Rotina cansativa dificulta continuidade dos estudos


Por Eduardo Valente

30/04/2017 às 07h00

O setor da construção civil, quase unanimamente masculino (93%, segundo a Rais), é hoje a única fonte de renda para milhares de pais de família na cidade. Percentualmente, esta é a área com a menor escolaridade entre os setores que empregam em Juiz de Fora. Cerca de 56% destes profissionais sequer têm o ensino médio completo, patamar que, no comércio, é de 32%; no setor de serviços 26%; e, na indústria 37%. São pedreiros, pintores, carpinteiros, bombeiros hidráulicos, eletricistas e serventes que, apesar de enfrentarem dificuldades para ascender na profissão, têm em comum a vontade de trabalhar.

olavo-trabalho-fernandoRetrato deste grupo é o bombeiro hidráulico Fernando José de Carvalho, 32 anos. Casado e pai de uma filha de três anos, vê na dura rotina diária o principal inimigo para buscar o aperfeiçoamento. Ele, que estudou até a quarta série do ensino fundamental, aprendeu ofícios da obra a partir das oportunidades do próprio empregador.  “Comecei como ajudante de pedreiro, aos 24, mas com 11 anos eu já trabalhava na roça, pois precisava ajudar a família. Tenho muita vontade em continuar os estudos, mas a rotina não permite.” Ele está há oito anos trabalhando em uma construtora da cidade. Situação semelhante é a do pedreiro Vicente Paulo, 45, que afirma viver história de luta diária para manter o emprego e sustentar esposa e três filhos. Ele também tem apenas a quarta série e sempre trabalhou em obras.

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Com ensino médio completo – o que pode ser considerado exceção neste grupo (37% da classe) -, está o pedreiro de acabamento Leandro de Souza, 30, cuja esposa está grávida de oito meses. Há quatro, ele concluiu o ensino médio e já fez curso de especialização de mestre de obras. “Quando comecei a trabalhar na construtora, há dez anos, só tinha o ensino fundamental. Tirei o segundo grau com muito sacrifício, pois a obra começa 6h e eu saía apenas 17h15. Ia para o João XXIII e lá ficava até as 22h. Em muitos dias, nem conseguia estudar direito, de tão cansado, acabava cochilando. Nosso serviço é pesado. Imagine, depois de toda esta rotina, chegar em casa às 23h, tomar banho, jantar e depois acordar cedo novamente? É preciso ter muita, mas muita força de vontade.”

Trabalho e estudo das 6h30 às 23h30

Embora a indústria tenha perdido o posto de maior gerador de emprego na cidade ao longo das décadas, ela ainda responde por quase 20 mil vagas no mercado, de acordo com a Rais, perdendo espaço apenas para os segmentos de serviço (74 mil) e comércio (33 mil). De origem na construção civil, mas hoje na indústria, a Tribuna encontrou a história do operador Marçal Ângelo dos Santos, 43, funcionário de uma fábrica de medicamentos. Ele trabalha em um equipamento chamado emblistadora, que embala objetos sólidos, como os comprimidos.

Marçal Ângelo, que começou na construção civil, hoje trabalha na indústria. O curso técnico e as especializações foram diferenciais
Marçal Ângelo, que começou na construção civil, hoje trabalha na indústria. O curso técnico e as especializações foram diferenciais

“Consegui o emprego porque tinha curso técnico em eletrônica, que era um perfil buscado na época. Posso dizer que, ao longo da minha vida, os estudos foram abrindo as portas”, disse o trabalhador, que acorda as 4h30 diariamente, tem o ensino médio completo, o técnico e outros cursos de especializações. “Nunca foi fácil. Aos 14, trabalhava como servente de pedreiro e estudava. Saía de casa 6h30 e voltava depois das 23h30. Foram anos nesta árdua rotina. Mas sei que, sem estes sacrifícios, ainda estaria na obra”, disse o homem com orgulho de suas conquistas, casado há 16 anos e pai de dois filhos, um de 13 anos e outro de nove meses.

 

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