Direção de segurança pode ser afastada após assassinato


Por Daniela Arbex

21/04/2016 às 07h00

A direção de segurança do Centro Socioeducativo Santa Lúcia poderá ser afastada. A juíza da Vara da Infância e Juventude, Maria Cecília Gollner Stephan, instaurou procedimento administrativo para apurar se houve falha dentro da unidade, local que foi palco do assassinato de Ruan Marcos Arruda da Silva. O adolescente de 14 anos foi morto na noite de sábado dentro do alojamento do núcleo provisório. Embora estivesse sob a custódia do Estado, ele faleceu depois de ter sido atacado por outros três jovens entre 16 e 17 anos que dividiam o mesmo espaço. Apesar do laudo de necropsia ainda não estar pronto, Ruan foi asfixiado, segundo informação dos autores do crime. O atestado de óbito da vítima declara apenas que a causa é indeterminada. A juíza vai analisar as imagens das câmeras de vigilância para descobrir como tudo aconteceu.

[Relaciondas_post] “Estou muito chocada e tentando entender porque três meninos de fora da cidade fizeram isso com ele? Essa é uma tragédia que deveria ter sido evitada. Tenho fortes indícios de que houve falha na segurança”, declarou a magistrada, na noite de terça-feira.

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Ruan foi transferido para o alojamento onde foi morto naquele mesmo dia. Os autores da violência contra o adolescente disseram à polícia que mataram o jovem porque ele “criou problema”. Eles afirmaram, ainda, que tamparam a boca e o nariz de Ruan, provocando a asfixia. Oriundos de cidades da região, os jovens tinham envolvimento anterior com outros casos de homicídio. No domingo, eles foram transferidos do Santa Lúcia para Belo Horizonte. Segundo a juíza, todos permanecerão acautelados até os 21 anos.

 

Histórico de ocorrências

Embora Ruan tenha sido socorrido pelos próprios agentes que trabalham no Centro Socioeducativo – já que o Samu informou que demoraria para fazer o atendimento -, o fato de ninguém ter visto ou ouvido nada pode caracterizar omissão e falhas no funcionamento da instituição de privação de liberdade. No ano passado, a diretoria foi afastada pela juíza após denúncias de maus-tratos contra os adolescentes virem à tona. Na ocasião, três corregedores da Subsecretaria das Medidas Socioeducativas de Minas Gerais (Suase), ligada à Secretaria de Defesa Social (Seds), vieram à cidade para ouvir os funcionários e a diretoria afastada. Além da constante superlotação, as oficinas profissionalizantes estavam paralisadas e havia pelo menos 20 rapazes dormindo em colchonetes no chão, metade deles na enfermaria transformada em dormitório improvisado.

Em 2009, outro episódio violento envolveu a unidade. Na época, um adolescente de 15 anos foi encontrado pendurado pelo pescoço com o próprio lençol também dentro do alojamento que dividia com outros dois jovens. Por lei, a privação de liberdade para adolescentes em conflito com a lei deve ser sinônimo de ressocialização e oportunidade. No entanto, a gravidade dos casos pode indicar que a dimensão educativa da medida está sendo descumprida. “Não posso dizer que a unidade não está cumprindo o seu papel, pois os casos de reincidência dos adolescentes após o cumprimento da medida são baixíssimos, mas o atendimento está deixando a desejar, porque o quadro de funcionários não está completo”, destacou Maria Cecília.

A família de Ruan afirmou que vai entrar com ação judicial contra o Estado. “Apesar de não trazer meu filho de volta, eles terão que responder por isso”, disse a mãe do adolescente, Márcia Paulino Arruda, 41 anos.

 

Procura de ajuda no Conselho Tutelar

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Os últimos meses de vida de Ruan Marcos Arruda da Silva foram conturbados. Em outubro do ano passado, ele chegou a morar com a mãe, mas, meses depois, acabou em situação de rua, devido a um desentendimento familiar. Segundo o conselheiro tutelar da região Centro-Norte, Abraão Fernandes Nogueira, o garoto foi ao conselho pedir ajuda naquela ocasião. Ao procurar os parentes de Ruan, o conselheiro disse que “a família não quis recebê-lo”, o que levou à necessidade de um novo acolhimento institucional em fevereiro deste ano.
No dia 1º de abril, Ruan foi transferido para a unidade de privação de liberdade após ter ateado fogo nas meninas do abrigo Estância Juvenil. Viveu apenas duas semanas no Centro Socioeducativo. Com o falecimento de Ruan, quatro vidas foram interrompidas. A dele e dos três jovens que, sem conhecê-lo, o sentenciaram à pena de morte.

 

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