A Praia do Rio Verde


Por Wendell Guiducci

30/05/2017 às 06h00

Milton estava feliz da vida. Realizava enfim o sonho de conhecer a Bahia. Com ele, a esposa Lurdinha e os meninos. Dezoito horas de viagem desde Juiz de Fora, soquetando pela BR-101 atrás de infindáveis caminhões de eucalipto.

Na Estrada da Balsa começaram a aparecer as primeiras pousadas e os guias turísticos sem capacete em suas motocicletas sem placa.

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– Praia, patrão!? Vem atrás, vem atrás…!

E aceleravam as velhas Hondas e Yamahas pelas ruas. Milton, mineiro que só ele, refugou. O plano era dar um tchibum em Trancoso para tirar a estrada do corpo e seguir viagem rumo a Porto Seguro. Mas confiar naqueles moleques…?

Aproximou-se do Fiat Palio um pequeno. Não tinha mais que 9 anos e 30 quilos.

– O senhor quer ir pra praia?

– Quero.

– É só acompanhar ele ali, ó – e apontou para um adolescente numa Yamaha RDZ preta. Sem placa, naturalmente.

Lurdinha estava animada. Ia botar os pés nas mesmas areias que a Alessandra Negrini e o Fábio Assunção em “Paraíso tropical.”

– É uma criança, Bem! Vamo lá.

– Tá bom então.

E seguiram a RDZ preta sem placa.

A determinada altura, o moleque na motocicleta entrou em um estacionamento improvisado onde estavam vários carros. Milton colocou seu Fiat Palio entre um Jeep Grand Cherokee e uma Dodge Ram. E já desceu perguntando.

– Quanto é que é?

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O menino disse “nada não”, que era só seguir ali por entre a vegetação, passando por uma pinguela sobre o riacho e eles sairiam nos fundos de um restaurante. Dali era só atravessar o bar e estariam na praia.

Dito e feito.

Quando enfim divisou o mar absurdamente verde-baiano, o céu azul recortado pelos coqueiros e pela mata exuberante, Lurdinha quase teve um trem. Ficou parada, de boca aberta. Os meninos saíram correndo pela areia escaldante. Milton sentou e pediu uma Brahma. Era para isso que trabalhara tanto aqueles anos todos, enfim! Havia vida mais barata, ele pensou, mas era bem pior.

E lascou um beijo de língua na Lurdinha.

Dali a pouco seriam todos esquartejados – cabeças preservadas para decoração da mesa -, cozidos no dendê e servidos a um grupo de animados turistas holandeses, gordos e de bochechas rosadas, um dos quais retornou para Utrecht reclamando de insolação.

Ocorre muito com os incautos que subestimam o sol do Sul da Bahia.

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