Não é difícil analisar os dizeres de uma pessoa quando ela os expõem publicamente. Se alguém diz: “Como você tem dinheiro limitado, você vai ter que fazer escolhas, vai ter que definir onde você vai investir. Há uma pessoa mais idosa, que teve uma doença crônica, avançada e teve uma complicação. Para ela melhorar, eu vou gastar praticamente o mesmo dinheiro que vou gastar para investir em um adolescente, que está com um problema. A quantia é a mesma, só que essa pessoa é um adolescente que tem a vida inteira pela frente e a outra pessoa, idosa, que pode estar no final da vida. Qual vai ser a escolha?”
Claramente, observam-se nessa fala, no mínimo, duas síndromes. A do esquecimento e a da adivinhação. Esquece o autor que o dinheiro a que ele se refere tem origem, entre outras, nas contribuições de anos a fio que os idosos recolheram aos cofres públicos. O autor do texto em apreço, de quebra, como uma Pitonisa, adivinhou que o idoso poderia estar no fim da vida e que o jovem teria uma vida inteira pela frente. As duas premissas, fundamentadas em variáveis vazias, denotam a inexistência de qualquer dilema e, nos termos de seus dizeres, fica claro que a escolha já está feita.
Está na nossa Constituição: “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Sobre o direito à vida, assim já se pronunciou um eminente Ministro do STF: “O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.”
Ao longo da vida, pude observar que algumas pessoas, quando chegam a um grau de conhecimento ou são conduzidas a posições que lhes conferem possibilidades de decisões, às vezes, se perdem nos limites de sua condição de ser humano e adentram como verdadeiros posseiros nos limites dos domínios de Deus.
Se a questão de salvar vidas estivesse vinculada primariamente ao setor econômico, então o problema seria tão-somente de direcionamento de recursos financeiros. Ocorre que nada é tão simples assim, pois a humanidade está diante de uma realidade muito mais complexa. Em qualquer hipótese, não cabe neste momento qualquer tipo de decisão fundamentada em falsas premissas. É, pois, inaceitável a falácia de “fazer escolhas”, pois a vida de ninguém é mais ou menos valiosa do que de qualquer outro.
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