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Tom King, o homem que matou o mordomo Alfred

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Tom King teve passagens premiadas por títulos como “Batman” e “Visão”, e agora trabalha em uma minissérie de Rorschach (Foto: Reprodução)

A trajetória de Tom King nos quadrinhos é, no mínimo, peculiar. Durante a década de 1990, ele trabalhou com cinema e depois foi estagiar na DC Comics e Marvel, onde foi assistente de Chris Claremont nos X-Men. Porém, após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, ele foi trabalhar no departamento de operações de contraterrorismo da CIA, a agência central de inteligência norte-americana. Ele só retornou aos quadrinhos em 2012, após o nascimento do primeiro filho, e desde então foi responsável por algumas das melhores séries da década, principalmente pelo seu longevo trabalho com o Batman e também as séries em 12 edições do Visão e Senhor Milagre.

O roteirista foi um dos convidados da edição 2020 do CCXP Worlds, no início de dezembro, quando falou um pouco dessa trajetória entre a fantasia da nona arte e a dura realidade do combate ao terrorismo pelo mundo. “Naquela época, no final dos anos 90 e começo dos anos 2000, o Chris (Claremont) era o diretor criativo da Marvel, e como estagiário foi a melhor forma de aprender a contar histórias. Se você entregar um roteiro para ele ou o Kevin Smith, eles sempre vão falar ‘isso aqui está errado, isso pode melhorar’. Foi uma sorte muito grande”, relembra.

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Minissérie do Visão rendeu ao artista o Prêmio Eisner de melhor escritor (Foto: Reprodução)

Agente da CIA e a volta aos quadrinhos

Logo depois, entretanto, Tom King deixou seu sonho de trabalhar com os quadrinhos para se tornar um agente da CIA. Ele conta que a mãe era uma executiva de um dos estúdios de cinema de Hollywood e queria que ele tivesse uma profissão como médico ou advogado, e por conta disso trocou os quadrinhos pelo contraterrorismo após o 11 de setembro. “Na época que o meu filho nasceu, 11 anos atrás, decidi mudar, porque não queria perder a infância dele. Eu ficava muito tempo fora, fui para zonas de guerra e tudo mais. Passei metade dos primeiros quatro anos de casado longe de casa. E decidi fazer aquilo que era minha paixão de criança.”

Em 2012, King publicou seu primeiro quadrinho autoral, “A once crowded Sky”, pela Touchstone, e pouco depois foi contratado pela DC Comics. Em 2016, ele foi o escolhido para comandar a revista do Batman após a longa passagem de Scott Snyder, e escreveu nada menos que 85 edições para o título principal e mais alguns especiais, tendo sido marcado por arcos polêmicos como “Eu sou suicida” e a morte do mordomo Alfred pelas mãos do vilão Bane. De acordo com ele, a ideia era não ser uma morte “definitiva”, porém…

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“A DC Comics pediu para matar o Alfred. Originalmente, era para ser uma farsa, uma propaganda falsa para conseguirem informações. Então a direção da DC Comics me ligou e falou ‘não queremos que seja fácil, queremos que o Alfred seja morto de verdade’. Tentamos encontrar uma forma de como isso poderia funcionar. Aí eu vi os desenhos, e eles sempre me fazem chorar, pensava ‘cara, a gente matou o Alfred’, e ele é o coração do Batman”, diz. “O Batman tem tanta dor, e a gente vê o quanto a família é importante. Quer dizer, Alfred cuidou dele depois que os pais morreram, o Alfred sem dúvida era a salvação do Batman.”

Ao mesmo tempo em que trabalhava com o Cavaleiro das Trevas, Tom King escreveu duas séries de 12 capítulos para o Senhor Milagre e Visão, que junto ao Batman renderam um total de dois prêmios Eisner: um de melhor escritor em minissérie (“Visão”) e outro em história (“Batman”).

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‘WandaVision’

O trabalho com Visão foi sugestão de Tom King à Marvel, quando foi convidado a trabalhar com a editora. “Pensei na época: ‘vou fazer alguma coisa completamente diferente, o melhor que posso’, e quando sugeri o Visão eles gostaram demais, falaram ‘vamos com tudo’. Originalmente a minha proposta estava meio estranha, porque Visão tinha ‘criado’ uma família, eles acharam que fosse aquela coisa meio bobinha, aí eu disse que o Visão deixaria e esposa louca, ela se torna uma pessoa muito má, e gostaram. ‘Vamos fazer isso então'”.

Sobre “WandaVision”, série do Disney+ que estreia em 15 de janeiro e usa alguns dos elementos da minissérie, Tom King mostrou-se bastante animado. “É muito bom ver a sua criação representada na tela, foi uma experiência bem legal.” Atualmente, além de edições especiais do Batman, Tom King se meteu no vespeiro que é mexer no universo de “Watchmen”. Ele é o roteirista da minissérie do polêmico Rorschach, que terá 12 edições, desenhos do espanhol Jorge Fornés e começou a ser publicada em outubro pelo selo Black Label da DC Comics.

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Um dos projetos atuais de Tom King é a minissérie com Rorschach, um dos protagonistas de “Watchmen” (Foto: Reproduão)

Desviando da sombra de Alan Moore

Trabalhar com o personagem apresenta dois desafios: o primeiro, lidar com uma figura que teve seu papel em “Watchmen” reavaliada nos últimos anos, ainda mais com sua associação à extrema-direita, como visto na minissérie produzida pela HBO; e, claro, a comparação com o trabalho de Alan Moore, o criador desse universo. “Amo o trabalho do Alan Moore, acho que ninguém fez quadrinhos de super-heróis melhor do que ele. Quando sugeriram (a minissérie) para mim – e na época eu já sabia que ‘Watchmen’ estava indo para a televisão -, pensei no quanto já era comparado com ele e não queria que isso acontecesse de novo”, conta. “Então quis fazer alguma coisa diferente, porque se você trabalha com personagem dele é como se você ficasse na sombra do cara.”

“Quando assisti à minissérie, vi que era possível fazer um ótimo trabalho sem ser um remake, era uma nova linguagem para contar coisas do mundo real”, prossegue. “Vi que poderíamos fazer algo que não fosse apenas uma cópia. Não sei se todo mundo sabe, mas Rorschach é uma paródia e uma homenagem, ao mesmo tempo, do Questão e do Pacificador, que era muito conservador. O Alan Moore criou esse personagem que está nesse universo tão caótico e que acaba sendo uma âncora moral. Primeiro você acha que é o protagonista, mas depois de um tempo você percebe que esse cara é de direita, e percebemos que um cara do bem pode fazer o mal, e o cara do mal pode fazer o bem.”

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