a tomar as medidas cabíveis, para que essas vagas sejam realmente ocupadas por pessoas pretas, pardas ou indígenas.” Outro ponto que deve receber atenção nesse ano, conforme Sheila, é o início das cotas na pós-graduação. “Queremos acompanhar como vai ocorrer esse processo e como ele vai funcionar.”

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