Sonho de Martin Luther King


Por Márcio Santos, jornalista e radialista

14/05/2017 às 07h00

Casos de racismo e abuso de autoridade são noticiados quase que diariamente pelos meios de comunicação. Como jornalista e radialista, noticiei inúmeras vezes. Mas passar a noite em claro, diante de tanta indignação por ter sido tratado como um bandido, nunca. Nascido numa família com dez irmãos, as dificuldades dos meus pais não foram empecilho para que valores como caráter, dignidade e respeito ao próximo deixassem de ser seguidos à risca. Ensinamentos que são passados hoje aos meus filhos e sobrinhos. Em tempos de descrédito das autoridades do país, esses valores devem ser ainda mais difundidos. Mas a tristeza que sentem diariamente muitos pais de família, pessoas trabalhadoras que são aviltadas em seus direitos, eu senti na última semana, depois de uma abordagem policial. Acompanhamos e noticiamos as ações da Polícia Militar e, claro, desejamos que elas sejam sempre bem-sucedidas, com a prisão de criminosos, mas com respeito ao cidadão de bem. Sabedor de ocorrências envolvendo pessoas que utilizam motocicletas para cometerem crimes, acredito que as blitze são sempre importantes. Quando fui abordado por dois policiais, eles me pediram a documentação pessoal e da motocicleta. Tudo certo, sem problema.

Mas, quando seguiria meu caminho, o policial pediu o meu endereço. Estranhei, pois não justificava esse pedido, já que a minha documentação estava correta e, por isso, não informei e pensei: será que estão me confundindo com um bandido? E, convenhamos, quem comete crimes não fala onde mora. O policial, então, disse que era para minha própria segurança. Como não concordei com o argumento, neguei novamente. Foi quando veio um outro policial, com uma arma em punho, dizendo que eu precisava passar o endereço. Eu disse que era jornalista e nunca havia presenciado este tipo de abordagem. O policial, então, agindo de forma truculenta, disse que estava “tentando” ser educado comigo (como se ser educado fosse um favor feito ao cidadão), e, como eu estava questionando muito, ele iria agir de outra forma.

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Sentindo-se afrontado com a minha negativa, começou a procurar defeito na moto, com o claro intuito de tentar me incriminar de alguma forma. Como não encontrou nada que pudesse me incriminar, seguiu com a arma em punho e disse para o seu companheiro que eu deveria ficar aguardando no local. Depois de um tempo, fui liberado. Mas saí indignado, pois sei que o mesmo procedimento não é adotado com todos os cidadãos.

Durante seis anos em que servi ao Exército Brasileiro, colecionei inúmeros amigos. Muitos deles, hoje, são policiais militares. Além disso, convivo diariamente com outros, em função da profissão que exerço. Com todos, tenho um convívio de amizade e respeito. Por isso, considero que esse tratamento recebido não é o da Polícia Militar.

Mesmo com a voz embargada, devo elevá-la para que outros tantos trabalhadores também tenham coragem de se indignar com essa diferença de tratamento. Eu continuo acreditando no sonho de Martin Luther King, “de que um dia meus filhos vivam em uma nação onde não sejam julgados pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter”.

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