Em sua primeira edição em Juiz de Fora, em 2002, a Campanha de Popularização do Teatro e da Dança trazia na bagagem 27 anos da experiência de Belo Horizonte, o que permitiu a exibição de 18 espetáculos – 12 adultos, cinco infantis e um de dança -, em quatro espaços diferentes (Centro Cultural Bernardo Mascarenhas, Forum da Cultura, Pró-Música e Sesc), com ingressos a R$ 4 (adulto) e R$ 3 (criança). Passados 15 anos, em sua 16ª edição, a Campanha dobrou o preço, cobrando entre R$ 8 e R$ 12.
Dobrou também o número de locais: Teatro Solar, CEU da Zona Norte, Diversão & Arte, Casa de Cultura da UFJF, Teatro Clara Nunes – Sesc, Sociedade Filarmônica, OAndarDeBaixo e Fábrica dos Sonhos. Aumentou em quase 40% o número de espetáculos, passando a 25, sendo seis infantis e o restante adulto. Perdeu, no entanto, o que sempre serviu de nome e meta: a popularidade. E a crescente perda de público nos últimos anos justifica a parada. Anunciado na tarde desta quinta (28), o adiamento da 17ª edição do projeto aponta problemas relativos ao modelo adotado desde sua implementação na cidade e, também, a urgência de reflexão não só do evento mas de toda a classe.
“Foi uma decisão tomada ao longo deste ano. Desde a avaliação da Campanha de 2017 colocamos todas as questões e agendamos um seminário, em setembro, com a Sinparc, a Funalfa, produtores e artistas da cidade. Queremos propor algo novo para a Campanha do ano que vem. Adiamos esse anúncio o quanto pudemos porque existia a possibilidade de o Teatro Paschoal Carlos Magno ser inaugurado, o Pró-Música voltar a funcionar, e isso acabaria injetando fôlego. Como nada aconteceu, esse tornou-se um momento para repensarmos o evento de 15 anos”, observa Cristiano Rodrigues, presidente da Associação dos Produtores de Artes Cênicas de Juiz de Fora (Apac-JF), entidade criada justamente para organizar e promover o projeto na cidade, com apoio do Sindicato dos Produtores de Artes Cênicas de Minas Gerais (Sinparc).
De acordo com Cristiano, a falta de espaços (já que o Centro Cultural Bernardo Mascarenhas e o Centro Cultural Pró-Música permanecem sem uso, o primeiro por indicação do Corpo de Bombeiros e o segundo por reformas) contribuiu bastante para o adiamento. “Existem espaços alternativos, mas eles não são suficientes para atender a demanda de um evento como a Campanha.” Acrescido a esse quadro, o desgaste do próprio evento – “Algumas produções ainda tinham público cativo, lotavam teatro, mas isso tem mudado nos últimos anos”, diz Cristiano -, a associação aposta na realização em junho. “É sempre um risco interromper, mas entre fazer a Campanha como foi esse ano – cujos resultados não atenderam as expectativas nem dos produtores, nem do público – e deixar passar, optamos pela segunda opção.”
‘O teatro não cresceu’
Envolvido com a Campanha desde a primeira edição, quando apresentou “Mineiros on the beach”, o ator, diretor e dramaturgo Gueminho Bernardes, ex-presidente da Apac, concorda com a necessidade de mudança do formato do evento, mas aponta conflitos mais complexos e profundos. “Os motivos internos são que o teatro não cresceu e não amadureceu na cidade, não conseguiu se fortalecer. Então, não se renovou e esgotou a expectativa do público. Isso tem uma responsabilidade dos grupos e também da Funalfa, que nunca assumiu a Campanha como uma ação importante”, critica, apontando o sucesso do projeto na capital, onde já reuniu mais de 300 mil espectadores em edições passadas.
“Em função dessa importância que ela já teve é que decidimos refletir sobre o que fazer para que não ficasse mais desgastada”, comenta Cristiano Fernandes, lamentando o cenário de desarticulação da classe e em seus espaços. “Juiz de Fora tem uma infraestrutura de teatro muito precária, porque a maioria das casas não apresenta equipamentos de som e luz, encarecendo muito as produções”, acrescenta o presidente da Apac, garantindo ter uma verba, ainda que “tímida”, para realizar a Campanha no meio do ano.
Para o superintendente da Funalfa Rômulo Veiga, a nova proposta de data, prejudicada sobremaneira em 2018 com a proximidade do carnaval, pode injetar fôlego novo no evento. “Um dos objetivos da campanha é a formação de público, e com o evento em janeiro a adesão da população é menor, por ser época de férias. Durante o período letivo é mais fácil estimular as escolas a levarem turmas, por exemplo”, defende, destacando a relevância da reorganização, descentralização (incluindo praças de bairros como palcos) e renovação das peças.
Em 2017, justamente no primeiro ano em que o Teatro de Quintal (TQ) não participou, Gueminho Bernardes com seus solos chegou a ter prejuízo na Campanha. Fato inédito na carreira do artista que ostentou, por anos, as maiores plateias do evento. Por isso, Gueminho defende uma reflexão mais perene. “Minha proposta no seminário foi não fazer e só voltar quando for corrigido o que está errado. A mesma coisa sentimos com o carnaval, porque mudou a data mas o erro continuou sendo cometido”, exemplifica, para logo ampliar a lente: “Hoje vemos uma sucessão de fracassos, e nada indica que haverá melhora.”