Mulheres querem mais opções de peças plus size

Mulheres com curvas e volumes apontam que contemplar diferentes estilos e promover a inclusão são os grandes desafios da moda em JF


Por Julia Campos

06/08/2017 às 06h00- Atualizada 07/08/2017 às 09h04

Tatuadora Jéssie Syon, 24 anos, que gosta de usar leggings, camisetas e algumas peças jeans, como coletes (Foto: Marcelo Ribeiro)
por Julia Campos, estagiária, sob supervisão da editora Carla Duailibi

Estilos e personalidades totalmente diferentes, um desejo em comum: mais opções de peças plus size. Mulheres que vestem manequins acima do 46 relatam dificuldade de encontrar peças de tamanhos maiores no mercado juiz-forano e com estilo, além de atendimento precário das lojas. A situação, segundo três consumidoras ouvidas pela Tribuna, reflete a falta de inclusão que essa fatia do mercado enfrenta na cidade, já que há potencial e público consumidor para mudar esse cenário.

“Pra mim, que uso manequim 56, é realmente muito difícil encontrar roupas que me agradam e com bom caimento. Muitas vezes tenho que customizar ou reformar a peça por conta das confecções que pensam simplesmente em cobrir o corpo de pessoas do meu tamanho. Atualmente eu tenho apenas uma loja na cidade pra comprar, mas não tem um valor acessível. Enfim, não existem lojas e roupas suficientes nesse segmento pra me atender.” É o que conta a tatuadora Jéssie Syon, 24 anos, que gosta de usar leggings, camisetas e algumas peças jeans, como coletes. Como alternativa, ela procura algumas lojas na internet que disponibilizam peças que a agradem, mas diz ainda ter receio de efetuar a compra on-line, já que os tamanhos variam muito de confecção para confecção. “Você entra numa loja e, quando te atendem bem, já é uma vitória. Não ter nada que você gostou te servindo é horrível. A gente fica refém do que cabe”, pontua.

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Blogueira vê moda como inclusão
Já a blogueira Kalli Fonseca, 33, vê a moda plus size como fator de inclusão dos gordos. “É muito comum, infelizmente, vermos mulheres que deixam de ir a eventos por não achar nada adequado que sirva, isso eu falo considerando que ela possa pagar, e, muitas vezes, simplesmente não existe uma calça jeans que vista bem.” Para ela, o valor das peças plus size também é um ponto a ser reavaliado. “Se considerarmos ainda a questão econômica, a moda plus size precisa urgentemente se tornar mais acessível. Procurando se encontra praticamente tudo, no entanto, ainda tem preços elevados em 90% das lojas”, avalia. Sobre o mercado plus size juiz-forano, a blogueira, que é de São João Nepomuceno, diz que sim, há mais opções atualmente, mas acredita que a cidade tem potencial e público consumidor para ter ainda mais opções. “As melhores marcas/lojas da cidade ainda trabalham com uma grade limitada ao 54, e quem veste tamanho maior muitas vezes não encontra opções”, diz.

“As pessoas gordas ainda não se veem representadas na mídia tradicional”, Kalli Fonseca, 33 anos (Foto: Marcelo Ribeiro)

Em seu blog, o Beleza sem Tamanho, que tem cerca de cem mil acessos mensais, Kalli fala sobre moda, comportamento, autoestima e gordofobia. Ela acredita que o blog age como ferramenta de notabilidade e identificação. “As pessoas gordas ainda não encontram representatividade na mídia tradicional, é através dos blogs que elas muitas vezes têm o primeiro contato visual com um corpo parecido com o seu e entende que o corpo gordo é só um corpo gordo e ainda assim é possível fazer tudo que quiser como qualquer outra pessoa. O que a gente busca é inclusão total na moda, e não necessariamente aprovação. Independente do que alguém possa achar ou não, é importante que exista a moda que veste corpos gordos”, conclui.

‘Pessoas gordas querem se vestir bem’

Estudante Beatriz Lima, 24, diz que a moda tem o poder de influenciar a autoestima das pessoas (Foto: Fernando Priamo)

A estudante Beatriz Lima, 24, pensa que falta incentivo ao mercado plus size da cidade. “Acho que falta principalmente lugares que atendam uma moda mais antenada. Sendo uma cidade universitária, aqui tem muita gente jovem, e temos diferentes tipos de corpo. É muito ruim entrar em uma loja que se propõe à atender o público plus size, mas tem numerações pequenas, que a gente já encontra nas lojas pra gente magra. Lingerie e roupas pra prática de esportes então, nem se fala. Sempre que tentei comprar roupas em loja de rua passei decepção. Ou o atendimento é ruim, ou as peças são muito fora do meu estilo”, comenta. Ela acredita que essa falta de incentivo se deve à falsa ideia de que o mercado plus size é pouco lucrativo, e argumenta: “Pessoas gordas estão em todos os lugares e querem se vestir bem e com opções escolha, portanto, expandir esse mercado local pode ser muito proveitoso para comerciantes e consumidores também.”

A estudante, que veste manequim 52/54, diz que a moda influencia até mesmo as relações pessoais. “A moda tem o poder de influenciar na nossa autoestima, e, consequentemente, na maneira como nos relacionamos com os outros, as roupas podem nos tornar confiantes ou nos deixar incomodados se não nos caem bem”, ressalta.

Mercado está em crescimento, mas falta diálogo, diz lojista

A empresária do ramo Fernanda Dalvas conta que sua loja nasceu de uma pequena linha plus size que comercializava em sua outra marca, que trabalha com tamanhos considerados “padrões”. Ela conta que, atualmente, fabrica 60% das roupas que vende na loja, que oferece peças do 46 ao 54. Sobre os primeiros desafios de lançar uma marca plus size, a empresária diz que não entendia bem o conceito quando lançou a marca. “Existia uma idéia de que a cliente queria esconder suas curvas, parecer mais magra, e na verdade isso é equivocado demais”.

Para driblar esse falso conceito, Fernanda passou a investir em peças que realçam as curvas femininas, estampas jovens e recortes mais modernos. A empresária diz que conseguiu decifrar o mercado plus. “A gente vem de uma cultura com muitos mitos, com muitos nãos, e na verdade o que a marca traz é um mundo de sim, cropped pode sim, listras horizontais podem sim, todas as peças, quando bem colocadas vão criar um impacto positivo tanto para a numeração plus quanto para as numerações convencionais.”

Ela atribui o sucesso da sua loja, que hoje comercializa peças para lojistas de todo o país, ao respeito com o cliente. “Tratar o cliente como singular é primordial. Atendemos de forma muito carinhosa, tentando entender como a pessoa vai se sentir mais à vontade, no mercado plus isso é mais importante ainda.”

A lojista conta que já viu pessoas conseguirem um melhor posicionamento no trabalho após encontrar seu próprio estilo, mas não atribui o fato unicamente à peça, e sim, à segurança que a roupa deu à sua cliente. “Moda é empoderamento. A roupa fala sobre si, ela imprime a sua personalidade.”

Sobre o mercado plus size juiz-forano, ela avalia que o quadro está em crescimento, mas que não há diálogo entre os lojistas do ramo, o que, segundo a empresária, poderia fortalecer o cenário plus na cidade. “Infelizmente não existe um diálogo das marcas aqui em Juiz de Fora. É uma outra cultura que também precisa mudar. Porque essa conversa vai favorecer o nosso cliente.”

Atendimento também é importante no mundo plus size. A estudante Larissa Evangelista, 21, que veste manequim 44/46, conta que nem sempre tem “sorte” nesse quesito nas lojas da cidade “Eu já cheguei em uma loja super feliz, motivada a encontrar a roupa ideal, porém, o descaso, preconceito e desleixo com que a vendedora me tratou me fez voltar para casa derrotada”, conta. Para ela, o poder aquisitivo também é crucial na hora da compra. “Se você não tem dinheiro, você veste um pedaço de pano e não acompanha a moda”, acredita. (Foto: Fernando Priamo)

Nicho poder ser muito lucrativo, aponta Sebrae

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Uma possível justificativa para a queixa das entrevistadas que consideram o mercado plus size na cidade insatisfatório é, de acordo com o Gerente Regional da Zona da Mata e Vertentes do Sebrae Minas João Roberto Marques Lobo, o retorno mais lento do investimento efetuado. “Na verdade, apesar de os empresários entenderam que hoje há a necessidade de especializar a oferta, é um investimento que normalmente não dá retorno imediato, pois é uma clientela específica e, às vezes, o empresário pode demorar a receber o retorno financeiro”, avalia o especialista.

Apesar deste ônus, João Roberto é otimista com relação ao crescimento do segmento. “Depois da consolidação do negócio, acaba-se tendo pouca concorrência, pois poucas empresas buscam esses mercados específicos. Outro ponto positivo é que os clientes têm uma fidelidade maior. O empresário precisa de um atendimento personalizado para que essa fidelização ocorra. Com o tempo, a lucratividade desse estabelecimento tende a ser maior do que a de uma empresa mais abrangente, pois se ganha não pela quantidade, mas pela personalização do produto ou serviço que ela está entregando”, conclui.

‘Não há regra para se vestir’

A professora do curso de design de moda da Faculdade Estácio de Sá Selma Flutt afirma que a cidade conta com algumas marcas conceituadas que já pensam no público plus size, mas diz que “ainda é difícil achar alguma coisa com uma informação de moda e o preciosismo que se vê em marcas maiores”. “Sinto falta de um apreço de uma pesquisa de coleção bacana voltada para o público plus size, mas ao mesmo tempo eu sei que é difícil de se fazer, pois corpos plus size são corpos diferenciados”, diz. Ela também destaca a falta de identidade nas peças. “As roupas ficam sem personalidade. Mas caminhando pela internet, vejo que está tendo uma grande evolução nesse sentido. Em São Paulo tem uma feira, que se chama Pop Plus Size, que é voltada só para o público gordo, e com todos os estilos que você pode imaginar.”

A professora acredita que não há regra para se vestir. “Infelizmente, as pessoas têm a ideia de que roupa para gordo geralmente não marca a silhueta, e na realidade é justamente o contrário. Uma roupa mais ajustada ao corpo, diminui sim o volume. Mas acho que a pessoa é que deve escolher. Se é mais justa, se é mais larga, mais confortável ou não. A roupa está sempre dialogando com o mundo aquilo que a gente sente”.

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