Desde os tempos apostólicos, a Igreja Católica crê e ensina que Deus é o autor da Sagrada Escritura ao inspirar seus autores humanos; age neles e por meio deles. Fornece assim a garantia de que seus escritos ensinem sem erro a verdade salvífica (Catecismo da Igreja Católica nº 136). Na Bíblia, Deus fala ao homem à maneira dos homens, e, para descobrir a intenção dos autores sagrados, há que levar em conta as condições da época e da cultura deles, os chamados “gêneros literários” em uso naquele tempo, os modos, então correntes, de sentir, falar e narrar. Pois a verdade é apresentada e expressa de maneiras diferentes nos textos que são, de vários modos, históricos ou proféticos ou poéticos, ou nos demais gêneros de expressão. É preciso prestar atenção ao conteúdo e à unidade da Bíblia inteira.
O Papa emérito Bento XVI afirmou que “numa boa hermenêutica não é possível aplicar de modo mecânico o critério da inspiração ou da verdade absoluta, pinçando uma simples frase ou expressão. O plano em que é possível compreender a Sagrada Escritura como Palavra de Deus é o da unidade da história de Deus, numa totalidade em que os elementos individuais se iluminam reciprocamente e se abrem à compreensão” (Papa Bento XVI, Vaticano, 2 de maio de 2011). Na relação entre religião e ciência, sempre que alguma divergência tem surgido, um estudo mais acurado tem mostrado que ou a posição científica em desacordo com a Bíblia não era verdadeira, ou então que o texto bíblico não estava sendo interpretado corretamente. Na sua carta à Grã-duquesa mãe, da Toscana, Cristina de Lorena, o memorável cientista Galileu Galilei assim afirmou: “A Sagrada Escritura não pode nunca mentir, sob condição todavia de que seja penetrado o seu verdadeiro sentido, que – não julgo poder negar-se – está muitas vezes oculto e é diferentíssimo daquele que parece indicar o simples significado das palavras” (Edição nacional das obras de Galileu, vol. V, p. 315).
A Igreja Católica ensina que, segundo uma antiga tradição, podemos distinguir dois sentidos da Escritura: o sentido literal e o sentido espiritual, sendo este último subdividido em sentido alegórico, moral e anagógico. O sentido literal não deve ser confundido com o sentido “literalista” ao qual aderem os fundamentalistas. Quando se trata de um relato, o sentido literal não comporta necessariamente a afirmação de que os fatos contados tenham efetivamente acontecido, pois um relato pode não pertencer ao gênero histórico, mas ser um relato de caráter simbólico.
1- O sentido alegórico: podemos adquirir uma compreensão mais profunda dos acontecimentos reconhecendo a significação deles em Cristo; assim, a travessia do Mar Vermelho é um sinal da vitória de Cristo, e também do Batismo. 2- O sentido moral: os acontecimentos relatados na Escritura devem conduzir-nos a um justo agir. Eles foram escritos “para nossa instrução” (1Cor 10,11). 3- O sentido anagógico: podemos ver realidades e acontecimentos em sua significação eterna. Anagogia é a elevação da alma para as coisas celestes. Uma máxima medieval resume a significação dos quatro sentidos: “Littera gesta docet, quid credas allegoria, moralis quid agas, quo tendas anagogia” = “A letra ensina o que aconteceu; a alegoria, o que deves crer; a moral, o que deves fazer; a anagogia, para onde deves caminhar”. O ofício de interpretar autenticamente a Bíblia foi confiado exclusivamente ao Magistério da Igreja, ao Papa e aos bispos em comunhão com ele (Concílio Vaticano II: DV 10).
“Ego vero Evangelio non crederem, nisi me catholicae Ecclesiae commoveret auctoritas” = “Eu não creria no Evangelho, se a isto não me levasse a autoridade da Igreja Católica” (disse Santo Agostinho, nascido no ano 354).
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