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Negócios sociais abrem novo nicho de mercado em Juiz de Fora

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Após realização de oficina de pizzaiolo, no Bairro Santos Dumont, uma das moradoras da comunidade se destacou e seu trabalho foi levado para um restaurante da cidade (Foto: Palloma Albuquerque/divulgação)

Um novo nicho de negócios desponta no mercado, mostrando que é possível empreender transformando realidades, trazendo impactos positivos para a sociedade. Não se trata de filantropia, mas de empresas que atuam na resolução de problemas sociais. O lucro pode vir por meio do volume de projetos, da ponte entre as iniciativas pública e privada até o público-alvo ou do aporte de investidores que acreditam neste novo formato de empreendedorismo. O assunto é novo, mas já tem despertado o interesse dos juiz-foranos. Nesta quinta-feira (26), o Sebrae realiza o seminário Negócios de Impacto Social, uma iniciativa que pretende incentivar a inserção de novas pessoas no segmento.

Com cerca de cem inscritos, número que ultrapassou a expectativa inicial de público de até 60 participantes, o evento irá apresentar a dinâmica dos negócios de impacto social, também chamados de “empresas sociais”, “empresas 2.5”, “empresas BOP” (base da pirâmide) ou “negócios inclusivos”. Na programação, estão agendadas palestras com o analista do Sebrae Paulo Veríssimo, entidade que vem trabalhando no estímulo e desenvolvimento de novos modelos de negócio nesta vertente; o economista Daniel Gonzalez, fundador da Hub Social, responsável por capacitar empreendedores que atuam ou pretendem ingressar nesta área; e o economista Beto Secretas, membro do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), que reúne investidores interessados neste setor. Na ocasião, também serão realizados painéis com a arquiteta fundadora da empresa Atos Colaborativos, Ana Paula Luz, e o empreendedor social e fundador do Projeto Vivart, Guilherme Oliveira. Ambos os trabalhos são realizados em Juiz de Fora.

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A Atos Colaborativos foi idealizada em abril do ano passado. “Sou formada há quatro anos e sentia dois incômodos com a minha profissão. O primeiro era a questão da arquitetura ser voltada para a elite, sendo que a maior parte da nossa sociedade integra as classes C, D e E. Também me incomodava o fato de, durante a graduação, o estudante não ter contato com situações reais, a prática no dia a dia das obras. O projeto surgiu com a proposta de suprir essas duas demandas, queremos promover melhorias habitacionais para famílias em vulnerabilidade social e oferecer conhecimento.”

Ana Paula Luz, fundadora da Atos Colaborativos: “Crescer neste tipo de empreendimento significa poder fazer mais pelo nosso público-alvo” (Foto: Teia Bertoletti/divulgação)

Após meses de pesquisa, estudando o público-alvo do negócio, Ana Paula conseguiu colocar a empresa no mercado em setembro do ano passado. Com uma equipe de arquitetos, ela passou a atender famílias que precisavam de reformas e ampliações nos imóveis em que moram. “Nós fazemos uma triagem, analisamos a situação e a necessidade para, então, realizarmos o planejamento e o orçamento da obra.” Feito isto, o projeto entra na segunda fase. “Nós oferecemos oficinas para os estudantes terem a oportunidade de aprenderem na prática como é trabalhar numa obra.” Os cursos são pagos e garantem certificado aos alunos. Cada turma tem entre dez e 12 pessoas. “Também buscamos parcerias com empresas de reforma, materiais de construção e o que for preciso para dar andamento ao trabalho.”

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Acessibilidade
Este ano, a Atos Colaborativos realizou uma parceria com o Instituto Bruno, responsável por prestar assistência às pessoas surdocegas e com múltiplas deficiências devido à paralisia cerebral. “Neste trabalho, o nosso objetivo é atender uma família por mês, para promover acessibilidade aos assistidos pelo instituto. A maior parte das pessoas usa a cadeira de rodas para locomoção, mas ainda não tem a casa adaptada.”

Na avaliação de Ana Paula, a maior vantagem de trabalhar com a empresa social é ter a oportunidade de gerar lucro capaz de potencializar os impactos no futuro. “Crescer neste tipo de empreendimento significa poder fazer mais pelo nosso público-alvo.”

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Sobre os desafios, ela diz que ainda são inúmeros.

“É um negócio novo, então, há muitas dúvidas. Estamos aprendendo a lidar com algumas questões, descobrindo informações e criando uma rede para este setor.”

Ela conta que o trabalho não é apenas uma realização profissional, mas também a concretização de um sonho. “Esta é a minha carreira. Eu me descobri neste projeto, trabalhando para uma classe social que não era atendida pelo mercado, mas tem várias demandas.”

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Negócio atinge mais de 200 famílias em JF

Em 2015, o administrador Guilherme Oliveira, que também tem formação internacional em Liderança Social, idealizou um modelo de negócio para resolver problemas sociais. A ideia era transformar a realidade de comunidades carentes e, também, manter um empreendimento capaz de se autogerir. Assim nasceu o Projeto Vivart que, em pouco tempo de atuação, já impactou a vida de mais de 200 famílias na cidade. A essência do projeto é identificar as demandas do público-alvo e solucioná-las, muitas vezes, fazendo a ponte necessária entre a comunidade e a iniciativa privada. “Os problemas existem, e o nosso sistema socioeconômico não é capaz de resolvê-los sozinho. É preciso uma atuação conjunta, e nós temos feito este trabalho de conexão.”

No primeiro trabalho, realizado no Bairro Santos Dumont, foram feitas várias ações para transformar a realidade de duas famílias. “Decidimos elaborar camisetas que misturassem fotografias e arte. Fizemos 11 estampas, e vendemos mais de 300 unidades em dois meses. Também organizamos oficinas para estimular o empreendedorismo, passeios com as crianças e a oferta de cestas básicas e material escolar”, relembra Guilherme.

Logo neste início, surgiu um caso de sucesso: durante a realização da oficina de pizzaiolo, uma das moradoras da comunidade se destacou. “Vimos um potencial na Joelma que a permitiria seguir nesta área. Fizemos uma parceria com a pizzaria Mr.Tugas, e lá temos o sabor Vivart”, conta. “Fizemos um trabalho de reforma na casa dela, junto com a Atos Colaborativos, o que permitiu que ela também vendesse sob encomenda.” Ele relata que, após esta experiência, percebeu que poderia tornar as soluções mais escaláveis a partir da parceria com empresas. “Passamos a disponibilizar as camisetas no site da Chico Rei, criamos um menu vegano que é vendido pelo Aloha e começamos a buscar novas parcerias.” Hoje, o Projeto Vivart também cria pacotes de soluções sociais para empresas interessadas neste setor.

Guilherme Oliveira, administrador do Vivart: “Os problemas existem, e o nosso sistema socioeconômico não é capaz de resolvê-los sozinho. É preciso uma atuação conjunta, e nós temos feito este trabalho de conexão” (Foto: Lucas Assis/divulgação)

No ano passado, o projeto trabalhou com 200 famílias assistidas pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). “Fizemos um desfile social com as camisetas na Privilège, e arrecadamos cerca de R$ 8 mil. Também organizamos oficinas para trabalhar autoestima e estimular dons artísticos.” A equipe do Vivart conta com profissionais de administração, fotografia, produção, design, psicólogo, arquiteto, além de muitos voluntários. “O nosso próximo projeto será realizado no Bairro Dom Bosco. A princípio, iremos mapear o que é necessário para aquela comunidade.” Para ele, “o empreendedorismo social é uma oportunidade de negócio que veio acelerar a conscientização das pessoas”.

Mercado está aberto à novas ideias

A definição ao pé da letra do que são negócios sociais diz que se tratam de “empreendimentos que intencionalmente almejam objetivos sociais específicos juntamente com um retorno financeiro e que medem a realização de ambos. São empresas que buscam resolver problemáticas da sociedade, configurando-se como soluções de mercado escaláveis para questões sociais e ambientais”, conforme cartilha do Sebrae. “É um segmento novo, mas com um mercado em ascensão. As demandas existem, são inúmeras e relativas a diferentes setores como saúde, educação, habitação, dentre outros. Cabe ao empreendedor ter uma boa ideia que possa solucionar uma destas lacunas. O lucro é importante, pois é isto que diferencia o negócio de impacto social de outros projetos sociais”, enfatiza a analista do Sebrae em Juiz de Fora, Camila Villela.

O Sebrae lista setores prioritários no mercado para o desenvolvimento deste modelo de negócio. Na área de água e saneamento básico, por exemplo, a instituição cita a necessidade de criação de uma tecnologia inovadora que permita o reaproveitamento da água para uso doméstico em locais afetados pela estiagem. Outra possibilidade apontada, na área da educação, é a criação de uma plataforma on-line para ensino gratuito. Já na área da saúde, a oferta de consultas e exames a preços mais baixos para quem não tem plano de saúde é um problema a ser solucionado. “A proposta do Sebrae é divulgar o que são os negócios de impacto social e recrutar empreendedores que queiram atuar nesta área. Para isso, apresentamos o que é, por onde começar, os públicos e as demandas existentes”, afirma Camila.

“Bom, bonito e do bem”
Pelo Brasil, algumas iniciativas estão se tornando bastante conhecidas. O projeto Terra Nova, nascido em Curitiba, promove acordos para solucionar conflitos entre proprietários de terrenos e famílias assentadas. A empresa já regularizou a situação de mais de 22 mil pessoas que pagaram pelas propriedades e passaram a ter um endereço. A Rede Asta, com sede no Rio de Janeiro, é a primeira do país que vende produtos originários de comunidades de baixa renda. O slogan “Bom, Bonito e do Bem” deixa claro a proposta da empresa, responsável por profissionalizar artesãos e transformar resíduos em produtos. O Banco Pérola, em Sorocaba (SP), fornece microfinanciamentos para jovens empreendedores da classe C, D e E.

Em 2011 passou a apoiar 130 negócios, com uma taxa de inadimplência de apenas 2% e tornou-se correspondente de microcrédito da Caixa Econômica Federal.

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