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Comércio e serviços de JF se preparam para nova realidade de consumo

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Empresários estão ansiosos pela reabertura das lojas, sabendo que são recomendadas medidas de segurança para clientes e funcionários, como uso de máscaras e higienização das mãos com álcool em gel (Foto: Fernando Priamo)

As mudanças no programa Minas Consciente, anunciadas pelo Governo de Minas Gerais na última quarta-feira (29), sinalizam que Juiz de Fora e outros municípios mineiros devem avançar no processo de reabertura das atividades econômicas. Enquanto aguardam a autorização para voltarem à ativa, os setores se planejam para enfrentar uma nova realidade, pois sabem que uma coisa é certa: nada será como antes da pandemia da Covid-19.

A expectativa é que Juiz de Fora avance para a onda amarela a partir de quinta-feira (6). Nesta fase estarão liberadas atividades diversas, como lojas de vestuário e departamento, livrarias, salões de beleza e consumo interno em bares e restaurantes.

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Com as alterações no Minas Consciente, houve a redução e a reconfiguração das fases de reabertura das atividades, fazendo analogia às cores do semáforo. As cidades que estiverem na onda vermelha terão maior restrição, sendo permitido apenas o funcionamento de serviços essenciais, e aquelas classificadas na onda verde poderão retornar com atividades consideradas de maior risco, como academias de ginástica, teatros, cinemas e clubes.

Apesar da possibilidade de avanço na reabertura, ainda não há controle da doença. Na verdade, sem a testagem em massa não é possível traçar o panorama real do comportamento da Covid-19. Por isso, serão necessárias adaptações, adoção de medidas de segurança e mudanças culturais por parte dos estabelecimentos e da população.

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O cenário econômico também não é mais o mesmo. Muitas empresas não sobreviveram à crise provocada pela pandemia, e o desemprego aumentou. Entre janeiro e junho, Juiz de Fora perdeu 6.369 empregos formais, conforme dados do Ministério da Economia. Neste contexto, emergem novas formas de trabalho e relações de consumo, que alinham o distanciamento físico, o uso da tecnologia e a redução dos custos.

A partir deste domingo (2), a Tribuna inicia uma série jornalística que irá mostrar o que podemos esperar dessa nova realidade e apresentar as mudanças planejadas por diferentes segmentos. Serão reportagens publicadas sempre aos domingos.

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Sem testagem, população deve mudar hábitos

Os registros da Covid-19 em Juiz de Fora mostram avanço dos números de casos e óbitos. Até sexta-feira (31), a cidade teve 114 vidas perdidas para a doença. Os diagnósticos positivos somam 3.460, conforme dados divulgados pela Prefeitura. No entanto, os registros não detectam a real evolução da contaminação, uma vez que não há testagem em massa.

Diante da dificuldade de traçar o panorama com exatidão, ainda não é possível afirmar como será o comportamento da doença nos próximos dias. “A informação que temos e o acesso ao número de casos são limitados, já que só são testados pacientes graves. Temos apenas projeções sobre os casos assintomáticos e leves que não tiverem acesso ao exame. Estimar a realidade é difícil”, afirma o médico infectologista e chefe do Setor de Vigilância e Saúde do Hospital Universitário de Juiz de Fora (HU/UFJF), Rodrigo Daniel de Souza.

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O especialista diz que há algumas semanas houve o aumento substancial de casos da Covid-19 no município, mas isto não é suficiente para afirmar que atravessamos o pico da doença. “Só vamos saber depois. O que vemos é que a ampliação de leitos permitiu acomodar a demanda da doença sem pressão e, por isso, não tivemos colapso do sistema de saúde.”

Sem contenção da doença, cabe à população mudar velhos hábitos. “A cidade parou as atividades antes da hora, o que sacrificou muito o comércio e fez com que as pessoas não aguentassem mais o isolamento social, justamente, no momento em que mais precisamos”, analisa Rodrigo. “É tudo muito novo, estamos aprendendo com erros, acertos e experiências de outros locais. A população atribui ao gestor público a fiscalização, mas cabe a nós fazermos a nossa parte. Há costumes que precisam mudar, como as filas dos bancos e os grupos para compras nos supermercados. As confraternizações também precisam ser adiadas.”

Com a possibilidade de retomada de várias atividades, o especialista alerta para a adoção das medidas de segurança. “É preciso usar a máscara corretamente, tampando o nariz e a boca, manter o distanciamento e verificar se os estabelecimentos disponibilizam álcool em gel, controlam a entrada de pessoas e têm funcionários com máscaras”, orienta. “É importante lembrar que podemos tocar as superfícies, mas não podemos levar as mãos aos olhos, boca e nariz sem termos feito a assepsia correta.”

Ele também destaca a possibilidade de reestruturação dos ambientes. “Os estabelecimentos devem se planejar, pois mudanças estruturais podem ser necessárias. Locais sem ventilação e que usam ar-condicionado precisarão ser adaptados, fazendo uma substituição por sistemas de exaustão, por exemplo.”

O especialista afirma que a conscientização é essencial. “É preciso que todos sigam as regras. Apenas abrir o comércio não gera aglomeração, mas é fundamental a mudança no comportamento. Se mais pessoas tivessem feito o isolamento, mais atividades já teriam sido retomadas.”

Vestuário e calçados planejam retorno

As lojas de vestuário e calçados correspondem a 60% do setor comercial da cidade, conforme o Sindicato do Comércio de Juiz de Fora (Sindicomércio-JF). De portas fechadas há quase cinco meses, as empresas que sobreviveram à crise anseiam pelo retorno das atividades, embora a projeção seja de uma retomada lenta das vendas.

Na expectativa pela reabertura, os preparativos já começaram com a aquisição de equipamentos de proteção para os funcionários, totens de álcool em gel e tapetes sanitizantes. Alguns estabelecimentos também planejam o revezamento da equipe para evitar aglomeração.

Mesmo com a reabertura das lojas físicas, o uso da tecnologia irá permanecer. As redes sociais e os aplicativos foram grandes responsáveis pela continuidade de muitos negócios e se tornaram realidade para empresas e consumidores.

Sobrevivência
A empresária Silvana Souza atua há 28 anos no comércio, onde começou como funcionária. Hoje ela é proprietária de quatro lojas de roupas: Drop’s, Outlet Dps, Drop’s Spazio e Moda Express. “Minha vida é no comércio. Já vivenciei várias crises, mas nada parecido com o que acontece agora.”

Segundo ela, as redes sociais foram fundamentais para que as lojas sobrevivessem e os 18 empregos fossem mantidos. “Nós já realizávamos um trabalho de divulgação na internet, mas, com a pandemia, estes canais tornaram-se o nosso maior investimento, o que tem salvado as empresas. Não estamos vendendo como antes, mas conseguindo sobreviver sem endividar e sem demitir.”

As vendas pela internet dão fôlego, mas correspondem a 40% do faturamento antes da interrupção das atividades. Silvana acredita que, mesmo com a reabertura das lojas físicas, os resultados serão demorados. “A volta será um baque grande, por conta da perda de muitas lojas e a redução dos consumidores, mas precisamos trabalhar com otimismo. O ano de 2020 não será para o comércio ganhar dinheiro, mas para sobreviver ao mercado e, para isso, são necessárias adaptações. Queremos muito reabrir com segurança.”

‘Não somos vilões’

Há 50 anos no comércio, Eduardo Delmonte concorda que nunca viu uma crise parecida como a decorrente da Covid-19. Proprietário das lojas de calçado Arpel e da loja de móveis Jade, ele se viu obrigado a desfazer de um dos estabelecimentos. “Precisei fechar a Arpel Confort.” Apesar da decisão, os 45 postos de trabalho foram mantidos com a realocação dos funcionários. Parte das vendas foi mantida pelas redes sociais e WhatsApp.

Eduardo afirma que pretende reabrir as três lojas. “Seguiremos todos os protocolos necessários, mas sabemos que a pandemia vai nos deixar sequelas econômicas muito severas”, analisa. “Tenho medo que o comércio de Juiz de Fora se enfraqueça ao ponto de deixar de ser referência para a região, pois os moradores das cidades vizinhas já criaram outras rotinas de consumo.”

Para ele, a demora de o Poder Público autorizar a reabertura tem sido frustrante. “Estamos aborrecidos por sermos encarados como os vilões da pandemia. Não é o comércio que leva a doença, mas o comportamento da população. O comércio vai se lembrar para sempre desse momento muito trágico na sua história.”

Fiscalização
Para o presidente do Sindicomércio-JF, Emerson Beloti, o comércio pode auxiliar na fiscalização das medidas de segurança. “Precisamos muito que os consumidores também sigam as regras, e o setor pode atuar como um agente de informação e orientação. Há empresários que já adotaram a medida de comprar máscaras a mais para evitar que consumidores entrem na loja sem proteção.”

Redes comerciais e serviços personalizados são tendências

A partir das mudanças nas relações sociais e de consumo, uma nova realidade vai sendo delineada para os próximos meses. Na avaliação do professor de Economia da UFJF, Fernando Perobelli, o novo cenário irá favorecer a criação de redes de pequenas empresas, a personalização de parte dos serviços e mudanças significativas no mercado trabalho.

Para o especialista, a retomada econômica ainda está longe de acontecer. “Ainda não temos vacina e estamos entendendo que o distanciamento social é a melhor maneira de evitar a doença, isso impacta o comportamento do consumidor. Além disso, com a redução da renda, o consumo precaucionista irá continuar.”

Uma das alternativas para minimizar os impactos da crise será garantir o investimento nas relações virtuais. “A fidelização do cliente irá além do atendimento seguro nas lojas físicas, irá perpassar pelo acompanhamento on-line da experiência de compra desse consumidor. Nos últimos meses, quem não era adepto de compras pela internet passou a fazê-lo.”

Para ele, esta nova realidade irá desafiar a sobrevivência dos pequenos negócios, que passarão a concorrer com gigantes do mercado. “Este cenário favorece a criação de redes e associações para a redução de custos nas compras e oferta de preços competitivos.”

Com relação aos serviços, Perobelli afirma que, devido ao caráter heterogêneo do setor, os impactos serão diversificados. “Uma das tendências será a busca por serviços personalizados.” Ele exemplifica que, com a restrição do número de pessoas em um mesmo ambiente, parte do público pode optar por estúdios em vez de frequentar academias de ginástica. “A personalização é mais fácil de acontecer, mas tem restrição de renda.”

Mercado de trabalho
Com relação ao mercado de trabalho, a expectativa é que ocorra uma forte recessão na oferta de empregos. “O cenário macroeconômico não é positivo, e as perspectivas são de PIB zero ou negativo. A atuação difusa do Governo não transmite credibilidade, o que reduz os investimentos e a contratação de mão de obra.”

Outra mudança significativa será o fortalecimento do teletrabalho. “Empregadores contraíram dívidas para continuar os negócios e terão que reduzir custos. O home office permite esta redução com gastos de serviços terceirizados, como vigilância, limpeza e seguro, além de água e energia. É uma realidade que tende a ficar.”

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