Conforme explica a professora do Departamento de Ciências Administrativas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Cássia Santiago, as inovações tecnológicas chegaram ao serviço público por volta dos anos de 1990, quebrando paradigmas que se sustentaram por anos. “Durante muito tempo o papel era tido como uma ferramenta de gestão burocrática no serviço público. Nos órgãos governamentais, tudo precisa ser rastreado, as organizações precisam prestar conta do que é feito. Aí entra o papel, porque ele era um documento que era assinado e ia tramitando nas instituições.”
É nessa época também que passa a ser discutido o conceito de Governo Eletrônico no Brasil e muitos serviços passam a ser ofertados de forma on-line, como a entrega de declarações do Imposto de renda, divulgação de editais, emissão de certidões de pagamentos e impostos, entre outros. “A internet passa a ser utilizada de forma integrada ao papel. Na época, isso gerou muita insegurança, foi preciso trazer essa mentalidade para dentro da cultura organizacional e fazer com que os servidores entendessem a segurança da informação que a digitalização poderia trazer.”
De acordo com a docente, a partir de 2011, o Brasil viveu de forma mais intensa a popularização da internet nos órgãos públicos. “Isso proporcionou uma série de benefícios, incluindo a contenção de custos, visto que antigamente um documento precisava ser enviado até Brasília pelos Correios e hoje tudo é feito de forma digital. Além disso, a digitalização proporciona uma menor duplicidade, uma facilidade na transparência e eficiência nos serviços.”
Ela afirma que o Brasil possui um dos sistemas mais modernos na digitalização dos serviços, no entanto, o que impede um maior avanço são os problemas de infraestrutura presentes no país. “O Brasil é um país de proporções continentais e, até hoje, a internet não chega em determinados pontos. Sem contar que a internet ainda é um serviço pago, portanto em famílias com condições sociais mais vulneráveis ela não está presente. Por isso, enquanto esses problemas estruturais não foram solucionados, não é possível pensar em uma sociedade 100% digitalizada, mas a tecnologia pode sim ser usada de forma integrada e melhorar muito a oferta desses serviços básicos.”
Plataforma Prefeitura Ágil já teve mais de 134 mil solicitações só em 2022
Criado em março do ano passado, a plataforma Prefeitura Ágil tem como objetivo auxiliar os cidadãos com a abertura e solicitação de serviços, documentos e ações de zeladoria. Segundo informações da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e Inclusivo, da Inovação e Competitividade (Sedic), entre janeiro e julho de 2022, a plataforma já recebeu 134.025 solicitações, 88% do total registrado nos nove meses de funcionamento em 2021, quando 152.220 pessoas demandaram serviços pela plataforma.
Quem lidera o ranking de serviços mais solicitados, neste ano, são os pedidos de atestado médico para servidores, entre janeiro e julho, foram 6.558 solicitações. Em segundo lugar está a solicitação de Certidão Negativa de Débito de Imóvel (CNDI), com 6.010 pedidos, seguido pelo pedido de Emissão de Débito para Pagamento à Vista, com 5.668 solicitações.
O secretário da Sedic, Ignácio Delgado, afirma que o Prefeitura Ágil é apenas o primeiro de muitos passos que devem ser tomados por Juiz de Fora para digitalização de seus serviços. De acordo com ele, a Prefeitura (PJF) tem trabalhado em uma iniciativa que vai integrar todas as secretarias que realizam atendimentos diretos ao cidadão para que elas tenham contato com empresas de tecnologia e possam realizar seus processos de forma on-line. “Dessa forma a própria Prefeitura terá uma maior celeridade nos processos e o cidadão um melhor atendimento. […] Nosso objetivo é que a maior quantidade de serviços possíveis sejam ofertados de forma remota, como a marcação de consultas em Unidades Básicas de Saúde (UBS), por exemplo.”
Participação direta do público em Projetos de Lei
Neste ano, a Câmara Municipal de Juiz de Fora decidiu dar um passo a mais na digitalização. Foi criado, em junho, o aplicativo Câmara JF que, dentre outros serviços, possibilita a participação direta do público em comentários e avaliações de Projetos de Lei (PL) propostos por vereadores da casa. Nele o cidadão pode adicionar um comentário, sugestão ou crítica a um PL e esse é direcionado diretamente ao gabinete do vereador responsável.
O Coordenador da Superintendência de Comunicação Legislativa da Câmara Municipal de Juiz de Fora, Luiz Fernando Priamo, afirma que a interação mais ampla com o cidadão é o objetivo principal da digitalização dos serviços. “É o nosso objetivo cidadão, garantir que o público esteja junto à Câmara, acompanhando participativamente a produção legislativa.”
Além do aplicativo, a Câmara também disponibiliza o número de Whatsapp (32) 99183-0706, para que as pessoas enviem comentários que serão discutidos durante as audiências públicas. Essa inovação surgiu durante a pandemia da Covid-19, no qual todas as plenárias foram realizadas de forma remota. Atualmente a presença física dos vereadores é exigida na casa, mas, em casos de audiência pública, as partes envolvidas podem acompanhar remotamente a discussão. “Na pandemia houve uma quebra de paradigma de que alguns trabalhos só poderiam ser realizados presencialmente. Com a participação remota nós garantimos a colaboração de alguém que não teve condições de estar presente naquele dia.”
Minas Gerais é o terceiro estado com maior oferta de serviços digitais
De acordo com o último Índice de Oferta de Serviços Digitais dos Governos Estaduais e Distritais, realizado em junho de 2022, Minas Gerais ocupa a terceira posição no ranking de oferta de serviços digitais. O estado fica atrás apenas do Rio Grande do Sul, que conquistou o primeiro lugar e de Goiás, o segundo.
Atualmente, 78% das etapas dos serviços públicos do estado podem ser realizadas de forma on-line. De acordo com dados da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), em 2021, o Portal MG registrou 21 milhões de acessos.
O site possui mais de 1.100 serviços cadastrados para a população. Já no MG App, são mais de 70 serviços na versão para o Cidadão e mais de 20 na versão para as empresas. Entre os principais serviços demandados estão o agendamento virtual para emissão de carteira de identidade nas Unidades de Atendimento Integrado (UAI) e doação de sangue na Fundação Hemominas; a consulta à disponibilidade de medicamentos nas farmácias estaduais; os serviços de veículos e condutores, como o CRLV Digital e a solicitação de segunda via de CNH; a emissão de atestados de antecedentes e boletim de ocorrências na Delegacia Virtual.
Por meio da assessoria de comunicação, a Seplag afirmou que à medida que o serviço se torna digital, há um aumento da demanda pelo público, “uma vez que é uma opção mais fácil e mais barata para o cidadão, que não precisa se deslocar até uma unidade de atendimento presencial para realizar o serviço”. O órgão ainda afirmou que o estado de Minas possui um planejamento de digitalização de serviços que envolvem os principais órgãos da administração pública, como a implantação do RG Digital em 2022.
Delegacia Virtual já recebeu 119 mil registros de Juiz de Fora
A Delegacia Virtual é um serviço on-line ofertado pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) aos cidadãos mineiros, com funcionamento 24 horas, sete dias por semana. Através dela é possível emitir antecedentes criminais, taxas de Serviços de Veículo de Habilitação, além de consultar endereços das Delegacias de Polícia Civil.
De acordo com a PCMG, desde sua criação, em 2014, a Delegacia Virtual já recebeu 1,9 milhão de registros. Em Juiz de Fora, foram cerca de 119 mil, o que representa 6% do total de solicitações. As ocorrências mais registradas são de extravio de documentos e objetos pessoais e acidente de trânsito sem vítima.
A solicitação de registro de ocorrência por meio da Delegacia Virtual, possui o mesmo valor jurídico daquela realizada presencialmente em uma delegacia convencional. Por meio da assessoria, a PCMG afirmou que a grande vantagem do registro virtual é a celeridade no atendimento e no recebimento da ocorrência por meio eletrônico, no caso o e-mail. Além da redução de custos com deslocamento, estacionamento e perda do dia de trabalho. “Importante destacar o caráter ambiental pela não impressão da ocorrência e a economicidade para o Estado que pode direcionar o efetivo da PCMG para a investigação criminal, seu principal trabalho.”
TJMG oferece serviço por videoconferência
Até mesmo em órgãos historicamente tradicionais, como o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), a inovação tecnológica tem gerado um feedback positivo. O juiz auxiliar da Presidência do TJMG e responsável pela Diretoria Executiva de Informática do TJMG, Rodrigo Martins Faria, ressalta a criação do Balcão Virtual no último ano, que tem como intuito proporcionar ao cidadão um meio de atendimento mais prático, acessível e ágil.
O Balcão Virtual é uma ferramenta que permite o contato direto, por meio de videoconferência, com o setor de atendimento de cada unidade judiciária do TJMG. Através dele, os advogados, procuradores, partes e cidadãos podem buscar atendimento, sem que seja necessário o deslocamento até as unidades do Tribunal. “Isso é uma forma de aproximar a justiça do cidadão, com mais facilidade e menos burocracia.”
Rodrigo Faria também afirma que o TJMG tem o projeto para digitalizar todos os processos físicos – cíveis e criminais – possíveis de serem virtualizados. “Os ganhos com a digitalização dos processos são inúmeros, dentre eles a celeridade na prestação jurisdicional, a movimentação remota dos processos, a economicidade, a sustentabilidade são exemplos. Temos que olhar para o futuro. A pandemia da Covid-19 acelerou certos processos que há muito estavam estagnados. A partir de agora, temos que investir cada vez mais nas soluções digitais para se adequar ao tempos que vivemos.”