Mulher enganada em rede social pode ser indenizada por ex-namorado
Decisão em primeira instância define por indenização de R$ 8 mil a assistente de administração que manteve relações, sem saber, com um homem casado que conheceu na internet
Uma assistente de administração, de 48 anos, moradora de Juiz de Fora, terá que ser indenizada em R$ 8 mil por danos morais depois de ter sido enganada por um ex-namorado num site de relacionamentos. A mulher iniciou um namoro com ele, mas, após um ano e dois meses, descobriu que o companheiro era casado. A decisão é do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que, em primeira instância, julgou procedente o pedido de indenização, uma vez que considerou os danos, a gravidade e a repercussão da ofensa sofrida pela autora da ação. A decisão foi divulgada no último dia 19.
A mulher descobriu que vinha sendo enganada após procurar a esposa do réu, que mora no Estado de São Paulo por motivo de trabalho. Ela confirmou que ainda era casada com o suspeito e não separada como ele havia alegado. Tal descoberta teria causado à autora da ação sofrimentos psicológicos, levando-a a fazer uso de medicamentos e tratamentos com psicoterápicos. “No decorrer das desconfianças, eu terminei o relacionamento, porque nada batia com nada. Ele contava uma história e, quando contava de novo, era outra versão. Aquilo foi me causando desgaste e, com o término do relacionamento, fiquei muito tempo sem sair de casa, sem me relacionar com outras pessoas. Precisou de mais de um ano para que pudesse voltar a me relacionar com outro homem. Essa situação havia me frustrado imensamente, porque não tive a oportunidade de escolher se queria estar ou não naquele relacionamento. Eu era e sou desimpedida, pois, na ocasião, estava em processo de divórcio e me divorciei. Não tinha intenção de me relacionar com uma pessoa que não estivesse livre”, disse a assistente de administração à Tribuna.
Conforme ela, o réu era casado desde 1999, e a esposa dele mudou-se para São Paulo. Todavia, o casal mantinha um apartamento em Juiz de Fora. “Aqui, ele agia como se fosse solteiro, com perfis em sites de relacionamento. Participou da minha vida, ajudou na escolha da compra do meu apartamento, na escolha do meu carro. Foi um ano e dois meses de relacionamento, encontrando todos os dias durante a semana e fim de semana e eu demorei muito a desconfiar, porque ele não tinha ressalvas quanto aos lugares que frequentávamos.”
Propósito de alertar outras pessoas
Por considerar que diversas outras mulheres já passaram e podem passar pela mesma situação, a assistente de administração deseja que sua história seja divulgada, com o propósito de alertar as pessoas. “Queria que minha versão fosse ouvida e reconhecida como verdade e me sinto gratificada por isso e agora estou muito aliviada”, afirma a mulher. Segundo ela, ao decidir levar seu caso à Justiça, desejava a punição do ex-namorado, uma vez que descobriu que não era a única a passar por aquele relacionamento de mentira. “Tenho uma amiga advogada que me esclareceu a respeito de que poderia entrar na Justiça, caso tivesse provas. Eu tinha fotos e conversas do relacionamento que foi construído com ele em 14 meses. Mas, não foi guardado com essa intenção, mas porque fazia parte da nossa história. A partir disso, decidi procurar a Justiça, não estava visando ao dinheiro, a ação era de caráter punitivo, para coibir esse tipo de comportamento”, assevera, acrescentando: “Quando eu descobri que ele era casado, soube também que já havia mantido relacionamentos iguais com outras mulheres. Inclusive, a esposa teria descoberto alguns, mas não havia prova. Eu fui a única pessoa que conseguiu provar que essa conduta era uma prática rotineira dele. Acredito que muitas mulheres vão se identificar.”
Desconfianças sobre o comportamento do réu
O relacionamento entre os dois teria começado na época em que ela, fragilizada com o fim de seu casamento, teria procurado um site de relacionamento, onde teria conhecido o réu, que se apresentou como alguém que estava separado há quatro anos. Segundo ela, a partir daí, ambos desenvolveram um contato, no qual ele foi apresentado aos filhos, familiares e aos amigos dela. Ainda conforme o processo, o casal teria frequentado lugares públicos, e ela ainda teria experimentado a suspeita de uma gravidez durante o tempo de relacionamento.
Contudo, depois de certo tempo, ela teria começado a desconfiar das razões pelas quais o namorado não lhe apresentava seus familiares e não a levava a sua residência. Entre as justificativas, ele dizia que morava com os pais. Desconfiada, ela procurou os pais dele e constatou que eles residiam em outro endereço. Depois disso, uma série de desconfianças teria se instalado, e ele teria passado a adotar um comportamento paranoico. Ela descobriu o casamento dele por meio do telefonema a uma vizinha, o que a levou a procurar a esposa dele.
No processo, o homem defendeu-se, alegando que nunca teve a intenção de maior envolvimento com a moradora de Juiz de Fora. Ele ainda alegou que não tinha mais vida social e que a autora da ação não sofrera danos morais, posto que considerava que ela tinha culpa. Além disso, conforme ele, a assistente de administração sabia de sua situação com sua esposa e, devido ao ciúme, teria agido de má-fé.
Para a sentença, o juiz responsável, Francisco José da Silva, levou em conta como material probatório uma sequência de fotografias, reconhecidas pelo réu como suas, em momentos de lazer e de convivência familiar, nas quais as partes se portam como um casal, inclusive em posições de certa intimidade, além de conversas escritas, cujo teor demonstrava a dinâmica do relacionamento entre ambos e troca de e-mails nos quais o casal planejava viagens.
Como pontua a sentença, “a versão do réu não se mantém hígida diante do material probatório, não fazendo sentido a alegação de que haveria “culpa” da autora da ação por procurar sites de relacionamentos. A atitude do réu, de omitir seu estado de casado, adentrando à convivência familiar direta da autora, de seus filhos, seus familiares e amigos, inclusive fazendo viagens à sua cidade natal, bem como programando outras, violou seus direitos da personalidade, expondo sua intimidade ou confidência”. Como o processo correu em primeira instância, o réu ainda pode recorrer da sentença.