A votação apertada que levou à aprovação, em primeiro turno, da PEC dos precatórios, por uma diferença de apenas quatro votos, não dá garantia de obter o mesmo resultado no segundo turno, mas foi reveladora ao apontar o jogo pragmático que marca os bastidores do Parlamento. Partidos ditos de oposição ao Governo engrossaram a votação encaminhada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, e, além de garantirem o quórum, foram estratégicos na sua aprovação.
O resultado provocou uma crise imediata no PDT, levando seu declarado candidato à Presidência, Ciro Gomes, a suspender a campanha. Ele quer entender como um partido que tem uma candidatura própria vota a favor do adversário. Na justificativa, os deputados dizem que ele exagerou.
Sem o mesmo eco, mas com possíveis repercussões internas, o PSDB também emprestou a maioria de seus votos à mudança constitucional. Na oposição, de fato, ficaram apenas os tucanos liderados pelo governador de São Paulo, João Doria. Os demais, capitaneados pelo mineiro Aécio Neves, apoiaram a proposta.
A percepção fora do Congresso não tem a marca da novidade. Não é de hoje que a instância política atua de acordo com suas conveniências, afastando-se do viés ideológico e apartada do sentimento dos filiados. Na base dos fins justificando os meios, parlamentares apoiaram a PEC de olho nas bases e, sobretudo, nas emendas, cuja promessa de liberação pesou no processo. Um dos principais líderes do Centrão, o presidente da Câmara tem forte poder de persuasão, principalmente num ano que antecede as eleições.
O lado social da proposta de emenda constitucional tem forte apelo, por significar a implementação de um auxílio provisório de R$ 400 a cerca de 20 milhões de brasileiros hoje em precária situação financeira, mas é preciso, pelo menos, ficar atento para as repercussões econômicas. Em anos eleitorais, os governos, e sem exceção, tendem a aumentar os seus gastos para cumprir suas metas, o que, por si só, é um problema. No caso em questão, haverá rompimento do teto de gastos, que pode facilitar tais operações.
No curto prazo não há problemas, mas a economia tem uma dinâmica própria, e ações como essa – como já ocorreu em outros mandatos – cobram a conta depois com aumento das taxas de juros e repercussão direta na vida da população, com danos aos mais carentes, que, em boa parte, são beneficiados pelo auxílio.