Transplante de fígado – Por que esta é uma grande conquista para a região?

PUBLIEDITORIAL

Somente 60 hospitais no país são credenciados pelo Ministério da Saúde para realização do procedimento, sendo, o Monte Sinai, o sexto, no estado de Minas Gerais


Por Tribuna

01/08/2017 às 08h31- Atualizada 01/08/2017 às 17h27

O fígado é o maior órgão sólido do corpo humano e pesa entre 1200 e 1500g. Mas pode ter suas funções comprometidas por diversas doenças de modo significativo e em determinadas situações, somente o transplante hepático é capaz de manter o paciente vivo.

Para a realizar este tipo de transplante é necessário compatibilidade do tipo sanguíneo (sistema ABO), processo mais simples que o de rim, por exemplo. Devido a sua alta capacidade de regeneração, a doação de um órgão pode beneficiar mais de um receptor e, se realizado intervivos, parte do órgão do doador pode ser suficiente para o receptor.

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O ato cirúrgico – troca do fígado comprometido do receptor pelo órgão saudável do doador (cadáver ou vivo) -, é apenas um dos momentos do longo processo até a sua chegada. Pela discrepância entre o número de pessoas que necessitam do transplante e o número de órgãos doados (via morte encefálica) há um tempo longo de espera em fila, tornando-se um grande desafio levar o paciente vivo até o momento do transplante.

Os doentes que necessitam do transplante são graves, com diversas complicações decorrentes do mau funcionamento do fígado e que precisam estar razoavelmente equilibradas quando a doação acontece. Após a realização do tão esperado transplante, há um período imediato onde o paciente, submetido à cirurgia de grande porte, tem que ter seus diversos sistemas equilibrados de forma adequada para permitir que o órgão transplantado retome o seu funcionamento de modo pleno. Em média, 7 a 10 dias após a realização do transplante, o paciente recebe alta e com medicamentos que diminuem a ação do sistema imunológico aceitam este órgão “diferente” como sendo seu.

Por tudo isso, há tanto o que se comemorar quando mais um centro, fora das capitais, é credenciado para realização do transplante hepático. Somente 60 hospitais no país (menos de 1% dos hospitais brasileiros) são credenciados pelo Ministério da Saúde para realização do procedimento, sendo, o Monte Sinai, o sexto, no estado de Minas Gerais. O credenciamento exige alto nível de qualificação da equipe cirúrgica, estrutura física sólida, além de equipe multidisciplinar com profissionais de comprovada competência.

 

Grupo do Fígado do Monte Sinai

Formar parcerias. Este foi o primeiro desafio dos profissionais do Monte Sinai ao receber o credenciamento para Transplante de Fígado, em 2016. Depois de um longo processo de comprovação da capacidade do hospital e intensa maratona burocrática, iniciada (na última tentativa) em 2009, começou novo processo: definir fluxos de seleção, recepção e cuidados que garantam o sucesso do transplante na instituição.

O Grupo de Fígado do Monte Sinai foi criado durante o II Encontro Minas-Rio de Hepatologia, em setembro de 2016, reunindo hepatologistas, cirurgiões do aparelho digestivo, hematologistas, anestesiologistas, especialistas em endoscopia digestiva, patologia clínica e radiologia intervencionista, além de enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, dentre outros profissionais. A equipe estabeleceu um fluxo contando com um importante parceiro, o Hospital Universitário da UFJF, cujo Centro de Referência em Hepatologia, em funcionamento desde 2004, é o segundo maior de Minas. E outra importante parceria foi estabelecida com os gestores municipais que deram apoio fundamental para a concretização do projeto. Todo o processo é financiado pelo SUS.

 

Estrutura de alto padrão

Salas de consulta no oitavo andar da torre Oeste do Centro Médico Monte Sinai estão prontas para receber os pacientes para avaliação pré-transplante e para o seguimento no pós-transplante. O Centro Cirúrgico do Monte Sinai, auditado como apto ao procedimento, ainda este ano ganha cinco salas inteligentes – com equipamentos preparados para receber comandos por voz, disponibilidade de laudos, imagens e pareceres por vídeo em tempo real – ampliando a capacidade da estrutura para 13 salas.

A UTI do Hospital está entre as mais modernas do país e a estrutura ainda conta com leitos do Centro de Transplante de Medula Óssea, com posto de enfermagem independente, apartamentos isolados com filtro Hepa e estrutura de unidade semi-intensiva, além de equipe com três anos de experiência com pacientes imunossuprimidos.

 

Parceria com Centro de Referência do HU

Mensalmente, cerca de 300 consultas especializadas são feitas por uma equipe de Hepatologistas no Centro de Referência do HU. Entre os mais de 3 mil pacientes cadastrados, as doenças mais prevalentes são a hepatite C crônica, a doença hepática alcoólica e a doença hepática gordurosa não alcoólica e a hepatite B crônica que representam, em todo o mundo, as principais indicações de transplante hepático.  Em tese, 20% a 30% destes pacientes têm ou evoluirão para cirrose hepática, tornando-se candidatos em potencial ao transplante.

Após pré-seleção no Centro de Referência do HU-UFJF, o paciente é encaminhado para o Centro de Transplante Hepático do Monte Sinai, onde a equipe analisa e inscreve o paciente em lista, momento a partir do qual passa a concorrer por um órgão.

O critério que define a ordem de quem recebe o órgão entre os pacientes ativos em lista é a gravidade da doença hepática, avaliada pelo escore MELD e pelo tempo em fila. Quanto maior a pontuação, maior a gravidade da doença e, portanto, mais rápido o paciente receberá o órgão. Desde o status de ativo em lista até o recebimento do órgão todos os esforços da equipe são para manter o paciente vivo em condições clínicas mínimas para a realização do transplante.

 

Luta pela captação é uma constante

Com o processo completo, o transplante realizado e após a alta hospitalar, o ganho de qualidade de vida é um dos maiores entre todos os pacientes transplantados. De um modo geral, a sobrevida média é de 80% no primeiro ano e 75%, em 5 anos. Mas, a escassez de órgãos, consequente ao baixo número de doadores, resulta na morte de uma proporção significativa de pacientes à espera do transplante.

Segundo o último relatório do Registro Brasileiro de Transplantes (veículo oficial da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos – ABNT) aponta que, mesmo com taxas mais promissoras de doação no primeiro trimestre de 2017 quando comparado ao mesmo período de 2016, há muito o que evoluir. Uma vez que a lei de doação de órgãos no país prevê que é necessário a autorização da família para a efetiva captação dos órgãos, boa parte delas ainda recusa a doação após a constatação de morte encefálica que é feita por dois médicos neurologistas, não vinculados às equipes de transplante. Em 2016, a taxa de doadores efetivos cresceu 3,5%, atingindo 14,6 pmp (por milhão de população), mas esse acréscimo foi menor que o esperado. A taxa de notificação de potenciais doadores vem crescendo lentamente e está próxima a 50 pmp, mas a taxa de não autorização familiar mantém-se muito elevada (43%).

 

Unidade de Transplantes Monte Sinai

A equipe médica do Serviço de Trans­plante Hepático do Hospital Monte Sinai é composta pelos cirurgiões do apare­lho digestivo Cleber Soares, Carlos Augusto Gomes, Rodrigo Peixoto, Igor Cangussu e Victor Cangussu; anestesiologistas Fernando Araújo, Maria­na Moraes Pereira das Neves Araújo e José Mariano Soares de Moraes; e os hepatolo­gistas Aécio Meirelles, Fábio Pace, Juliano Machado de Oliveira e Tarsila Campanha da Rocha Ribeiro. Equipes de especialistas coordenadas por Emílio Augusto Campos Pereira de Assis (Patologia Clínica), Angelo Atalla (Hematologia), Rafael Gomide Alcân­tara e Magno Malta (Radiologia Intervencionista), Lincoln Ferreira e Laura Cotta Ornellas (Endosco­pia Digestiva). Nos primeiros transplantes a equipe contará com “proctors” do Rio de Janeiro, sob coordenação do cirurgião Lucas Demétrio (Hospital Quintas D’Or).

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