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Estado brasileiro será julgado na OEA por omissão em assassinato de juiz-forano

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Gabriel Sales Pimenta nasceu em Juiz de Fora em novembro de 1954. Passou a infância e a adolescência e cresceu na turma da Rua Oscar Vidal. Filho de Geraldo e Maria da Glória, já falecidos, pertence a uma família de membros do Movimento Familiar Cristão. Tem seis irmãos. Sérgio, Marcos, Rafael, André e Daniel moram na cidade. O outro irmão, Zé Pimenta, faleceu em 2018. Ao longo de sua vida, envolveu-se com a política estudantil. Fez teatro no Grupo divulgação. Residiu em solo juiz-forano até se formar em Direito, na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Saiu para tomar posse no Banco do Brasil, em Brasília. Inquieto, trocou o cargo público e a capital federal para advogar para a Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Conceição do Araguaia, no Pará. Pouco depois, seguiu para Marabá, onde, por sua atuação como defensor dos direitos humanos, foi assassinado em 18 de julho de 1982. Três tiros pelas costas. O suspeito de ser o assassino e dois mandantes foram identificados, mas, nunca levados a júri popular. Quase 40 anos depois do crime, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) vai julgar, nos próximos dias 22 e 23 de março, uma possível responsabilidade do Estado pela situação de impunidade na qual se encontram os atos relacionados à morte de Gabriel Pimenta, defensor dos direitos dos trabalhadores rurais.

Gabriel Sales Pimenta nasceu em Juiz de Fora e formou-se em Direito na UFJF (Foto: Arquivo de família)

A introdução é longa. Pequena, porém, para esclarecer tudo que se sucedeu ao assassinato que abreviou a vida do jovem e promissor advogado juiz-forano. Um de seus irmãos, Rafael Pimenta, conversou com a Tribuna para contar a fugaz, porém marcante, trajetória de Gabriel. “Ele foi um jovem que foi assassinado aos 27 anos. Teve uma atuação política meteórica. Foi isso que ele quis fazer”, resumiu, já na primeira pergunta feita pela reportagem. Rafael falou muito sobre o irmão, como se pode ler abaixo. Mas falou também sobre o julgamento que acontece em dez dias. “O caso do Gabriel é o primeiro caso na Corte Interamericana de um advogado assassinado no Brasil por crime contra os direitos humanos. Essa é a importância do que estamos fazendo agora.”

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Segundo Rafael Pimenta, a família e os advogados do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) e da Comissão Pastoral da Terra do Pará reivindicam que o Estado brasileiro seja condenado a reparar danos materiais e morais. Também pedem que o país estabeleça regras, para que não se repita o mesmo modus operandi judicial no Brasil. Este último pleito se refere às medidas de não repetição e visam a evitar que defensores dos direitos humanos enfrentem os mesmos obstáculos que ceifaram a vida de Gabriel e que impediu a família de obter justiça.

“O Gabriel estava sendo ameaçado de morte há mais de um ano. Ele esteve em Belém do Pará, na capital do estado, e tentou deixar isso registrado, junto à Secretaria de Segurança Pública do Estado, que não deu a mínima. Então, a gente vê que o Estado brasileiro, ao qual todos nós somos ligados e pagamos impostos, não faz nada em relação à proteção dos defensores de direitos humanos. Ser advogado de segmentos marginalizados da sociedade é sofrer a mesma violência que o grupo sofre. Em qualquer sociedade mais desenvolvida que a nossa, essas pessoas recebem proteção”, defende Rafael Pimenta.

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“Estamos querendo que, entre as medidas de não repetição, o Estado brasileiro seja condenado a criar uma legislação protetiva para os defensores de direitos humanos. Isso não existe no Brasil. Uma sentença 20 anos depois é uma injustiça. A gente também acha que pode ser que o Estado brasileiro venha ser condenado a reduzir a morosidade dos processos”, explica.

Gabriel Pimenta, de barba, em contato com lavradores na região do Pará (Foto: Arquivo de família)

Julgamento poderá impactar políticas de proteção a defensores de direitos humanos

Co-diretora do Programa Brasil y Cone Sul do Centro pela Justiça e o Direito Internacional, Helena Rocha destaca a importância do julgamento marcado para os dias 22 e 23 de março. Ao lado da da Comissão Pastoral da Terra, o Cejil representa a família no caso discutido na Corte Interamericana de Direitos Humanos.

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“É um caso muito emblemático. Por mais que a morte do Gabriel tenha ocorrido há 40 anos, ela ainda representa problemas que temos até hoje, com relação à violência e à impunidade em crimes contra defensores de direitos humanos do Brasil”, avalia. Para Helena, o caso de Gabriel Pimenta representa um padrão de violação por parte do Estado brasileiro. Nesses 40 anos, os índices de violência no campo e os índices de violência contra defensores continuam em alta. O Estado não conseguiu dar uma resposta efetiva a esses fatos.”

Assim, há uma grande expectativa de que a Corte Interamericana de Direitos Humanos determine que o Estado brasileiro adote medidas de não repetição. “Uma das características da Corte Interamericana e do Sistema Interamericano é a possibilidade de impactar para além do caso específico. Com um caso, muitas vezes, a gente consegue que sejam determinadas medidas que impactam toda a estrutura e todas as questões que estão relacionadas à não repetição daquela situação. Nesse caso, estamos discutindo justamente toda a política pública de proteção a defensores de direitos humanos no país e também a devida diligência e a forma como o sistema de justiça trata esses casos. Acho que podemos ter uma sentença que tenha um impacto importante para mudar essas políticas”, afirma a Co-Diretora da Cejil.

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Trâmite do julgamento

Após a realização das sessões de julgamento na segunda quinzena deste mês, o resultado não será conhecido de imediato. Ainda haverá outras etapas processuais, até as alegações finais das partes. A sentença normalmente vem em cerca de seis meses depois da audiência. Vamos destacar exatamente a importância do caso e a importância da adoção de medidas de não repetição”, explica Helena.

Pará registra mais de cem homicídios nas últimas quatro décadas

Advogado da comissão pastoral da terra do Pará, José Batista Afonso atua na acusação do caso do assassinato de Gabriel Pimenta desde 2002 e também representa a família na ação levada à Corte Interamericana de Direitos Humanos. Batista relatou à reportagem que mora em Marabá desde 1977 e que os casos de violência e crimes contra defensores dos Direitos Humanos na região continuaram acontecendo, mesmo após toda a repercussão da morte do advogado juiz-forano, em 1982.

“Esse julgamento tem um papel muito importante. Nós acreditamos que o Estado será condenado. Essa decisão terá um efeito de extrema importância, um efeito simbólico muito grande. É o primeiro caso de um advogado defensor de direitos do Brasil que será julgado pela Corte Interamericana. A decisão servirá de parâmetro para muitos outros casos que também estão tramitando na Corte sobre lideranças do Brasil assassinadas, em que os crimes não foram devidamente apurados”, afirma o advogado da CPT.

Segundo Batista, desde o assassinato de Gabriel Pimenta, o Estado do Pará computou 111 homicídios contra defensores dos Direitos Humanos. “Após o assassinato do Gabriel, 111 lideranças defensoras de direitos humanos foram assassinadas no estado do Pará. Noventa por cento desses crimes ocorreram nessa região do Sul e Sudeste do Pará, onde o Gabriel foi assassinado. Quase a totalidade dos crimes também tiveram um resultado final de impunidade em relação aos responsáveis.”

Desde o assassinato, família espera por justiça

“Gabriel foi assassinado por grileiros”, conta Rafael. O crime foi de ameaça a homicídio, após Gabriel ter garantido o direito à terra a trabalhadores rurais posseiros e seus familiares na localidade de Pau Seco, em Marabá. Em 1980, a área havia sido reivindicada por dois homens, que estariam envolvidos na morte do advogado juiz-forano. Eles alegaram que eram proprietários das terras por compra.

“Acontece que parte dessa terra já era propriedade daquelas pessoas pobres, que procuraram o Gabriel e outro advogado. Eles propuseram um mandado de segurança e obtiveram uma liminar que conseguiu botar as famílias de volta àquelas terras. As famílias voltaram de caminhão, soltando foguete. Uma festa danada. Eu presumo que tenha sido a primeira liminar em conflito de terra no Brasil que tenha sido dada em favor dos posseiros contra os grileiros e contra o juiz de primeiro grau. Aí, os grileiros juraram o Gabriel de morte. Isso era comum”, relata Rafael Pimenta.

Segundo ele, Gabriel foi morto dias antes da sessão de julgamento do mandado de segurança, em Belém, que confirmou a liminar e manteve as famílias dos posseiros na terra. “Estão lá até hoje”, diz Rafael.

Desde o assassinato, a família espera por Justiça. “Em dois meses, o inquérito estava concluído e foi entregue ao promotor, que denunciou o caso à Justiça. A partir de antão, o processo foi sendo retardado intencionalmente”, afirma Rafael. Também advogado, o irmão de Gabriel relata ter visto de perto a morosidade do andamento processual, que resultou em impunidade. “Quando eu me formei em Direito, em 1990, fui a Marabá pela primeira vez ver o processo, que estava há dois anos no escritório do advogado do réu, sendo que ele tinha recebido vista de cinco dias.”

Mesmo claudicante, o processo teve uma sentença de pronúncia em setembro de 2000, que transitou em julgado em 7 de janeiro de 2002. Apenas um dos mandantes foi pronunciado. Um deles já havia morrido. No caso do pistoleiro acusado dos disparos, a denúncia foi julgada improcedente por falta de provas.

Uma das manifestações por justiça realizadas pela comunidade e por amigos de Gabriel (Foto: Abrapo)

Acusado se ausenta de sessão do júri e é beneficiado por prescrição

Inicialmente, a Sessão do Tribunal do Júri foi agendada para acontecer em março de 2002, mas não pôde ser realizada por conta do desaparecimento do réu, no caso, um dos mandantes. Só em novembro de 2005, uma nova Sessão de Tribunal do Júri foi reagendada para o dia 15 de fevereiro de 2006. O acusado, uma vez mais, não compareceu. Em abril de 2006, a polícia conseguiu cumprir o mandado de prisão do homem acusado de mandar matar Gabriel Pimenta, após o próprio ter informado à Justiça seu endereço. O réu estava em outro local, todavia, em Pitangui, Minas Gerais, em uma fazenda de seu irmão.

Ainda em abril de 2006 foi designada a realização do julgamento pelo Tribunal do Júri. Antes da sessão, no entanto, os advogados do réu ingressaram com habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Pará, requerendo a extinção da punibilidade.

Segundo o Código Penal, o prazo máximo de prescrição da pretensão punitiva, em relação a homicídio, é de 20 anos, e é reduzido à metade quando o criminoso tem mais de 70 anos na data da sentença. O réu havia se tornado septuagenário em 1995. O pedido foi deferido em maio de 2006. Naquela ocasião, o assassinato de Gabriel Pimenta já completava mais de 23 anos à espera de justiça. “Ele (o réu) se deixou prender, para que pudesse entrar com um recurso, comprovando a prescrição de sua punibilidade”, lamenta o irmão da vítima.

Foro internacional

De acordo com Rafael Pimenta, já são 16 anos em que a família questiona o Estado em busca de justiça. “O processo do crime do Gabriel teve a sentença de pronúncia e poderia ter chegado ao Tribunal do Júri se o réu tivesse sido encontrado. Assim, ele parou e se extinguiu com a extinção da punibilidade do réu pela idade. Aí, nós, na família, acionamos o Governo do Estado do Pará e o Poder Judiciário do Pará na Justiça de Marabá. A juíza de primeiro grau fez uma sentença que condena o Estado do Pará e o Poder Judiciário por negligência na apuração dos fatos do crime do Gabriel. A sentença da juíza de primeiro grau é completa, plena. O Tribunal de Justiça do Pará reforma a sentença e considera que não há, no caso, elementos de convicção suficientes para provar que o Poder Judiciário do Pará foi negligente e moroso. É um absurdo”, desabafa Rafael.

A família recorreu a instâncias superiores, como Superior Tribunal de Justiça, questionando as ações, ou omissões, do Estado do Pará e do Poder Judiciário na condução do caso envolvendo o assassinato de Gabriel Pimenta. Sem sucesso, no entanto, restou à família buscar foros internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos. “Quem puxou essa linha foi o Zé Pimenta, meu irmão, em contato com um escritório de advocacia continental, que coleta casos de crimes contra direitos humanos na América do Sul, Central e do Norte. Como eu tinha todos os documentos, a gente municiou o Cejil. A petição foi remetida e passou por todas as fases até o julgamento, agora, em março”, explica Rafael Pimenta.

‘Estado é responsável por violação dos direitos’, diz Comissão Interamericana

Em dezembro de 2020, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) tornou público entendimentos de seu relatório de mérito que concluiu que a investigação dos fatos relacionados à morte de Gabriel Pimenta, que terminou em 2006 com uma decisão de prescrição, esteve marcada por omissões do Estado.

“As autoridades não agiram com a devida diligência para proteger testemunhas ameaçadas e evitar a fuga do acusado, além de que violou-se a garantia do prazo razoável”. Assim, a CIDH apontou que o Estado do Brasil é responsável pela violação dos direitos à vida, à justiça e à associação estabelecidos pela Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem; e dos direitos à integridade pessoal, às garantias judiciais, e à proteção judicial definidos pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Ao apresentar o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos, a CIDH pede que o Estado seja condenado a reparar integralmente os familiares de Gabriel, por meio de indenização pecuniária e medidas de satisfação que contemplem os danos materiais e imateriais causados pelas violações. Também é requerido que o Estado brasileiro proceda uma investigação para esclarecer os fatos e indicar as possíveis responsabilidades materiais e intelectuais das diferentes instâncias de decisão e execução, e, assim, impor as punições cabíveis.

Ainda é pedida a adoção de medidas de não repetição, como o fortalecimento do Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos; realização de diagnóstico independente sobre a atual situação dos defensores de direitos humanos no contexto dos conflitos de terra no país, para erradicar as fontes de risco que eles enfrentam, e fomentar, por exemplo, o fortalecimento da capacidade de investigação de delitos contra defensores de direitos humanos.

Desde a morte do advogado juiz-forano, comunidade da região onde Gabriel Pimenta atuou se mobiliza para que haja punição aos culpados (Foto: Abrapo)

Impunidade será avaliada pela Corte

No dia 4 de dezembro, a CIDH apresentou o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos. “O caso se refere à responsabilidade do Estado pela situação de impunidade na qual se encontram os atos relacionados à morte de Gabriel Sales Pimenta, defensor dos direitos dos trabalhadores rurais, ocorrida em 1982 no estado do Pará. Essa morte ocorreu em um contexto de violência relacionado com as demandas por terra e por reforma agrária no Brasil”, diz a comissão.

Em seu relatório, a CIDH determinou que Gabriel, que era advogado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabá e atuava em ações judiciais contra os latifundiários na região de Pau Seco, “recebeu diversas ameaças, em decorrência de seu trabalho, nos meses que antecederam o seu assassinato”. “Gabriel Sales Pimenta, que solicitou a proteção do Estado, teria denunciado as ameaças recebidas às autoridades de Belém, capital do estado do Pará, onde teria recorrido pessoalmente para pedir ajuda em três ocasiões”, afirma a entidade.

Ainda de acordo com a CIDH, após o assassinato, o apoio policial, demandado de Belém, chegou em Marabá apenas no dia seguinte da morte. “O Estado brasileiro teve conhecimento ou deveria ter tido conhecimento da situação de risco real e iminente na qual se encontrava o senhor Sales Pimenta e não adotou nenhuma medida para protegê-lo deste risco e impedir a materialização do mesmo”, concluiu o relatório. Para o colegiado, “o legítimo exercício do direito à liberdade de associação e à defesa dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais por parte do senhor Sales Pimenta gerou uma retaliação fatal em um contexto de falta de proteção do Estado”.

Desde 1998, Brasil reconhece decisões da Corte

O Estado do Brasil ratificou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos em setembro de 1992. Em dezembro de 1998, o Senado aprovou projeto que reconhece que as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, criada em 1978 pelo Pacto de São José da Costa Rica, serão obedecidas pelo Brasil. A declaração de aceitação da competência obrigatória da Corte foi depositada junto à Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos em 10 de dezembro de 1998.

“A morte de Gabriel Sales Pimenta ocorreu antes da ratificação da Convenção Americana pelo Brasil, de modo que a submissão do presente caso à Corte Interamericana se refere exclusivamente aos fatos que começaram ou continuaram ocorrendo após a data da ratificação, fundamentalmente os relacionados à falta da devida diligência na investigação e aos fatores que causaram uma denegação de justiça em relação aos fatos do caso”, pontua a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos.

O que é a Comissão?

A CIDH é um órgão principal e autônomo da OEA e tem por objetivo promover a observância e a defesa dos direitos humanos em seus estados signatários, como o Brasil. A Comissão é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.

As lembranças do irmão

“Ele se formou em Direito na Universidade Federal de Juiz de Fora, por volta dos 23 anos. Então, mudou-se para Brasília e foi trabalhar no Banco do Brasil por um período de um ano. Nesse intervalo, foi convidado por conhecidos de Juiz de Fora a integrar a equipe de advogados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em Conceição do Araguaia.”

Assim, Rafael Pimenta lembrou o caminho feito por seu irmão após deixar Juiz de Fora. Rafael ainda lembrou o início da militância de Gabriel na defesa dos direitos humanos de trabalhadores rurais e posseiros de terras improdutivas e abandonadas em Conceição do Araguaia, cidade do sudeste paraense, marcada pela Guerrilha do Araguaia, em 1972.

“Isso fica no imaginário geral”, comentou Rafael sobre a guerrilha, antes de pontuar que a cidade paraense era vista como “um local de entrada para a atividade organizada no campo”. Gabriel entrou por esse caminho com seus conhecimentos como advogado e também com o coração, sob olhares incompreendidos.

“Os colegas dele, no Banco do Brasil, ficaram malucos. Não entendiam. Ele? Feliz da vida porque estava abandonando o banco para ser advogado em Conceição do Araguaia. Ficou lá um ano e pouco. Aí, surgiu uma diferença do ponto de vista ideológico entre ele e os colegas da CPT. Eles imaginavam que ele iria fazer a catequese da Pastoral da Terra, enquanto ele queria saber de ensinar as pessoas a se organizarem. Estava noutra vibe. O sentimento dele era bem diferente.” De certa forma, foi esse sentimento que levou Gabriel até Marabá e até aquele 18 de julho de 1982 em que seu coração deixou de bater pela violência da grilagem paraenses nos idos dos anos de 1980.

Inquietação

Ainda em Conceição do Araguaia, nas palavras de Rafael, Gabriel começou “a ajudar o povo da região”. “De carro, viajava 500 quilômetros para uma comunidade. Viajava 300 quilômetros para outra. Isso tudo, ensinando as pessoas a montar associações, sindicatos, grupos de mulheres, grupos de trabalhadores… Isso criou uma inquietação na CPT. Ele percebeu esse conflito de ideias quando surgiram pressões e aceitou a se mudar para Marabá. Durante cerca de dois anos em Marabá, ele criou entre três e quatro sindicatos. Criou várias associações. Ajudou a população a se organizar. Ali, ele também se afastou da CPT e ficou por conta dos sindicatos, do ponto de vista da sustentação financeira dele”, lembra Rafael.

Em família

Para Rafael, a inquietação política de Gabriel corre no sangue dos Sales Pimenta. “A gente sempre gostou de política. Meu pai foi presidente de sindicato. Meu pai e minha mãe participavam do movimento familiar cristão aqui em Juiz de Fora. Eram muito ativos nesse movimento. Nós todos sempre gostamos de política. O Gabriel participou da reconstrução do DCE na UFJF, junto com o Zé e uma juventude grande. Foi da diretoria de reconstrução da UNE. Então a gente gostava muito de política”, conta.

Assassinato ocorreu após convenção partidária

Em Marabá, Gabriel Pimenta ainda se envolveu com a política partidária. “Nessa época, em Marabá, só tinha o PDS ‘um’ e o PDS ‘dois’. O Gabriel funda o PMDB”, resume o irmão. Segundo relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, após o término de uma convenção do PMDB na cidade paraense, Gabriel foi a um bar denominado “Bacaba”. Quando deixou o local ao lado de um casal, por volta de 22h30 do dia 18 de outubro, foi surpreendido por seus assassinos. “Os três caminhavam em direção ao carro de uma outra amiga, quando passaram por um veículo tipo Fusca, de cor bege”, detalha a CIDH.

Ainda de acordo com o relato, o homem que acompanhava Gabriel teria então ouvido um indivíduo dizer. “É o alto!” Após o alerta, um homem surgiu de dentro do Fusca e disparou contra o advogado juiz-forano, que caiu após o segundo tiro. Segundo o casal que saiu do bar junto com a vítima, Gabriel já estava sem vida após o terceiro tiro, enquanto o Fusca fugia em alta velocidade.

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