A quantidade de processos represados, na fila para concessão de benefícios relacionados ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), já chega a aproximadamente 1,8 milhão em todo Brasil, conforme dados divulgados pelo próprio órgão. O atraso se arrasta desde antes da pandemia – e foi agravado por ela – fazendo com que a média de espera para a análise dos requerimentos fique em torno de seis a oito meses, segundo estimativa da Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (Fenasps). Em Juiz de Fora, a situação não é diferente. De acordo com a Associação dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da cidade, há processos que estão parados há quase dois anos e não receberam sequer o despacho por parte do INSS.
O tempo na fila extrapola, em muito, o prazo limite estabelecido para que o órgão conceda ou negue os pedidos. A espera máxima pode variar dependendo do benefício, sendo mínima de 30 dias e máxima de 90, conforme a Lei dos Processos Administrativos (Lei 9.784/1999). Após esse período, caso o INSS não atenda a demanda, o contribuinte tem o direito de recorrer na Justiça. De acordo com a advogada especialista em Direito Previdenciário Paula Assumpção, a situação começou a piorar em 2019 com a reforma da previdência. Na ocasião, muitos contribuintes, com medo de não conseguirem se aposentar, abriram processos na Previdência. “Pela enxurrada de demanda em razão da reforma, bem como a complexidade das análises, a fila do INSS já vem tomando proporções gigantescas desde lá”, afirma.
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Oito mil processos represados
Na época, a Fenasps estimava cerca de oito mil processos represados na Gerência-Executiva do órgão, que abrange, além de Juiz de Fora, os municípios de Além Paraíba, Carangola, Cataguases, Espera feliz, Leopoldina, Muriaé, Palma e São João Nepomuceno. Com o início da pandemia e o fim dos atendimentos presenciais, as demandas antigas se somaram aos novos pedidos e a retenção só piorou. “Com o afrouxamento das normas sanitárias, o atendimento presencial sem agendamento voltou em março deste ano. Foi nesse período que, principalmente o público idoso, que possuía dificuldades com o atendimento on-line, foi até as agências para o atendimento espontâneo. Mas cerca de três semanas depois, os servidores do INSS entraram em greve nacional”, explica a advogada.
No dia 23 de março deste ano, os servidores aderiram à greve nacional. A principal reivindicação da categoria é reajuste salarial de 19,99% assim como a realização de concurso público para contratação de mais funcionários. A diretora da Federação e do Sindicato dos Trabalhadores em Seguridade Social, Saúde, Previdência, Trabalho e Assistência Social em Minas Gerais (Sindsprev) na cidade, Cleuza Maria Faustino, afirma que a paralisação não é responsável por aumentar a demanda represada, visto que esta é uma realidade observada muito antes do movimento paredista.
“A greve não prejudica aquilo que já estava com problemas. Desde 2015, o INSS perdeu mais de 50% da força de trabalho, grande parte aposentou e não houve reposição. Não tem como a gente colocar essa demanda reprimida em dia se o Governo não fizer, urgentemente, um concurso público.” No início de maio, os servidores intensificaram a greve como forma de pressionar o Poder Público e, de acordo com Cleuza, ainda não é possível fazer uma previsão de quando os serviços serão normalizados.
Mudança na perícia prevê maior celeridade nos processos
Com o objetivo de agilizar a concessão de benefícios, como pensões, aposentadorias e Benefício de Prestação Continuada (BPC), o Governo federal publicou, no dia 27 de abril, uma Medida Provisória com ações para reduzir as filas de análise de benefícios e das perícias médicas. De acordo com o INSS, existem hoje cerca de 762 mil pessoas aguardando perícia médica. Conforme o Governo federal, a fila aumentou muito em função das restrições impostas pela Covid-19, quando as agências da Previdência Social ficaram fechadas por cerca de seis meses. Além disso, a redução no número de peritos médicos atuando presencialmente até meados de 2021 também contribuiu para piorar o cenário.
Com as mudanças previstas pela nova regra, benefícios como o auxílio-doença, chamado agora de benefício por incapacidade temporária, não precisará mais da avaliação da perícia médica do INSS para ser concedido. O segurado poderá conseguir o auxílio por avaliação documental que comprove a enfermidade, sendo atestada por laudos ou atestados.
Paula Assumpção afirma que a perícia médica é um dos gargalos no INSS, e a medida provisória resgata uma prática adotada durante o período mais agressivo da pandemia. “Nós sabemos que essas perícias documentais vão apresentar outras dificuldades, como o fato de a pessoa não ser periciada por um médico. Nas perícias remotas, um servidor, que não necessariamente vai ter formação na área da saúde, vai analisar a documentação e decidir se concede ou não o benefício.”
A advogada explica que a principal dificuldade é o segurado não ser ouvido, exigindo que os laudos apresentados sejam muito bem detalhados. “É complicado, porque às vezes o que atrapalha a pessoa a trabalhar não é nem a doença, mas o efeito colateral que um remédio que ela toma dá. Então há casos muito particulares que, algumas vezes, vão precisar sim ser analisados por um médico especializado.”
Meu INSS: dificuldades com a plataforma on-line
Para requerer o auxílio-doença e outros benefícios, o caminho mais indicado é o portal on-line Meu INSS. No entanto, além de instabilidades na plataforma serem motivo de reclamação por parte dos usuários, a Associação dos Aposentados, Pensionistas e Idosos de Juiz de Fora afirma que o site não é acessível para os mais idosos.
O coordenador jurídico da associação, Rafael Cunha Silvério, afirma que a grande maioria das reclamações que recebe são de usuários que não conseguem acessar a plataforma. “Mesmo que as pessoas tenham a opção de resolver algumas demandas mais simples pelo aplicativo, elas recorrem ao atendimento espontâneo porque não têm familiaridade com o aplicativo. Com isso, podemos dizer que, ao longo dos últimos dois anos, período no qual esse atendimento presencial estava suspenso, nós tivemos um represamento grande dessas demandas aqui em Juiz de Fora, em parte por conta do sistema on-line não estar contribuindo para a celeridade desses atendimentos.”
Rafael comenta que a associação acompanha casos em que o pedido por benefício chega a ficar na fila por quase dois anos sem ter um despacho do INSS. “Geralmente, são pessoas em um perfil de hipervulnerabilidade, que, segundo o Estatuto do Idoso, deveriam ter um atendimento diferenciado. Estamos em um momento em que era preciso desafogar essa demanda, que a gente precisava que essa plataforma funcionasse e ela não funciona, está piorando. É um problema que não é novo, mas que agora, com essa demanda reprimida, está pior ainda.”