Toda honra e toda Glória


Por Júlia Pessôa

06/03/2016 às 07h00- Atualizada 09/03/2016 às 14h03

Eu, que nada assisti da cerimônia do Oscar, acordei na última segunda-feira com a Glória Pires na boca do povo, como não estava desde os tempos de Ruth e Raquel, talvez – quando as novelas eram parte muito maior da vida de todo mundo. Fui entender a situação e, grosso modo, vi que a atriz foi inusitadamente convidada a comentar o Oscar, feito que acabou virando um festival de memes e piadas pela internet a fora com o que disse sobre as obras e artistas indicados. Houve os lacônicos: “Bacana”; os que denunciavam seu despreparo: “Não assisti” e aqueles em que ela optou por assumir seu papel de atriz, e não especialista em cinema: “Não me sinto capaz de opinar.”

Confesso que ri bastante de algumas das brincadeiras e acho, honestamente, que a Glória devia ter se munido melhor de argumentos antes de topar a roubada de comentar o Oscar. Mas me solidarizei, porque tem sempre aquele favor que um chefe, um amigo querido ou um parente nos pedem e, mesmo quando não somos a pessoa mais indicada para quebrar o galho, topamos. Quem nunca? Eu, trouxa que sou, sempre. Pensei também que, nesses tempos em que todo mundo se autonomeia expert de qualquer assunto, é muito reconfortante saber que há quem decline ao tão almejado lugar de dar opinião.

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Se houvesse mais Glórias na internet e na vida, ouviríamos bem menos “Bolsomitos”, “bandido bom é bandido morto” e “Isso aí é Brasil.” Estamos tão acostumados a dar um pitaco sobre qualquer coisa, pelo simples fato de podermos, que estamos, nós todos, de saco cheio do campo minado das redes sociais, que existem – pasmem! – justamente para que nos conectemos uns com os outros. É uma bola de neve: alguém comenta algo que consideramos errado, mas não sabemos exatamente por quê, mas dane-se: contestamos mesmo sem ter argumento, e assim começa o tiroteio virtual de ideias. Nesta semana tão espinhosa na política nacional, senti uma falta dolorida de mais Glórias na internet, cientes de sua inaptidão para opinar.

Decidi começar a dar o exemplo. Se alguém me perguntasse, por exemplo,o que achei do julgamento de Eduardo Cunha pelo Supremo Tribunal Federal (STF), eu diria: “Não assisti”. Quando soube, entretanto, que por dez votos a zero, ele se tornou réu da Lava Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, logo respondi: “Bacana!”. Mas se alguém me perguntar o que eu espero que aconteça com o Cunha no fim das contas, além de que pague legalmente pelo que cometeu… em nome da boa educação, do bom Português e do esforço em não desejar o mal a qualquer pessoa, sou obrigada a replicar: “Não me sinto capaz de opinar.” E que continuem a vir para nós, no caso Cunha, dias como esse. Dez a zero,  e não adianta querer desviar nossa atenção : não vamos deixar passar em branco. Dez a zero. Ô, Glória!

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