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Um sorriso para a cidadania

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Vem das Filipinas curiosa e sugestiva notícia: os prefeitos de duas cidades daquele país estabeleceram, por decreto, a obrigação de sorrir, imposta aos funcionários públicos no atendimento dos cidadãos, ficando proibido, por outro lado, franzir a testa nos contatos com o público. Soa um tanto extravagante a ideia de que se possa adotar semelhante norma de comportamento por meio de lei. As leis ou as ordens executivas não têm o condão de imprimir novas formas de conduta nem tampouco concorrer para a educação do povo ou de uma classe social. É conhecida a lição de Jean Cruet, jurista francês, num livro instigante, cujo título já traduz a filosofia nele exposta: A vida do direito e a inutilidade das leis. No pórtico da obra, o autor consigna essa assertiva, que tanto impressionava os estudantes de direito do meu tempo: “Vê-se todos os dias a sociedade reformar a lei; nunca se viu a lei reformar a sociedade”. De qualquer modo, a preocupação dos prefeitos filipinos em que os munícipes sejam bem atendidos pelos servidores é, em si, louvável, revelando empenho em que a administração pública passe uma imagem simpática aos usuários dos seus serviços. Seria esse um tema a ser mais adequadamente tratado em Código de Ética do servidor público, que instituísse deveres em relação aos administrados.

Temos, aliás, no Brasil, o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, aprovado pelo Decreto nº 1.171, de 22 de junho de 1994. O referido código não institui, entre nós, o dever de sorrir, mas estabelece, entre os deveres fundamentais do servidor público, o de “ser cortês, ter urbanidade”, preceituando que “tratar mal uma pessoa que paga os seus tributos direta ou indiretamente significa causar-lhe dano moral”. Na prática, entretanto, o que, não raro, se vê no cotidiano das repartições públicas é a aspereza no trato; a atitude, por vezes, autoritária diante do cidadão indefeso; o excesso de exação no cumprimento do dever, que leva o funcionário a só enxergar o interesse da administração pública. Até mesmo os advogados, aos quais cumpre atuar como elos entre os cidadãos e o Poder Público, especialmente o Judiciário, enfrentam, no dia a dia, dificuldades dessa natureza. A cultura prevalecente, entre nós, ainda é a da dominação hierárquica da autoridade que tudo pode ou a do vezo de tratar o direito do administrado como mera concessão do poder instituído. Por outro lado, a sub-rogação do atendimento pessoal pela via eletrônica dificultou ainda mais as coisas, porque tornou o funcionamento dos serviços extremamente impessoal e complexo.

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Ainda que no sentido metafórico, é necessário, realmente, sorrir para aquele que se encontra do outro lado do balcão. A imagem que a administração pública deve passar para as pessoas não pode ser a de um órgão carrancudo que só se disponha a exigir e a cobrar, mas a daquele que se proponha a servir. É preciso mudar a face do Estado fiscalista ou arrecadador, que vem dos tempos coloniais e contra a qual se levantaram, em Minas, os chamados Inconfidentes. Em vez do leão que ruge, o símbolo da Fazenda Pública haveria de ser a da face descontraída de quem se dispõe a ouvir. As obrigações para com o fisco devem ser cumpridas pelo simples fato de que o cidadão se sinta imbuído dos seus deveres para com a coletividade, representada pela administração pública, jamais pelo temor da sanção. Cumpre aos órgãos públicos inspirar confiança nas pessoas, infundir-lhes tranquilidade, fazer com que essas percebam que a administração trabalha em seu favor. O servidor público, por sua vez, deve atuar com o espírito de servir. E, por isso, convém, ao menos, saber sorrir…

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