Criada em 1992 para punir agentes públicos responsáveis por desvios de recursos e outros atos lesivos ao erário, a Lei de Improbidade Administrativa foi um avanço na gestão pública, mas passou por uma intempestiva mudança com aval dos líderes da maioria dos partidos, da direita à esquerda, num processo conjunto capitaneado pelo próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Tramitando desde 2018, ele levou o novo texto direto para o plenário, que restringe a aplicação da lei.
O texto aprovado muda a regra de contagem do prazo de prescrição dos atos que podem ser considerados improbidade administrativa. O tempo máximo para se julgar e condenar um agente público com base nessa lei passou de cinco anos para oito anos.
O papel do Legislativo é elaborar e aperfeiçoar leis, mas o texto, agora encaminhado ao Senado, foi votado sem um necessário debate entre os próprios parlamentares. A pressa pode se justificar nos prazos eleitorais que começam a encurtar. A partir de outubro, leis que tenham repercussão direta no processo eleitoral só podem ser votadas com um ano de antecedência. Muitos dos enquadrados pela norma estarão nas urnas de 2022.
O documento atual, de fato, carece de correções, pois penaliza agentes públicos de forma geral, o que é um problema. Numa máquina administrativa com vários níveis, uma possível fraude nem sempre é detectada pela liderança. Um prefeito, governador ou presidente, por exemplo, assina dezenas de atos todos os dias, a despeito de avaliação de seus suportes jurídicos, mas nem sempre conseguem observar possíveis erros ocorridos durante o processo.
A lei, a despeito de todas essas possíveis falhas, que devem ser corrigidas, foi um avanço, por estabelecer segurança no trato do bem público. É também uma forma de proteção aos próprios agentes públicos diante da comum generalização que ocorria antes de sua aprovação.
A burocracia, ao contrário do recorrente discurso, é fundamental para o andamento da máquina pública, pois estabelece processos para o encaminhamento de demandas e de organização do Estado. Sem ela, seria o caos. A distorção se apresenta em decorrência de falas deliberadas que demonizaram o termo, que passou a significar atraso, incompetência e até corrupção.
Ao Senado cabe fazer correções e garantir à sociedade que a lei aprovada pela Câmara Federal não perca seu sentido e continue sendo uma garantia para a “res publica”, em vez de se transformar numa saída para aqueles que, de fato, fizeram mau uso de suas prerrogativas.