Chegou a hora de Hudson dar um novo passo em sua vida. O juiz-forano, que começou na base do Tupi, passou pelo Tupynambás e chegou a atuar em gigantes do futebol, como Cruzeiro, Fluminense, Santos e São Paulo, se preparou para se tornar empresário. Mesmo com propostas para seguir em campo, o ex-volante preferiu atuar fora das quatro linhas, apesar dos 34 anos. Em entrevista exclusiva à Tribuna, disponível também no YouTube, Hudson contou bastidores da carreira, revelou que pretende investir no futebol de Juiz de Fora e adiantou que, em breve, irá iniciar uma escolinha do PSG na cidade.
Questionado ainda sobre o que entende faltar para que o município tenha uma equipe consolidada em alguma divisão nacional do futebol, Hudson ainda citou entender que a falta de transparência em administrações tem prejudicado o futebol local.
Confira a entrevista completa com Hudson:
Tribuna: Qual é sua relação com o futebol de Juiz de Fora? Tem alguma pessoa, algum momento que você se lembre?
Hudson: Minha relação com o futebol de Juiz de Fora é total. Conheço praticamente todos os principais clubes da cidade. Fiz escolinha no Tupi e tive uma pequena passagem pelo Tupynambás. Joguei futebol de salão no Bom Pastor e no Olympico. Conheço bem o futebol da cidade, os treinadores. Para onde eu vou, eu falo bem daqui. Acho que Juiz de Fora é um centro de talentos. A gente sabe que saem muitos jogadores daqui, não só de futebol, mas atletas de outros esportes. É uma cidade que eu me identifico muito. Na verdade, eu tenho muito orgulho de ser um juiz-forano.
– Qual é aquele momento que te marcou? A primeira coisa que você pensa quando perguntam da sua carreira?
– Com certeza é o título da Copa do Brasil com o Cruzeiro, né (2017). Foi o auge, o ápice. Um título marca muito a passagem do jogador. Por mais que tenha sido apenas um ano no Cruzeiro, foi marcante para mim.
– E sobre seu começo tardio, Hudson? Você estourou mais tarde no São Paulo.
– Eu fiquei em Juiz de Fora até os 15 anos, no Tupi. Depois tive uma oportunidade em Curitiba, de jogar em um clube pequeno da região metropolitana. De lá, eu fui para um outro time e me profissionalizei, fiz meu primeiro contrato profissional. Aí eu fui pro Santos, uma passagem de 2006 a 2010.
– Pegou aquela época de ouro do Santos começando?
– Sim, começando, com o Paulo Henrique (Ganso), o Neymar já estava quase subindo, acho que subiu em 2010. Em 2008 eu cheguei a passar o ano no profissional, fiz seis jogos. Mas bem tímido, era um menino muito jovem, faltava muito amadurecimento pra mim. Dali eu comecei a ser emprestado. Fui para o Ituano, Comercial, Red Bull Brasil, estive no Oeste, fui campeão da Série C. Aí depois, em 2014, disputei um Paulistão pelo Botafogo de Ribeirão Preto. Mas já com 25 anos. Fui muito bem e surgiu a porta do São Paulo.
– Foi o Muricy inclusive que te descobriu lá, né?
– Muricy Ramalho! Eu fui a última contratação da era Juvenal Juvêncio, que marcou época lá.
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– E tem aquele jogador mais ‘resenha’, um que você atuou junto que anima o vestiário?
– Tem dois que marcaram muito. O Reinaldo, no São Paulo, que é muito engraçado, acho que todo mundo deve saber disso. E outro no Flu, o Fred. Me surpreendeu muito positivamente, primeiro porque é uma figura muito importante dentro do Fluminense, um ídolo da torcida, mas como pessoa, ambiente, no dia a dia, é sensacional, sempre falo muito bem dele.
– E sobre o Hernanes, o ‘Profeta’. Aquele vídeo ficou marcado de você entregando a faixa de capitão. Qual sua relação com ele, e o Hernanes é mesmo esse cara fenomenal que falam?
– Demais! O Profeta é inteligentíssimo, não só dentro de campo, mas fora também. Outro dia até tomei um vinho, que ele tem uma vinícola na Itália, trocamos mensagens. Ele é um cara muito entendido do assunto. Hernanes é um espelho. Aquele momento ali foi importante, em 2017 ele volta para o São Paulo, tem um ano incrível, eleito o craque do Campeonato Brasileiro, comanda a campanha do time que brigou para não ser rebaixado. Em 2018 ele sai, 2019 retorna. Eu tenho quase 200 jogos no São Paulo, mas o Hernanes tem uma história maior. E nada mais justo que naquele momento eu ter passado a braçadeira para ele, porque realmente é um ídolo da torcida, um cara que marcou época ali.
– Você tem alguma história engraçada no futebol?
– Tem várias! Uma que eu sempre falo é que eu concentrava com o Pato no São Paulo, e ele nunca levava pasta de dente, desodorante, nada. Acabava que ele sempre usava as minhas coisas. Mas tenho várias. Lembro que quando eu era pequenininho, quando eu saí daqui de Juiz de Fora para ir em Curitiba, a gente sempre passou dificuldade com alimentação, às vezes tínhamos que quebrar cadeiras de madeira para fazer lenha e esquentar comida. Fazíamos o treinamento físico correndo a BR toda lá na região metropolitana de Curitiba. Tem muitas histórias, várias passagens engraçadas. Por exemplo, eu tive um treinador, Luiz Carlos Martins, que a preleção era uma hora e meia, mas uma hora era ele contando piada. O (Fernando) Diniz, antes do jogo, ele gosta que todo mundo faça uma roda, e todos têm que dançar, fazer uma apresentação dançando. Para descontrair, tirar um pouco daquela tensão do jogo.
– Por que você decidiu não aceitar as propostas para seguir carreira?
– Eu comecei a amadurecer a ideia da transição quando veio a pandemia. Trouxe uma nova realidade para todo mundo. Aí comecei a pensar, eu estou com 32 anos (em 2020), preciso começar a pensar na minha transição. O que eu realmente vou fazer, vou me dedicar no pós-carreira. Aí comecei a fazer alguns cursos na CBF, de intermediário, de gestão, análise de desempenho, durante esse período. Em 2021, acabou que eu tive uma lesão, a mais séria da minha carreira, no joelho. Aí eu tive mais tempo de poder estudar, poder ter uma rotina de trazer um conhecimento e me preparar para o pós-carreira. Quando acabou o empréstimo com o Fluminense, e consequentemente, com o São Paulo, eu ainda estava disposto a continuar jogando, mas minha cabeça já estava sabendo que eu já poderia também partir para o outro lado. Comecei a entender o mercado, o que tava chegando de proposta, quais os projetos. Eu sempre fui um cara muito movido à ambição na carreira. Quando eu fui para o Fluminense, o presidente, o diretor e o Odair Hellmann (técnico), me ligaram e falaram que queriam voltar para a Libertadores. O time tinha brigado para não cair em 2019, e agora a gente quer voltar para Libertadores.
– E voltou!
– Aí me contratam, conseguimos fazer uma campanha boa e o Fluminense voltou para a Libertadores. Foram sempre projetos que eu achava que iam acrescentar para a minha carreira, e não apareceram. Nem só pela parte financeira, mas como carreira, profissional mesmo. Apareceram duas situações de Série B, times muito incertos de como que iriam se comportar no campeonato. Aí amadureci a ideia, conversei com o Luciano, que é meu empresário. A gente decidiu abreviar o fim da carreira para começar a viver essa nova fase.
– Você falou que agora que ter mais tempo livre, curtir com a família. O Hudson como pessoa mesmo, o que ele gosta de fazer?
– Eu sou bastante família. Inclusive minha esposa está esperando a minha primeira menina, e eu já tenho dois filhos. A gente está bem feliz, vou ter mais tempo de aproveitar minha família. O futebol me distanciou um pouco em relação aos meus filhos. Por exemplo, adoro jogar tênis. É o esporte, depois do futebol, que eu mais gosto de praticar. Gosto de ler muito, assistir à jogos, de sair para jantar, tomar um bom vinho. São coisas que dão equilíbrio nessa correria que a gente tem no dia a dia. Até para distrair, ficar com a cabeça boa sempre.
– E falando desse seu novo projeto, puxando por esse lado de Juiz de Fora. Tem jogadores aqui que você já está de olho?
– Juiz de Fora é um berço. Eu tenho contato com os treinadores de Tupynambás, Tupi, Uberabinha. Outros contatos de times que estão surgindo na cidade. Vamos fazer um monitoramento grande aqui na região. Procurar abrir a porta para esses meninos. E não só abrir as portas fora, mas trazer possíveis investidores para os times daqui. Sempre acreditei que Juiz de Fora precisa ter um time pelo menos em uma Série B do Campeonato Brasileiro. Pela cidade que tem. Talvez, você profissionalizar um pouco o futebol da cidade, vai trazer resultados melhores. Claro que tem que ter ser bem feito, estudado, trazer pessoas sérias para se juntar com as que aqui estão e sempre se dispuseram a fazer esse trabalho. Há muito a ser explorado no futebol de Juiz de Fora, isso a gente não tem dúvida. Vira e mexe saem jogadores bons daqui. Por que já não fazê-los aqui desde pequeno, para que se tornem profissionais aqui e ajudem os próprios times da cidade? Acho possível, é algo que eu quero explorar. Inclusive, estou trazendo uma escolinha do PSG para Juiz de Fora, no intuito de trazer uma metodologia de treino para ensinar o futebol para os meninos desde os quatro anos. A escolinha traz uma metodologia de treino que se assemelha aos times profissionais. Então, se você consegue levar isso para os meninos bem novinhos, a chance de você criar bons jogadores é muito grande. Enfim, estou com outros projetos, e Juiz de Fora pode e precisa ser mais explorada.
– Como empresário, você prefere assessorar jogadores ou, talvez, é um projeto futuro investir no Tupi, no Tupynambás?
– O ideal para um empresário, apesar de que ele não pode ter direito econômico de nenhum jogador, é que ele tenha sim um time. Como o Eduardo Uran tem o Tombense. Como a gente sabe que outros empresários grandes têm outras equipes. Para que assim ele possa ter mais segurança para trabalhar, desenvolver melhor o trabalho e encaixar os jogadores, deixá-los em atividade sempre. Em Juiz de Fora temos boas equipes que podem fazer esse trabalho em parceria com as administrações.
– Times centenários, de muita torcida.
– Sim, times consolidados. Imagina, a gente consegue fazer algo com essa moda de SAF para algum time desses. Tem um ganho, não só administrativo, mas financeiro e esportivo para os clubes. Mas no primeiro momento, não. Acredito que isso seja uma segunda etapa. Por que pra você iniciar um projeto desse, tem que estar mais estruturado, se dedicar inteiramente para isso. Não pode ter foco em outras coisas, o que nesse momento inicial não consigo fazer.
– Como empresário dos jogadores, o que acha que pode fazer de diferente?
– Há muito a ser feito. A gente sabe que têm bons profissionais no mercado, mas existe um preconceito. Vira e mexe sai uma reportagem de empresário que lesou um clube ou um atleta. Eu, como jogador, tenho certeza que sei o que eu espero de um atleta. Tive um exemplo muito bom na minha carreira, que foi o meu empresário. Quando ele me conheceu, ele me falou: “Hudson, eu não tenho dinheiro pra te dar, você não precisa assinar nada comigo. Mas eu vou dedicar o meu tempo a você. A gente vai se falar todo dia, o que precisar vou estar junto. Se tiver no Ituano, eu vou estar junto. Se tiver no São Paulo, idem. E sempre esteve. O tratamento dele comigo nunca mudou, independente de quanto eu ganhava ou qual clube eu tava. Ele sempre foi a mesma pessoa, e acho que é isso que o jogador necessita. De um empresário, agente, que cuide dele como pessoa. Não só para fazer o contrato, precisa de um cara no dia a dia mesmo. Para assessorar, em como se comportar fora de campo, em como lidar com dinheiro, cuidar da sua família e priorizar a parte atleta. Hoje em dia a gente sabe que não basta ser jogador de futebol mais. Tem que ser um atleta. Se você passar três, quatro horas no clube em um dia é muito pouco. Você tem que ter um complemento depois, se cuidar. Tem que dormir cedo, cuidar do seu corpo. Acho que para um jogador ter sucesso na carreira ele precisa de um agente que cuide desses detalhes que são tão importantes. Tem essa lacuna que pode ser preenchida e eu quero buscar muito. Com transparência, confiança, algo que vou explorar e tenho certeza que posso ter muito sucesso.
– E nesse seu projeto em Juiz de Fora, o que pretende fazer?
– Esse é pra ensinar mesmo os meninos. Trazer algo de novo para a cidade, que eu acredito que não tenha. Uma metodologia, profissionalismo de treino, mesmo com as idades tão pequenas. Algo que eles possam disputar não só campeonatos regionais, mas nacionais, e até internacionais. Você imagina trazer essa experiência para as crianças da cidade. Tem possibilidade de fazer intercâmbios. Eu vou trazer uma ferramenta para Juiz de Fora que eu sei que a cidade tem essa demanda de escolinha, dos pais quererem os filhos em um bom espaço. Vou trazer e abrir um leque de opções para os pais e alunos também se desenvolverem melhor.
– O que mais falta no futebol de Juiz de Fora?
– Acho que falta um pouco de administração. De ser mais transparente. No meu conhecimento, já pegamos bons patrocinadores que entraram nos clubes, mas, infelizmente, por más administrações, esses patrocinadores saíram ou abandonaram o projeto. Acredito que tenha que ser feito algo mais profissional, transparente. Por que no futebol, infelizmente, sem dinheiro você não consegue tocar. É muito gastoso. Se você tiver um projeto que consiga investidores, com confiança, que tenha um retorno financeiro, vejam que o trabalho e o dinheiro está sendo muito bem empregado, automaticamente o resultado esportivo dentro de campo vai ser alto. Eu acredito que os clubes na cidade, Tupi, Tupynambás, os outros, vão decolar.