O Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) instaurou investigação preliminar para apurar casos de aumento elevado nas contas de água em Juiz de Fora, após a troca de hidrômetros pela Cesama. Por meio de sua assessoria, o órgão afirmou que venceu, nesta sexta-feira (15), o prazo para a Cesama entregar uma explicação técnica sobre a situação. A partir daí, o promotor de Defesa do Consumidor, Oscar Santos de Abreu, responsável pelo caso, avaliará como proceder. A Cesama informa que enviou a documentação solicitada na quinta-feira, um dia antes do prazo previsto.
A Tribuna vem expondo a situação desde março, quando começaram a surgir inúmeras reclamações de consumidores que viram a conta “explodir” após a substituição do equipamento. Em um dos casos relatados, a fatura de uma moradora do Bairro Ipiranga aumentou 880%. No período de janeiro a agosto, 33.927 hidrômetros foram trocados na cidade. O número é 21 vezes maior do que o verificado no mesmo período do ano anterior, quando as trocas somaram 1.592. Até o final do ano, a meta é realizar quatro mil substituições por mês, o que totalizaria quase 50 mil hidrômetros no ano, o equivalente a 34,5% dos aparelhos em uso na cidade: 144.420.
A comerciária Adelaine Aparecida Alves Fonseca, do Bairro Teixeiras, viu o valor médio da conta subir de R$ 70 para R$ 330 após a substituição do equipamento. “Um verdadeiro absurdo. Estou indignada.” Segundo ela, não há alteração no consumo, nem existência de vazamentos que justifiquem a alta de 370%. Muito pelo contrário. Adelaine afirma que substituiu as torneiras, para evitar pequenas vazões, e criou um sistema de reutilização de água da máquina de lavar para racionalizar o uso do recurso. Depois de procurar a companhia e solicitar a aferição do equipamento, segundo ela, o hidrômetro foi substituído, resultando na queda do valor para R$ 140. Desde então, diz, tem acompanhado de perto a leitura do equipamento. “A cada três dias, anoto a numeração para ver se está batendo. Estou de olho.”
Adelaine faz parte dos 1.454 consumidores que procuraram a companhia para solicitar a aferição do equipamento, realizada por uma banca regulamentada pelo Inmetro. O número, que considera o acumulado do ano até agosto, representa 4,2% do universo de hidrômetros trocados e uma alta de 53,6% ante igual período de 2016 (946). Conforme a Cesama, 96% dos casos indicaram perfeito funcionamento. Já o número de reclamações formalizadas nos órgãos de defesa do consumidor (Procon e Sedecon), de janeiro a agosto, chegou a 134, o equivalente a 0,39% das trocas realizadas no mesmo período.
Arsae defende vida útil de cinco anos para equipamento
Em posicionamentos reiterados, a companhia afirma que a substituição rotineira é motivada pelo fato de o desgaste do equipamento promover leitura a menor, reduzir a oferta de água e promover inconsistência na elaboração da política tarifária. Com o novo equipamento, diz a Cesama, seria possível mensurar o consumo de forma mais precisa, além de assegurar maior sensibilidade na identificação de “vazamentos invisíveis” e “vazões mínimas”, o que impactaria o custo final. A medida é considerada necessária para reduzir o percentual de 23% dos equipamentos que têm mais de cinco anos de uso na cidade.
A intensificação da troca de hidrômetros é um desdobramento da revisão tarifária autorizada em 2016 pela Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário de Minas Gerais (Arsae-MG). No plano de investimentos para o quadriênio 2016-2019, foram incluídos cerca de R$ 7,68 milhões para financiar o programa de substituição dos medidores, com o objetivo de garantir que a vida útil do parque de hidrômetros de Juiz de Fora não supere os cinco anos. Para a Arsae, a manutenção da idade média do equipamento na casa dos cinco anos é uma medida preventiva para assegurar medições de consumo mais fidedignas, que ajudarão na redução de perdas e “a gestão do prestador de abastecimento de água”.
Este ano, a agência reguladora recebeu dois questionamentos relacionados à fatura, em que os usuários reclamavam de aumento após a troca do hidrômetro, um em março e outro em maio. O posicionamento é que “os usuários não forneceram os protocolos de atendimento junto ao prestador e, como o questionamento de fatura é um serviço que deve realizado na agência de atendimento, as demandas foram encerradas com a orientação de como realizar o questionamento diretamente na Cesama”. Conforme a Arsae, a aquisição, aferição e distribuição dos hidrômetros são de responsabilidade do prestador de serviços.
Para a Arsae-MG, algumas situações devem ser verificadas buscando comprovar a exatidão da leitura realizada, como possíveis falhas nos equipamentos, ocorrência de vazamentos nas ligações internas dos usuários e paralisações prolongadas no abastecimento de água. A Resolução 040/2013 estabelece, em seu artigo 36, os critérios para verificação dos instrumentos de medição, devendo ser, sem ônus para o usuário, uma verificação a cada três anos ou quando o resultado constatar erro nos instrumentos de medição. Em relação às paralisações prolongadas no abastecimento de água, principalmente nos casos da aplicação de medidas de racionamento de água (rodízio), a Arsae, por meio de sua assessoria, constata que podem prejudicar a medição pelo hidrômetro caso a rede de distribuição se esvazie por completo.
Audiência pública debate assunto
No final de junho, para tratar do assunto, foi realizada audiência pública na Câmara Municipal em que dezenas de consumidores revezaram-se no plenário para denunciar os aumentos excessivos nas contas. Nesta semana, o vereador Luiz Otávio Fernandes Coelho (Pardal, PTC), que requereu a audiência, disse que, em julho, ele, Vagner de Oliveira (PSC) e Charlles Evangelista (PP) foram à sede da companhia, atendendo convite do diretor-presidente da Cesama, André Borges, para acompanhar a aferição dos medidores.
“No nosso entendimento, o encontro foi satisfatório”, disse, destacando a responsabilidade e a competência da companhia. Pardal ponderou, porém, que os parlamentares não têm condições de avaliar tecnicamente a situação. “Não temos capacidade, nem competência para isso, somos leigos no assunto.” Reconhecendo a importância de contar com a ajuda de um órgão especializado, o vereador comentou que esse pode ser objeto de encaminhamento. Segundo Pardal, vários consumidores continuam se queixando dos aumentos elevados após as substituições.
Procurado, o Inmetro, por meio de sua assessoria, afirmou que esta seria uma questão a ser tratada pelo Instituto de Metrologia e Qualidade do Estado de Minas Gerais (Ipem-MG). Já o Ipem, por meio de sua assessoria, afirmou que vai se posicionar, na próxima semana, sobre o assunto.
Cesama apresenta explicações ao Ministério Público
Sobre a investigação preliminar, o diretor de Desenvolvimento e Expansão da Cesama, Marcelo Mello do Amaral, afirma que representantes da empresa compareceram, em agosto, ao Ministério Público, onde foram apresentadas as explicações solicitadas pelo órgão. “Foram explicações semelhantes àquelas apresentadas na audiência pública. A princípio, foram esclarecidas todas as dúvidas”, disse. Segundo o diretor, os hidrômetros são adquiridos via procedimento licitatório, com especificação técnica que garante a qualidade do equipamento, que, inclusive, deve atender à certificação do Inmetro. “Os lotes de equipamentos são aferidos de acordo com a norma, no ato de entrega na Cesama”
Conforme a companhia, as trocas obedecem ao cronograma em função da idade do hidrômetro. “Se este equipamento está por atingir cinco anos, ele entra na lista de troca. Para cada ano, existe uma quantidade diferente de equipamentos a serem trocados em função da sua idade. Neste ano, houve ainda o incentivo, via tarifa, da nossa agência reguladora (Arsae-MG) para redução da idade mínima dos hidrômetros, visando a eficiência na medição e a redução de perdas.”
Questionado se a Cesama considera a possibilidade de falha em algum lote de equipamentos – ou outro motivo de natureza técnica relacionado aos equipamentos – que justifique altas tão elevadas em alguns dos casos reclamados na própria companhia e nos órgãos de defesa do consumidor, o diretor afirma que a estatística de avaliações realizadas no período demonstra que mais de 88% dos casos de reclamação foram devidos a vazamentos internos ou alterações detectadas de consumo por parte do consumidor. Nos outros 12% não foram identificadas as causas, “porém, a aferição dos hidrômetros indicou perfeito funcionamento”, assegura.