Sinta-se em casa, Peter Parker
“Homem-Aranha: De volta ao lar” é o primeiro filme estrelado pelo herói no Universo Cinematográfico Marvel
O bípede pensante dotado de polegar opositor (e distante do mundinho nerd/pop) pode estranhar tanto alvoroço em torno da chegada aos cinemas de “Homem-Aranha: De volta ao lar”, um dos lançamentos mais esperados do ano e que tem pré-estreia nesta quarta-feira. Afinal, o personagem foi o protagonista de nada menos que cinco filmes entre 2002 e 2014, teve sua origem contada e recontada na tela grande e encarou uma baciada de vilões clássicos como Duende Verde, Doutor Octopus, Venom e Lagarto.
A explicação é simples: a mente de um fanboy funciona em outra sintonia, e para ela este passa a ser O FILME DO HOMEM-ARANHA QUE VALE; afinal, “De volta ao lar” é a primeira produção solo do herói em que ele está inserido no Universo Cinematográfico Marvel (MCU), aquele dos Vingadores, Capitão América, Thor, Guardiões da Galáxia, Homem-Formiga e Homem de Ferro. E aí vale uma explicação para quem considera que filme de super-herói é a mesma coisa: a Marvel esteve à beira da falência durante a década de 1990 e, para fazer algum caixa, ela repassou a preço de banana (era uma época em que ninguém percebia o potencial de produções do gênero) os direitos cinematográficos de vários de seus ativos nos quadrinhos. X-Men, Quarteto Fantástico e Demolidor foram para a Fox; a Universal ganhou o Hulk; e a Sony levou o Homem-Aranha.
Devido a esse vacilo, todos os filmes com esses personagens não fazem parte do mesmo mundo em que estão Vingadores, Guardiões, Doutor Estranho etc., e para um nerd isso faz toda a diferença. Quando a Sony e a Marvel anunciaram um acordo para inserir o Aranha no MCU, foi um momento de delírio coletivo, que depois se tornou histeria com a aparição do herói no trailer de “Capitão América: Guerra Civil”, sonho realizado com o lançamento do filme, em 2016, e fervor religioso com o anúncio de “Spider-Man: Homecoming” (título original) – e que faz com que milhões sonhem com o dia em que a Marvel consiga um acordo que coloque X-Men, Quarteto e outros heróis no mesmo universo.
Toda essa longa trajetória faz, com merecida justiça, que o sexto filme do Aranha (e o 16º do MCU em nove anos) crie a mesma expectativa, por exemplo, que o primeiro “Os Vingadores”. Afinal, é a volta do mais conhecido e popular personagem da Marvel ao seu lar. Com tanta responsabilidade, o braço cinematográfico da editora – hoje propriedade da Disney – buscou ignorar tudo o que já foi feito com a trilogia original de Sam Raimi e o mal-sucedido reboot de Marc Webb, menos o fato de que ninguém aguentaria mais uma história de origem; então, nada de aranha radioativa, Tio Ben morrendo, essas coisas. O estúdio pescou para a direção o pouco conhecido Jason Watt, com duas pequenas produções no currículo e que não criaria tantos problemas de “divergência artística”; manteve no papel de Peter Parker/Homem-Aranha o jovem Tom Holland, ator britânico de 21 anos que mostrou ao que veio em “Guerra Civil”; manteve Marisa Tomei como a Tia May; e convenceu Michael Keaton, o Batman dos filmes de Tim Burton, a interpretar o vilão Abutre.
Ligação com ‘Vingadores’
A história de “Homem-Aranha: De volta ao lar” começa com uma dos elementos preferidos dos fanboys nos quadrinhos, que é o senso de continuidade e de interligação das histórias. A Batalha de Nova York, vista em “Os Vingadores”, ainda é recente, e a cidade está cheia de escombros. Uma das empresas responsáveis por recolher os escombros do combate pertence a Adrian Tooms (Keaton), que perde o contrato com o governo federal quando Tony Stark (Robert Downey Jr.), o Homem de Ferro, chega com o seu próprio serviço. Tooms é obrigado a entregar todos os caminhões que recolheu, mas, revoltado, consegue desviar um deles, cheio de artefatos dos Chitauri que ele usará para criar armas para si e outros vilões, como o Escorpião e Shocker.
E será ele, no futuro, o principal antagonista do adolescente Peter Parker (Holland), ainda eufórico por ter participado da batalha em Berlim com os Vingadores vista em “Guerra Civil”. De posse do uniforme tecnológico cedido por Stark, ele se balança pelas ruas de Nova York combatendo o crime, salvando pessoas e ajudando velhinhas. Só que ele é um moleque de 15 anos ainda se acostumando com os poderes, uma nova armadura, e por isso mesmo é um tanto quanto que atrapalhado como vigilante. E pior: como todo garoto juvenil, acredita que pode dar um passo maior que a perna e acredita ser capaz de dar conta de um vilão como o Abutre, em busca de sua vingança contra o Homem de Ferro.
Curtindo o Aranha adoidado
Mas o filme de Jon Watts não se resume às cenas de ação. Mais do que os longas anteriores, “De volta ao lar” se concentra nos dramas adolescentes de Peter Parker, que precisa combater o crime, chegar em casa a tempo de fazer o dever de casa e não perder a escola no dia seguinte. Mais solar que a trilogia de Sam Raimi, o filme se dedica a dramas adolescentes como a necessidade de pertencer a um grupo, o nerd vítima de bullying, a paixão platônica pela garota mais bonita da escola, tarefas escolares e outras questões que todos que já passaram dos 18 anos sabem muito bem. Tanto que “Homem-Aranha: De volta ao lar” tem sido comparado a alguns clássicos dos anos 80 dirigidos por John Hughes, como “Clube dos Cinco” e “Curtindo a vida adoidado” – mas com superpoderes.
Ao resgatar alguns dos elementos clássicos dos quadrinhos dos anos 60 criados por Stan Lee e Steve Ditko, a Marvel espera com “Homem-Aranha: De volta ao lar” criar um clima de “Sessão da Tarde” ao mesmo tempo em que atualiza o personagem para o século XXI, prepara terreno para a presença do herói em “Vingadores: Guerra Infinita” e espera fazer dinheiro suficiente para que a Sony continue disposta a dividir o Cabeça-de-Teia no cinema, o que também é o sonho de todo fanboy que se identifica com as alegrias e tristezas da vida de Peter Parker – e que adora um universo compartilhado.
HOMEM-ARANHA: DE VOLTA AO LAR
UCI 2 (3D/dub): meia-noite (qua). UCI 3 (3D/leg): meia-noite (qua).
Classificação: 12 anos