O Aeroporto Francisco Álvares de Assis, o Serrinha, pretende voltar a receber voos comerciais em Juiz de Fora nos próximos anos. Sob gestão da Infraero, uma das metas da administração, além da operação técnica do terminal, é a realização de uma série de estudos com o objetivo de avaliar a viabilidade técnica, a capacidade de o terminal voltar a receber voos comerciais, suspensos desde abril de 2014.
Em entrevista à Tribuna, o gerente da Infraero no Serrinha, Gustavo Schild, elencou alguns pontos que precisam ser avaliados para que o aeroporto se enquadre às normas técnicas previstas pela Agência Nacional de Aviação (Anac). De acordo com ele, o aeródromo se encontra na categoria 3C, que permite a oferta de voos em aeronaves de porte médio, com capacidade para cerca de 60 passageiros. Apesar de estar homologado em uma classificação que garante a oferta de voos comerciais, no momento, o aeroporto não estaria apto a recebê-los.
“O Serrinha tem essa categoria, mas necessita de estudos que permitam a viabilidade técnica para que esses voos aconteçam. Temos algumas coisas a cumprir referente a obstáculos, situação de demanda de voos, condições da parte técnica de radiofrequência e navegação aérea, para viabilizar um voo comercial.” Os estudos devem ficar prontos no final deste ano e, em 2023, serão definidos orçamentos e possíveis obras que serão feitas.
Depois que todas as intervenções necessárias forem feitas, Schild afirma que o Serrinha voltará a ofertar a possibilidade de voos comerciais em seu terminal. “Nem a Infraero e nem a Prefeitura (PJF) têm autoridade para decidir se vão ter voos comerciais aqui. Quem decide isso são as empresas aéreas que precisam ter confiança para operar no Serrinha. O mercado é delas. Nosso objetivo é colocar o aeroporto em condições para que elas façam essa avaliação. Vamos deixar tudo pronto para que o Serrinha volte a ser um polo atrativo a essa atividade.”
Riscos de operação
A última empresa aérea que atuou com voos comerciais no Serrinha foi a Azul. Ela deixou de ofertar seus serviços em 2014 e, desde então, nenhuma outra empresa ofereceu esse tipo de operação. Em janeiro de 2015, em audiência com representantes da empresa, da Prefeitura e do Procon, o gerente da Azul à época, comandante Rufino Ferreira, afirmou que cancelou as atividades no Serrinha prioritariamente por questões de segurança. No entendimento da companhia, fatores, como tráfego aéreo, obstáculos e meteorologia inviabilizariam, do ponto de vista técnico, as atividades com o equipamento ATR72-600 usado no aeroporto.
Ele ainda citou um evento, considerado o mais grave, em que um comandante precisou arremeter duas vezes, antes de conseguir pousar, por conta da turbulência na aproximação das cabeceiras. O entendimento foi que poderia haver um incidente ou acidente. “Este tipo de aeronave e as características do Serrinha nos colocam em um risco de operação que não é aceitável,” disse à época.
Questionado, Gustavo Schild afirmou que tais condições são de conhecimento da Infraero e estão sendo avaliadas nos estudos técnicos realizados pela empresa.
Obstáculos
Uma dessas condições adversas é o adensamento populacional que se formou no entorno do aeroporto. Inaugurado em 1958, o número de construções ao redor do local cresceu exponencialmente nos últimos anos. Mas, para Schild, essa situação não representa, necessariamente, um risco, contanto que exista a devida demarcação. “Precisamos evidenciar onde estão esses obstáculos, ver se eles causam algum problema e se dá para a aeronave fazer um desvio.
Eu sempre cito o exemplo do Aeroporto de Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Lá o avião decola em direção ao Pão de Açúcar, mas tem um espaço pré-determinado em que faz um desvio à esquerda. Na aviação, com tudo demarcado, pré-estabelecido na carta, com devidas notificações feitas ao aeronavegante, não tem problema.”
Relevo e clima
Instalado no Bairro Aeroporto, o Serrinha está em uma das áreas mais altas da cidade, em meio a uma região montanhosa. Schild afirma que o relevo e o clima são um dos principais problemas do aeródromo. “O relevo tem essa tendência de acumular nuvens. Há dias que a camada de neblina é tão baixa que você não enxerga um palmo à sua frente, fica tudo branco.” Ele explica que essa condição limita empresas aéreas que precisam cumprir horários estabelecidos, o que pode ser um ponto fraco para o Serrinha em termos de competitividade no mercado.
Comunicação via rádio
Atualmente não existe controle do espaço aéreo no Serrinha, algo imprescindível caso o terminal volte a receber voos comerciais. A comunicação que existe é apenas entre a aeronave e o solo. “Caso a aviação comercial decida, no futuro, voltar para cá, logicamente vamos ter que reativar a estação de rádio para o tráfego aéreo no aeroporto”, explica o gerente. Para que isso seja possível, ele afirma que será preciso realizar a compra de equipamentos e capacitar novos trabalhadores.
Obras no aeroporto
Questionado se o aeroporto precisará de obras para receber os voos comerciais, Gustavo Schild disse que é provável que sim, mas ainda é cedo para falar quais serão. “Tudo vai depender do resultado dos estudos. Precisamos primeiro planejar, para depois executar alguma possível obra.” Ele ainda afirma que será necessário adquirir novos equipamentos de navegação, realizar modificação no pátio e outras intervenções necessárias para adequar o terminal à legislação.
Papel social
Schild ressalta que o Aeroporto da Serrinha possui um papel social em Juiz de Fora. “Muitos dos voos que o terminal recebe são aeromédicos, de transferência de pacientes para outras cidades ou transplante de órgãos. Além disso, grandes empresários estão aqui e usam o meio para fazer negócio com outros estados e países. Ter um aeroporto em boas condições em uma cidade com cerca de 600 mil habitantes pode sim ser um instrumento de desenvolvimento.”
Para ele, a PJF firmou contrato com a Infraero justamente para proporcionar esse serviço à população. “A empresa possui uma base técnica muito boa em estudos, e tem sido chamada em diversas regiões do país para transformar aeroportos de pequeno e médio porte em terminais mais bem estruturados.”
Categoria do Serrinha pode comportar aviões tipo Airbus e Boeing
O professor associado do Curso de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Manuel Rendón explica que a categoria na qual o Serrinha está homologado permite, inclusive, a atuação de aeronaves maiores. “Entre 2011 e 2014, o Aeroporto da Serrinha trabalhou com a linha aérea Trip, que utilizava as aeronaves bimotor ATR 42 e ATR 72 de fabricação francesa. Mas outras aeronaves maiores, como o Airbus 318 e a Boeing 737-700, também fazem parte da categoria C.”
Rendón afirma que a categoria da Anac possui dois elementos. O primeiro é um código numérico relacionado com o comprimento da pista, e o segundo é um código de letras, baseado, dentre outras características, nas dimensões da aeronave. O Aeroporto da Serrinha está na categoria 3, definida para aeródromos com pistas entre 1.200m e 1.800m. A letra C comporta aeronaves com comprimento de asas de até 36m.
‘Aeronaves críticas’
Em nota, a Anac afirmou que a operação de aeronaves maiores demanda um Certificado Operacional de Aeroporto, ou um processo específico de gerenciamento de risco e garantia de segurança operacional. Tais aparelhos, que comportam mais passageiros, são consideradas aeronaves críticas, pois demandam mais requisitos para operar. A Anac afirmou que a aeronave crítica do aeródromo de Juiz de Fora é de código 3C, que contempla, por exemplo, o Embraer E195, o Boeing 737-800 e o Airbus A320neo, com limite de 29 frequências semanais.
A agência reguladora ainda ressaltou que a operação de voos regulares no Serrinha depende da capacidade operacional do aeroporto. Nesse aspecto, a classificação é determinada pelo Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) 153, Classe I, tipo A, e nº 107, Classe AP-0. Isso significa que os aeródromos tipo A processam menos de 200 mil passageiros por ano, sem voos regulares. Já os da Classe AP-0, são aqueles com operação exclusiva de aviação geral, serviço de táxi aéreo e/ou de aviação comercial na modalidade de operação de fretamento.
“Para receber novamente voos regulares é necessário que o operador do aeródromo se adeque aos regulamentos citados, como, por exemplo a validação de um Programa de Segurança Aeroportuária (PSA) junto à agência, caso pretenda atender voo de aeronave com capacidade superior a 60 assentos”, informou a nota.