Música latino-americana, eletrônica underground, groove e black. Neste domingo (28), a ação musical é na rua, permeada por interferências sonoras de três projetos independentes com DJs que se dedicam integralmente à pesquisa musical. “Sair do club e vir para a rua é uma válvula de escape”, ressalta o DJ Kureb, criador da Súbita, que ocupa espaços públicos há seis meses na cidade.
Dessa vez, Kureb convidou a Aldeia Groove e a BANG! para esse encontro de resistência. Das 14h às 20h, no calçadão da Rua Mister Moore, vai rodar uma timeline musical que vai desde 1950, com pesquisas de música de época do Gramboy, até os discos que chegaram essa semana para Kureb, instantâneo ao que está acontecendo na música agora.
A discotecagem é 100% vinil, e as músicas que compõem a narrativa de cada set não estão todas na internet, muito menos nas plataformas de música streaming. É preciso andar, visitar espaços, ouvir os discos e criar uma rede de troca de informação. “A descoberta acontece garimpando e pesquisando, indo a sebos, lojas de disco, viajando. Existe uma rede de contatos de amigos que também trabalham na mesma linha. Às vezes, algum parceiro de fora descobre um som, e dali eu já fico atento, e isso é reverso, eu descubro e compartilho”, conta Gramboy, que começou em 2014 com a BANG!. Já Kureb ressalta a importância de compreender e dividir a música eletrônica entre a underground e a mainstream, “as pessoas têm uma visão sobre música eletrônica extremamente superficial, música eletrônica de verdade é underground, não é apenas o produto que chega às boates”.
A rua é um campo aberto de possibilidades e experimentações, se Kureb normalmente toca apenas 10% do que pesquisa, talvez na Súbita consiga injetar uns sons estranhos a mais. Engraçado que, ao final da entrevista, uma senhora de uma loja de roupas – dessas com banquinha no meio da rua – chamou o Kureb e perguntou quanto cobrava para tocar e animar uma festa, ao que ele respondeu: “não me chama não, eu só toco música doida”. Kureb está em constante expansão do que pode ser encontrado na música eletrônica, e, a cada nova pesquisa, vai construindo uma nova linguagem para seu próximo set.
Gramboy está interessado na evolução da música negra pop desde a década de 1950, primeiras versões ou versões inusitadas. Apesar de trazer um pouco do rap, que dá uma revisitada em sons anteriores, seu foco de estudo é a música negra, as influências dela e suas reverberações nas décadas de 1960 e 1970. Embora uma onda de bossa nova e bossa jazz lhe interesse, seus sets são basicamente groove e black music, que vai selecionando e abordando na hora, seguindo o enredo da festa.
Música como protagonista
A Súbita será um cruzamento sonoro, visita de amigos que querem trocar ideia sobre música, além do encontro ao acaso com quem estiver cruzando a cidade e se deparar com aquela ocupação. “Sempre tiveram festas alternativas em Juiz de Fora, mas as casas ficaram tão hostis, que a gente teve que vir para a rua”, reclama Kureb. Gramboy fala sobre a falta de reconhecimento do trabalho como DJ, que desencadeia uma baixa valorização das casas. Além disso, a ideia é que a música não seja apenas ambiente, mas sim protagonista, que proponha uma audição e uma discussão sobre pesquisa musical. O projeto foi aceito pelo Corredor Cultural e, dessa forma, tem ainda mais caráter democrático. Por ser em plena rua do centro, perde o estigma de “cool” e alternativo que alguns espaços fechados impõem, e abrange um público sem rótulos.
Cada um consome o que levar, compra onde quiser e, se preferir, não gasta com nada. Não tem ingresso e nem venda de bebidas, apenas uma banquinha da Papelote Press com distribuição de zines gratuitos e venda de camisetas da festa BANG!, para quem quiser apoiar. Gramboy tomou frente em 2009 do projeto “RITMO.ARTE.MANIFESTO!” gerando um intercâmbio com a vinda de nomes de referência que pesquisam música independente no país. Depois esteve envolvido com a “Burnside skate sounds”, que teve sua última edição em 2013, levando os discos para a rua e servindo de trilha para os filmes de skate. Já em 2014 surgiu a “BANG!, realizada por Gramboy e Donald, inicialmente, na Praça São Mateus. Além disso, também colabora com a organização da festa “Da ponte pra cá”, na pista de skate do Bairro Vitorino Braga, todas têm caráter “marginal” de rua. “Há 17 anos, estou na rua todos os dias andando de skate, vivendo o Centro, o urbano de todas as formas, e a festa é a celebração maior. A extensão disso tudo é celebrar com música e assim reunir todas as nossas ações.”
Kureb criou em 2004 a “Noize”, que acontecia em um casarão onde hoje é o posto policial da Praça da Estação. O projeto durou nove anos e rolou som de muitos DJs de música eletrônica desse circuito underground. Súbita nasceu em 2016 e é filha da Noize. Foi quando Kureb decidiu criar um espaço para ele, espaço sem paredes, invadir a rua com seu trabalho, se envolvendo com outras pessoas que buscam essa cultura. “Se for para ganhar R$ 400 em uma casa ou gastar R$ 200 e fazer na rua, eu prefiro fazer na rua, eu não estou nessa por conta de grana, estou nessa por causa de música”.
Playlist Set Gramboy: clipe e ouça as mixtapes
Playlist Set Kureb (clique nas tracks para ouvir):