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Entenda por que candidatos bem votados, como Negro Bússola, não são eleitos

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Negro Bússola acredita que recebeu 5.085 votos porque população reconheceu seu trabalho social; entretanto, partido não atingiu quociente eleitoral necessário nem votação suficiente para elegê-lo nas sobras (Foto: Arquivo Pessoal)

“Não me considero derrotado nas urnas. O sistema me bloqueou. A minha cidade reconheceu o meu trabalho, disse ‘sim’ para mim. Tive 5.085 votos no momento mais adverso que a cidade poderia enfrentar. De 589 candidatos, ficamos em quarto, ou seja, 585 candidatos tiveram menos votos do que eu. Não posso me considerar um cara derrotado nas urnas, de forma alguma”, afirma Negro Bússola (Rede), 45 anos, que, no último domingo (15), embora tenha recebido a quarta maior votação nominal para a Câmara Municipal de Juiz de Fora, não foi eleito para cumprir mandato até 2024. A derrota de Negro Bússola chamou a atenção dos eleitores juiz-foranos, sobretudo porque, em 2016, filiado ao extinto PEN – hoje, Patriota -, o gestor de recursos humanos já havia conquistado a 11ª maior votação, e, assim como neste ano, ficou de fora da Câmara Municipal. Há quatro anos, entretanto, Negro Bússola foi, ao menos, eleito suplente, o que sequer conseguiu no atual pleito.

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Em suma, Negro Bússola não foi eleito porque a Rede Sustentabilidade, partido pelo qual o candidato concorreu, ficou a 67 votos de ter uma cadeira na Câmara Municipal no cálculo das sobras eleitorais. Ao contrário das eleições majoritárias – para prefeitos, governadores, senadores e presidentes -, as eleições proporcionais, como estas para vereadores, não elegem necessariamente os candidatos com as maiores votações, como explica o cientista político Rubem Barboza Filho, que participou, em 2015, de debates na Comissão Especial de Reforma Política na Câmara dos Deputados. “Um mecanismo específico das eleições proporcionais é o chamado quociente eleitoral, que diz simplesmente como o total de cadeiras das Câmaras será distribuído entre os partidos. Juiz de Fora tem 19. Logo, para fazer o cálculo do quociente eleitoral, é preciso dividir o total de votos válidos, exceto os votos brancos e nulos, pelo número de assentos da Câmara.”

Em Juiz de Fora, o total de votos válidos foi de 259.292, que, dividido por 19, dá 13.646. Nesta eleição, este foi o número mínimo de votos necessários a um partido para ter inicialmente ao menos uma cadeira na Câmara Municipal. O total de votos de um partido diz respeito à soma dos votos de todos os candidatos a vereador deste partido, mais os votos de legenda – quando o eleitor vota apenas no número do partido para vereador, não em um candidato especificamente. Em um primeiro momento, as vagas são distribuídas entre os partidos que superaram o quociente eleitoral, cujo cálculo é feito pela divisão do total de votos válidos de uma sigla pelo quociente eleitoral.

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Porém, conforme Barboza Filho, há ainda outro pré-requisito. “Vamos supor que um partido teve 40 mil votos, então provavelmente a sigla vai eleger três candidatos, já que o quociente eleitoral é de aproximadamente 13 mil. Porém, para serem eleitos, estes candidatos devem atingir, no mínimo, 10% do quociente eleitoral. Se um vereador deste partido teve 50 votos, não entra na Câmara. Os partidos têm que se preparar para isso. Os eleitores votam na legenda ou no candidato, mas o que conta para a distribuição das cadeiras é o total obtido pela legenda, não pelo candidato.”

No caso de Negro Bússola, embora ele tenha tido uma votação expressiva, a Rede Sustentabilidade somou ao todo 8.573 votos, cerca de cinco mil votos a menos do que o necessário para garantir uma cadeira na Câmara diretamente pelo quociente eleitoral – em Juiz de Fora, apenas PT, PSC, PSB, DEM e Cidadania conseguiram. Entretanto, no cálculo das chamadas sobras eleitorais, isto é, na distribuição do restante dos assentos do Legislativo entre os partidos que não obtiveram o quociente eleitoral, a Rede ficou a apenas 67 votos de tomar a última vaga, destinada ao vereador Nilton Militão (PSD).

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Caso a sigla tivesse ficado com a última cadeira, Negro Bússola seria o representante da legenda na Câmara Municipal, já que, além de ser o mais votado dentre os candidatos da Rede, atingiu os 10% necessários do quociente eleitoral. Em Juiz de Fora, este percentual corresponde a 1.364 votos. De acordo com Barboza Filho, lotado no Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), “não é uma eleição majoritária, é uma eleição proporcional. Então, a ideia é que a Câmara reflita a votação do eleitorado.”

‘Fui rejeitado por 12 partidos’

Em entrevista à Tribuna, Negro Bússola, pondera que a pandemia de Covid-19 e a mudança de local das seções eleitorais promovida pela Justiça Eleitoral foram obstáculos ao pleito. Contudo, ele considera que a credibilidade do trabalho por ele realizado nos últimos quatro anos foi renovada, mas revela que, no processo de busca por um partido para se candidatar, foi rejeitado por 12 siglas. “Mas não foi devido ao meu currículo e ao meu histórico como pessoa ou como ativista ou como político, mas, sim, porque comprometeria a legenda. Só de o meu nome ser citado nestes 12 partidos, já dava evasão, porque é um enorme forte, tanto é que eu teria entrado como primeiro ou segundo da chapa de todos os partidos que fizeram vereadores. O único que me aceitou e me acolheu foi a Rede. Tanto os partidos de esquerda, quanto de centro e de direita, não me aceitaram.” O candidato, entretanto, não quis revelar o nome dos partidos.

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Sobre a falta de uma quantidade mínima de votos para a Rede eleger um vereador, o cientista Barboza Filho diz que a Rede e o próprio candidato deveriam ter agregado mais candidaturas com potencial de votos para atingir o quociente eleitoral. “É um erro de cálculo que o candidato não pode fazer, ainda mais se já perdeu por esse mesmo motivo. A regra é clara, então não tem jeito. É uma pena, não tenho dúvidas. (…) Do ponto de vista realista, se vale algum conselho, é que ele monte o partido com mais profundidade, ou seja, que organize de fato o partido para que tenha candidatos vitoriosos. As outras legendas vão ficar com muito medo de aceitá-lo, porque elas já têm os seus campeões de voto. Não vão querer o Negro Bússola, porque vai significar que essas legendas vão perder os vereadores que buscam a reeleição.” A segunda candidata da Rede a receber mais votos foi Cristiana Ribeiro da Silva (Professora Cristiana), com 834 votos.

2022
Ainda que considere o atual regime eleitoral “ineficaz e injusto” e defenda candidaturas avulsas, Negro Bússola admite que deve submeter-se a ele. Aliás, o gestor em recursos humanos já ensaia uma candidatura em 2022, seja para deputado estadual ou federal, o que ainda não foi decidido. “Estamos dialogando com grupos, não aqueles grupos políticos viciados, estamos buscando reforços etc. Embora haja lugares em que eu ainda não chegue presencialmente, o nome Negro Bússola já está presente. A marca e o trabalho social já são a nossa plataforma, já são o nosso legado, já chegaram às áreas de vulnerabilidade social em parte da Zona da Mata e do Campo das Vertentes. Quero estimular outros jovens de periferia e afrodescendentes para saberem que temos locais de destaque muito maiores do aqueles historicamente definidos para nós mesmos. Acho que a candidatura do Negro Bússola é uma retratação, uma exposição da periferia.”

Errata: na versão anterior da matéria, a Tribuna havia registrado que Negro Bússola não tinha sido eleito para a Câmara Municipal de Juiz de Fora porque a Rede Sustentabilidade não atingira o quociente eleitoral. Entretanto, embora o partido não tenha de fato superado o quociente eleitoral, Negro Bússola não foi eleito porque, durante a distribuição das sobras eleitorais, a Rede ficou a apenas 67 votos de conquistar a última vaga do parlamento, distribuída, por fim, ao PSD. O erro foi corrigido às 23h40 deste domingo (22).

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