Moradores de rua ocupam monumento


Por Eduardo Maia

30/09/2016 às 07h00- Atualizada 30/09/2016 às 12h59

Número de ocupantes da área aumentou nos últimos dias, chamando atenção de pedestres e comerciantes (Marcelo Ribeiro/23-09-16)

Número de ocupantes da área aumentou nos últimos dias, chamando atenção de pedestres e comerciantes (Marcelo Ribeiro/23-09-16)

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A frequente presença de pessoas em situação de rua no monumento das Forças Armadas, na Praça do Riachuelo, no Centro, tem deixado comerciantes e frequentadores do local desconfortáveis com a situação. O problema ocorre diante de alguns atos, como o uso do espaço como moradia, tanto para dormir, quanto para necessidades e até mesmo praticando sexo no local. Na noite do último sábado, por volta das 21h, alguns comerciantes presenciaram uma briga, quando um trio, do mesmo grupo, feriu a pancadas um dos homens, sendo inclusive acionado o Samu para socorrer a vítima. Entre os comerciantes, há reclamações de que episódios como esse reduzem, inclusive, o movimento de consumidores na região.

Uma vendedora de 30 anos afirma que o problema se acentuou nas últimas semanas. Segundo ela, embora a nova iluminação da praça tenha afastado estas pessoas em situação de rua por um período, recentemente elas retornaram ao local. “O monumento virou moradia deles. Mas também há muita gente que tem moradia, fica durante o dia e depois vai embora. No comércio, o movimento caiu porque as pessoas evitam vir para essa área por ficar com medo. Já fizemos abaixo-assinado, inclusive pedindo para colocarem guardas municipais na região.”

Já o atendente de uma farmácia próxima, David de Oliveira Assunção, 30, afirma ser crescente o número de pessoas em mendicância. “Os moradores não atrapalham diretamente a gente, mas indiretamente eu acho que muita gente deixa de passar por aqui. Pedem dinheiro, e alguns oprimem os que passam. No monumento, o Exército, que é responsável pelo local, vem aqui, cuida, limpa, mas não adianta”, desabafa.

Sem solução

De acordo com a assessoria de comunicação da 4ª Brigada de Infantaria Leve (Montanha), o monumento foi cedido pelo Exército à Associação Nacional dos Veteranos da FEB. A administradora da associação, Fátima Inhan, afirma que a instituição não tem condições de manter o espaço diante da idade avançada dos ex-combatentes, sendo o mais novo o atual presidente, Antônio de Pádua Inhan, com 91 anos. “A gente não tem o que fazer, além de denunciar. O ideal seria que tivesse um sentinela do Exército ou alguém da Guarda Municipal, destacado para aquele local. Mas infelizmente não tem. Sou contra o fechamento do espaço por grades, já que as pessoas devem ter acesso para ler o que está escrito nas placas. É preciso que tenha alguém cuidando do monumento”, cobra.

Ação conjunta de abordagem no local

Apesar de afirmar que realiza constantes abordagens na área, sendo a última no dia 21 deste mês, a Secretaria de Desenvolvimento Social (SDS) buscará uma ação conjunta no local, cumprindo o determinado pela instrução normativa que regulamenta a ação dos agentes públicos em relação aos moradores em situação de rua. De acordo com a chefe do Departamento de Proteção Especial, Nathália Meneghine, um grupo de ação conjunta, formado pela SDS e pelas secretarias de Atividades Urbanas (SAU), Centro Pop, Demlurb, Guarda Municipal e PM se reuniu ontem para traçar os passos de abordagem já na primeira semana de outubro.

“Por enquanto, temos feito apenas uma abordagem social, com tentativas de convencimento dessas pessoas a se integrarem aos serviços oferecidos pelo município. Agora vamos partir para a ação conjunta, planejando a intervenção, que é balizada pela lei. Obviamente não podemos remover a pessoa contra a vontade dela, mas vamos recolher entulhos e objetos que não sejam de caráter pessoal. Vamos fazer isso em diferentes pontos da cidade, mas vamos dar uma atenção à Praça do Riachuelo”, garante. A SDS afirma também que alguns moradores que não eram de Juiz de Fora já foram encaminhados à sua cidade de origem.

Segundo Nathália, em situações de conflito, ameaça ou mesmo brigas entre os moradores, as pessoas não devem deixar de acionar órgãos de segurança pública. “Quando se ultrapassam os limites da assistência, é uma questão de ação da polícia ou Guarda Municipal. Nós fazemos um trabalho disciplinado, organizado, de cuidado compartilhado, intersetorial. Mais do que a situação da praça, buscamos lidar com a situação dessas pessoas, de promoção humana. Não é um trabalho que se faz apenas numa intervenção, são necessárias várias intervenções para que se alcance o resultado, lidando com pessoas que têm histórias de vida complexa.”

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Pesquisadora fala da criminalização da pobreza

Pesquisadora sobre a realidade da população de rua e políticas públicas de assistência social, a professora do Serviço Social da UFJF, Viviane Souza Pereira, destaca existir um consenso de que a realidade de moradores de rua é multifacetada. Segundo ela, a política assistencial, muitas vezes, é feita de forma higienista e superficial, sem dar conta de toda a dimensão dos problemas, enfocando apenas uma das questões como a falta de moradia. “Tratam de forma paliativa um problema que é muito maior. São múltiplas razões que levam a pessoa a viver nessas condições, como o desemprego, o transtorno de dependência química, problemas familiares e a falta de moradia. Algumas pessoas inclusive sofrem com todos estes problemas. Ninguém vive por escolha”, analisa.

Segundo Viviane, a violência contra o morador de rua é um dos fatores preocupantes, especialmente em razão da criminalização da pobreza. “O senso comum pensa que é o morador que comete a violência. Em geral, as pessoas olham e falam que é bandido, vagabundo. Há uma violência institucional, existente desde as prisões irregulares até as agressões a moradores. Cria-se um pensamento de como se fossem inimigos. Quando se olham as estatísticas, vemos que é exatamente o contrário. É uma criminalização da pobreza de modo geral.”

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