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A República equilibrista

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Pouco antes do primeiro turno das eleições, vim à Tribuna falar sobre quais projetos de país os brasileiros poderiam escolher, mas a oposição à barbárie foi um imperativo. Caro leitor, foi por muito pouco. Por pouco mais de dois milhões de votos e um fiapo de cabelo que não fomos postos na frigideira, ou melhor, numa panela abarrotada com uma água, digamos, já morna.

A analogia com o sapo na panela, clichê para muitos, é funcional aqui: o sapo é posto na panela com água e, se esta for lentamente aquecida, o animal não perceberá que será morto, não reagirá. Na verdade, hoje em dia, alguns têm a visão de que as democracias representativas não morrem com grandes espetáculos golpistas aos moldes de 1964 no Brasil, mas com uma gradual diluição das instituições, neutralizando suas ações.

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Não cabe aqui conjecturar o que teria acontecido caso Jair Bolsonaro fosse reeleito, porque não sou um profeta, mas os sinais estavam claros para os que queriam vê-los. Dias antes do segundo turno, viera à tona uma proposta de expansão do número de ministros da Suprema Corte – quiçá a instituição mais atacada ao longo desse último quadriênio -, por exemplo.

Alguns costumam fazer referência à Hungria, país cujo representante esteve presente na posse presidencial de Bolsonaro, para tentar mostrar o que poderia ter acontecido no Brasil caso uma eleição acontecesse. Contudo é preciso tomar muito cuidado, porque, da mesma forma que o “pecado original” da análise histórica é o anacronismo, as comparações entre países não podem ser feitas de modo tão direto. Olhemos para a Hungria de hoje, vejamos até que ponto a comparação cabe.

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Algumas particularidades permitiram que a Hungria se tornasse o que seu próprio premiê chama de “democracia iliberal”, pelo menos desde a sua “redemocratização” em 1989. Sua sociedade civil não era tão engajada política e civilmente quanto a brasileira, países da Europa centro-oriental não têm tradição democrática historicamente, não houve a presença de valores liberais difundidos àquela época, Hungria era um país agrário, e o sistema judicial era “tecnocrata” – um constitucionalismo que se transformou num instrumento para as elites em vez de firmar a democracia participativa. Todas essas características estão no artigo do jurista húngaro Gábor Halmai “A Coup Against Constitutional Democracy – The Case of Hungary”, mas não são as mesmas do Brasil.

Primeiro, o Brasil tem uma sociedade civil extremamente ativa, inquieta, vide os vários movimentos sociais que tivemos – Sabinada, Balaiada, Revolução Pernambucana, Revolta da Chibata, o movimento das “Diretas Já”, MST etc. Segundo, o Judiciário, em particular o STF, tem muitos meios para ser acionado pela sociedade civil – ação popular, ação civil pública, mandado de segurança, mandado de injunção, habeas corpus e habeas data -, os remédios constitucionais. Terceiro, o Brasil tem precedentes com relação a regimes democráticos, ainda que restritos como durante a Primeira República e mais abertos como na Quarta República.

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A Nova República não é tão fácil de derrubar se compararmos com a Quarta República, mas isso fica para outro texto. Termino por aqui com o clichê atual: “O preço da liberdade é a eterna vigilância”.

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