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Por Júlia Pessôa

03/07/2016 às 07h00

Bastien era apaixonado pelo Brasil. Suíço de seus 30 e poucos anos, lembrava-se direitinho dos áureos tempos em que a camisa da Seleção Canarinho era o terror de todas as outras, e tem memórias vívidas, principalmente, do tri e do tetra. Perdeu a Copa de 2014 no solo do país que tanto lhe encantava, só pra depois agradecer por não ter visto o vexame brasileiro in loco. Seria demais para seu coração europeu. Já tinha visto tudo que era novela brazuca que chegava na terra dos relógios e chocolates, cantava Michel Teló com um português arranhadíssimo e decidiu que de 2016 não passava: veria as Olimpíadas no Rio.

Qual não foi sua agradável surpresa quando viu que o Museu Olímpico de Lausanne expôs a mostra “Destination Rio”, voltada para os turistas que pretendiam assistir aos jogos em terras cariocas. Logo que teve chance, foi visitar a exposição, e, entre muitas coisas, a promessa de aprender falar “carioquês” lhe encantou… nada como saber a língua nativa. Havia muitas palavras de sonoridade engraçada (Copacabana, Botafogo, muvuca…), todas acompanhadas de seu significado e a oportunidade de pronunciá-las para uma máquina que avaliava a carioquice do gringo. Mas quando chegou aos verbetes “gostosa” e “bundão”, também seguidos por sua descrição, Bastien sentiu os miolos darem nó. Com certeza devia ser um pau no computador do museu, ou um hacker mal-intencionado, principalmente com as campanhas contra turismo sexual que se estava fazendo, e os casos estarrecedores de violência sexual que ele vinha lendo na mídia sobre seu querido Brasil.

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Achando esquisito, foi perguntar a uma mocinha de coque o que estava se passando, que lhe garantiu que seu estranhamento era apenas choque cultural. “Os brasileiros são assim mesmo, mais ‘pra frente'”, disse ela em uma das línguas que se fala na Suíça. “Além disso, a curadoria da exposição foi toda feita por brasileiros”. Aí Bastien relaxou. Um brasileiro jamais ensinaria um gringo a repetir, em português, palavras que fossem ofensivas.

Passou rápido o tempo, e logo Bastien chegou ao Brasil. Quis logo tomar uma cerveja no aeroporto mesmo (sabia que os brasileiros adoravam cerveja) para se sentir em casa, e foi atendido por uma carioca da gema, que decepcionou por não lhe dar boas-vindas. Arriscou um inglês:

– No “Welcome to Brazil”?
– Que Wel, mishter! I don’t know quem é Wel, mas aqui ele não come nada se eu não quiser, viu?

E o gringo tentou se desculpar vendo a braveza da moça, mas não falava lhufas de português. Logo se lembrou do aprendizado no Museu Olímpico:

– Sorry, Gostosa!
– Quê quê isso, meu filho! Fóquiul, viu? Comé que tu chama?
– Er…Bundão?
– Ah, agora sim, liguei o nome à pessoa.

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