É pouco provável que o Congresso, em pleno ano eleitoral, se dedique integralmente ao debate, mas a proposta – se confirmada – do presidente da Câmara, Arthur Lira, de colocar o semipresidencialismo na agenda não é de todo um problema. O parlamentar quer discutir a matéria por um período de cinco a seis meses e deixar a decisão para a próxima legislatura, isto é, caberá ao Congresso eleito em outubro a decisão de levar ou não a matéria adiante. Ele admite até mesmo um plebiscito, pelo qual o povo seria, de novo, chamado a dar sua opinião.
No entendimento de várias lideranças, e não apenas detentoras de mandato, o presidencialismo de coalizão, oriundo da Constituição de 1988, já se esgotou, carecendo de mudança profunda para garantir a governabilidade. Todos os presidentes da República, no período pós-constituinte, tiveram problemas em exercer o mandato por conta da plena dependência do Parlamento, e este, por seu turno, do poder de agenda do Executivo. Como consequência, a relação, que deveria ser republicana, tornou-se um balcão de negócios, muitas vezes, resvalando no ilícito, como ficou provado em vários escândalos discutidos no próprio Congresso. Houve de tudo: mensalão, petrolão, anões do orçamento e outras mazelas que comprometeram a essência do projeto de 1988.
O que Lyra sugere, no entanto, não dá plenas garantias, pois no fundo não haverá grandes mudanças, por ser um modelo que permeia pontos do presidencialismo e do parlamentarismo. O país já viveu uma experiência parlamentarista, no início dos anos 1960, quando Tancredo Neves foi indicado primeiro-ministro para garantir a permanência do presidente João Goulart – sucessor de Jânio Quadros, que renunciou – no comando do país. Um referendo deu fim ao projeto, quando foi feita a consulta sobre a permanência ou não daquele modelo de governo.
Já em 21 de abril de 1993, foi realizado um plebiscito que demandava escolher monarquia ou república e parlamentarismo ou presidencialismo. Essa consulta consolidou a forma e o sistema de governo atuais. A república foi escolhida por 43.881.747 (66,28%) eleitores, sendo que a monarquia recebeu 6.790.751 (10,26%) votos. Votaram em branco nesse item 6.813.179 (10,29%) eleitores, e 8.741.289 (13,20%) anularam o voto. Já 36.685.630 (55,41%) eleitores optaram pelo sistema presidencialista de governo, e 16.415.585 (24,79%), pelo parlamentarista. Votaram em branco nesse item 3.193.763 (4,82%) eleitores, e 9.712.913 (14,67%) votaram nulo.
Nos dois momentos, a comunicação era precária, e o debate com a sociedade carecia de aproximação, ficando mais nas instâncias de poder. Hoje, com as redes sociais, as discussões ganharam relevância, mas, até para esse momento, a fim de garantir debates sem contaminação do jogo de palavras e informação falsa, é preciso conscientização coletiva. Caso contrário, o voto popular pode ser conduzido a situações apartadas da intenção do legislador e do próprio interesse dessa mesma sociedade.