A proposta do Governo de Minas Gerais de um novo modelo de gestão para o Hospital Regional João Penido, no Bairro Grama, Região Nordeste de Juiz de Fora, foi tema de discussão em audiência pública realizada na tarde desta terça-feira (15), na Câmara Municipal de Juiz de Fora. Sem a manifestação de representantes do Estado e da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), a maioria dos posicionamentos foram contrários ao formato proposto pela Fhemig, em edital lançado no fim do ano passado que prevê a transferência da gestão do aparelho de saúde para uma organização social, ao custo de R$ 65 milhões por ano. O entendimento das vozes contrárias é de que se trata de uma terceirização da prestação do serviço. Conforme informação do Ministério Público de Minas Gerais, a tramitação do edital se encontra suspensa desde o último dia 4, atendendo a recomendação da 22ª Promotoria de Justiça da Comarca de Juiz de Fora.
No último dia 26 de janeiro, a 22ª Promotoria de Justiça recomendou à Fhemig “a suspensão da tramitação do processo do Edital Fhemig 02/2021 de seleção pública para celebração de contrato de gestão do Hospital Regional João Penido com organização social”. De acordo com a recomendação, a medida deve ser adotada, pelo menos, até o cumprimento de algumas medidas, como a “realização de estudo da necessidade e viabilidade de lotação dos servidores em outros setores e unidades de saúde do Estado de Minas Gerais”; “previsão de critérios objetivos para a prorrogação do prazo de vigência máximo por 20 anos, especialmente apresentação de comprovações trimestrais de efetivo cumprimento das metas”; e supressão de itens específicos de pontuação considerados como restritivos à competitividade do certame. Segundo o MPMG, a Fhemig solicitou prazo de 15 dias para responder às recomendações, período que expira em 3 de março.
Audiência pública
O novo desenho é colocado pelo Estado como uma solução para a reabertura do pronto atendimento no hospital. A reabertura, por meio de investimentos estaduais, também é defendida por aqueles que lutam pela manutenção da gestão pública da unidade. A suspensão dos serviços de urgência e emergência se deu ainda em 2014, por conta de obras na unidade hospitalar, comprometendo a assistência a boa parte das pessoas que vivem na Região Nordeste de Juiz de Fora.
A realização da audiência pública foi proposta pela vereadora Cida (PT). Para a parlamentar, a transferência da gestão do hospital para uma organização social é vista como uma “privatização”, em que perdem a população e os servidores de saúde lotados na unidade hospitalar. “Quem ganha com a entrega desse patrimônio público para estas organizações sociais?”, questiona.
Ainda de acordo com a proponente, no modelo atual, os gastos do Governo estadual com o Hospital Regional João Penido são de cerca de R$ 111 milhões anuais. Com o modelo das organizações sociais, de acordo com o edital publicado pela Tribuna, haveria repasse total de R$ 130 milhões, em dois anos, para a gestão da unidade hospitalar. Para Cida, “a matemática não fecha” e a mudança “significa uma privatização”. “Sob o pretexto de abrir o atendimento de urgência e emergência, que está fechado desde 2014, o Governo coloca este pepino na mesa”, considera.
Necessidade de reabertura do pronto atendimento é consenso entre parlamentares
Outros vereadores questionaram a mudança da gestão do Hospital Regional João Penido, proposta pelo Governo de Minas. Laiz Perrut (PT) considerou o risco de precarização do serviço. Médico e vereador, Antônio Aguiar (DEM) também se posicionou de forma contrária à possibilidade e reforçou entendimento de que, com a mudança, o Estado “se desobriga daquilo que é responsabilidade dele”. “É algo muito perigoso.”
Para o presidente da Câmara, o vereador Juraci Scheffer (PT), as alterações colocadas no modelo de gestão do hospital “são danosas e enfraquecem a prestação do serviço de saúde para a população”. Vagner de Oliveira (PSB), Tallia Sobral (PSOL) e Kátia Franco Protetora (PSC) também demonstraram preocupação com o novo modelo proposto e defendem que o Poder Público assuma a responsabilidade pela reabertura do atendimento de porta.
Dois vereadores, Bejani Júnior (Podemos) e Sargento Mello Casal (PTB), porém, afirmaram que, independentemente de uma possível transferência da gestão da unidade hospitalar para uma organização social, o mais importante é garantir, o mais breve, possível a reabertura do atendimento de urgência e emergência do Hospital Regional João Penido.
Para o deputado estadual Roberto Cupolillo (Betão, PT), a proposta de transferir a gestão do João Penido faz parte de um projeto político do governador. “A discussão é política. Zema se pauta por uma política de privatização. De todo o tipo”, disse.
O parlamentar estadual ainda colocou outro entendimento visto como problemático, em caso de mudança na gestão. Ele teme o fim do atendimento de algumas especialidades. Neste caso, citou especificamente o parto humanizado e o atendimento a crianças, adultos e idosos com algum tipo de incapacidade física, com a dispensação de órteses e próteses. “Pode abrir uma coisa e ir retirando outras. O parto humanizado não é lucrativo para uma organização social.”
Conselho Municipal de Saúde e servidores se manifestam contra proposta
Secretário de Saúde da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), Ivan Chebli afirmou que a transferência do modelo de gestão do Hospital Regional João Penido para uma organização social não conta com a aprovação do Conselho Municipal de Saúde. “Esse assunto já foi discutido no plenário do Conselho Municipal de Saúde que decidiu, por unanimidade, que o hospital continue sob gestão pública da Fhemig”, pontuou. Chebli classificou a unidade como estratégica para toda região. “O Município está disposto a discutir sempre esse contrato. Não me parece que haja muito interesse da gestão estadual de abrir as portas”, afirmou, ao questionar a ausência de representantes do Estado e da Fhemig na audiência pública.
Em sua fala, a ouvidora municipal de saúde, Samantha Borchear, reforçou que o Conselho Municipal de Saúde já se debruçou sobre o tema e é contrário à proposta colocada pelo Governo, por meio da Fhemig. “De forma unânime, rejeitamos a proposta de uma organização social fazendo a gestão do João Penido”, afirmou. Samantha reforçou a importância da unidade hospitalar para o sistema de saúde de Juiz de Fora e região, contudo, ressaltou que, “com o passar dos anos, temos acompanhado o sucateamento daquele equipamento”. “Não apoiamos a entrega.” O posicionamento foi reafirmado por dois conselheiros municipais presentes à audiência pública.
Representantes do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (SindSaúde-MG) também firmaram posição contra a mudança do modelo de gestão do Hospital Regional João Penido. Diretora regional da entidade, Lenir Romani considerou que o assunto é “vital para a saúde dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) de Juiz de Fora e região”. A sindicalista afirmou que uma gestão por uma entidade privada pode comprometer a qualidade do serviço prestado e defendeu investimentos do Estado na unidade. “A palavra investimento é essencial para uma saúde de qualidade. Ao privatizar o hospital, o mesmo se transformará em mais uma empresa visando o lucro, em detrimento de uma prestação de serviços de qualidade”, disse.