O barbeiro e o gângster


Por Wendell Guiducci

06/12/2016 às 07h00

Guipa era um cara bonitão. E tava na moda. Braços cheios de tatuagens vintage. Barba enorme e superescovada. Olhos azuis. Coque.

– Ai, Guipa… – suspirava a mulherada.

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Guipa adorava moda, mas como o ramo estava um pouco saturado demais, decidiu fazer curso no Senac e abrir uma barbearia para cuidar dos pelos faciais da rapaziada, que andava bem vaidosa ultimamente. Guipa não só adorava, mas também estava na moda, então botou fliperama, bilhar, cervejas artesanais de 30 contos, chamou de barber shop e foi ganhar seu dinheirinho na honestidade.

Certo dia, entrou com dois capangas no recinto Orlando Ferreira, conhecido gângster da cidade. Fez fortuna com agiotagem, casas noturnas, lavagem de dinheiro e tráfico de drogas. Todo mundo sabia, mas ninguém prendia. O pessoal se borrou todo.

A fama de Guipa correra rápido, e Orlando também estava na moda com seu coque samurai e enorme barba cor de cobre. Sentou-se na cadeira e ordenou o serviço. Tesoura. Toalha quente. E, por fim, navalha.

O pescoço traiçoeiro de Orlando ali.

A carótida pulsando.

Guipa suava.

E tremia.

Quando já terminava o serviço, um delize. Um pequeno talho. E o sangue desceu em delicado filete do pescoço do gângster.

Arrancando a toalha dos ombros, Orlando cravou seus olhos cor de fúria nos olhos marinhos de Guipa.

Afastou as mãos do barbeiro e tomou-lhe a navalha.

Os capangas se posicionaram atrás de Guipa.

O ambiente estalava e faiscava de tensão.

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Orlando agarrou a mão de Guipa.

Olhou-se no espelho.

Afastou o colarinho.

E ordenou.

– Agora lambe, gostoso.

Os gângsteres do Brasil andam muito modernos.

Ilustração: Demetrius Coutinho

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