Os problemas para a realização de eventos no carnaval de Juiz de Fora rendem assunto para conversa na Redação, discussão em mesa de bar, comentário no ponto de ônibus. Pode render até samba. E rende também debate, como o que aconteceu na manhã desta terça-feira (26) na rádio CBN Juiz de Fora. O superintendente da Funalfa, Zezinho Mancini, o empresário Zé Kodak, da Banda Daki, e o presidente da Aesbloc (Associação das Entidades Carnavalescas de Blocos de Juiz de Fora), Basileu Tavares, discutiram por cerca de uma hora as recentes dificuldades enfrentadas pela administração municipal para a realização de eventos – tais como os desfiles de escolas de samba e blocos, que recebiam verba da Prefeitura. No final do ano passado, a PJF anunciou que não haveria repasse financeiro para a folia de 2019, apenas se responsabilizando pela ordenação pública. Também foram discutidas questões pontuais como horários para encerramento dos blocos. E ainda houve reclamação de falta de diálogo e o desejo de maior participação nas decisões referentes ao carnaval por farte dos foliões.
Primeiro a falar, Zezinho Mancini lembrou que esteve em Belo Horizonte para entender o que fez a capital mineira ter em poucos anos o maior carnaval do Estado. “Na ocasião foi explicado a melhor forma de lidar com o patrocinador, quais são os interessados, pois quando o evento se torna muito grande é difícil o poder público manter sozinho”, conta. “O hábito do patrocínio é algo que estamos lutando para ter, procuramos as cervejarias por entender que teriam o retorno imediato com a venda do produto, e também a fidelização do produto. Marcamos com algumas cervejarias da cidade, apresentamos o projeto para o carnaval, e em algum ponto foi visto que o custo seria muito alto, mas que poderíamos voltar a conversar a respeito. Depois conversamos com alguns blocos e ficamos sabendo que algumas cervejarias fizeram acordos com alguns deles. Vimos que alguns passos foram dados.”
O superintendente da Funalfa lembrou ainda que, em paralelo, chegou a haver conversas com duas cervejarias nacionais em setembro, e que uma delas se interessou por tomar conta de todo o carnaval, porém o tempo era pouco para se resolver as questões pertinentes. “Assim que acabar o carnaval, vamos pensar em 2020, com patrocínio particular. Mas temos órgãos públicos em todos os eventos, o que também representa investimento do poder público”, afirma, referindo-se a demandas como limpeza dos locais, disponibilização de banheiros químicos, fechamento de rua, desvio do trânsito e controle dos horários dos eventos.
Quanto ao exemplo de Belo Horizonte, o superintendente da Funalfa disse que “é assustador querer comparar Belo Horizonte com Juiz de Fora, o dinheiro que rola por lá é muito maior, são R$ 13 milhões só para o carnaval. A gente tem hoje, diante da crise financeira, R$ 7 milhões para ações de cultura para o ano inteiro, não só para o carnaval, como o programa Gente em Primeiro Lugar, CCBM, Teatro Municipal Paschoal Carlos Magno, Museu Ferroviário, manutenção da Praça CEU. A coisa não é tão simples.” Para ele, é importante colocar esses números para comparar as duas realidades.
Reclamando de tudo e todos
Conhecido como o “general” da Banda Daki, o empresário Zé Kodak afirmou que “muita coisa precisa ser melhorada, muita coisa está errada”. Ele protestou quanto ao fato de Zezinho Mancini dizer que há R$ 7 milhões para a cultura, e nada ter ido para o carnaval. “Tivemos zero de verba. Tivemos um superintendente que não gosta de carnaval de rua”, acusa, colocando de maneira simplória a forma com que acredita ser possível organizar a festa. “Conseguir verbas é simples, ligamos para as empresas e conseguimos verbas pela banda. Um órgão público ligando, pedindo, vai conseguir; falta, às vezes, a iniciativa, o interesse, não pode deixar todos os encargos para nós. Você luta, levanta o dinheiro, faz a verba”, diz Zé Kodak. Depois do debate, Zezinho Mancini declarou para a Tribuna que a Funalfa repassou R$ 80 mil e R$ 70 mil para a Banda Daki realizar seus desfiles em 2017 e 2018, respectivamente.
Zé Kodak voltou a lamentar as dificuldades enfrentadas nos últimos anos para realizar o carnaval: “Tivemos vários problemas, conseguimos patrocínio de Belo Horizonte só porque era a Banda Daki. Tenho certeza que a Funalfa vai formar a comissão de carnaval do jeito deles. Vai ter uma reunião para organizar a comissão do carnaval do ano que vem, e ninguém do carnaval foi convidado”. Basileu Tavares, da Aesbloc, acrescentou que a Associação teve um pedido (negado) para integrar a Comissão de Carnaval. Zezinho Mancini concorda com a possibilidade de haver na comissão representantes dos blocos e diz que “precisamos conversar, e a intenção é chegar lá”.
Horário da folia
A questão dos horários também foi motivo de reclamação por parte do “general” da Banda Daki. De acordo com ele, houve um pedido por parte dos blocos para que pudessem encerrar as atividades até as 21h30, ao invés das 21h, porém não foram atendidos. “O horário de silencio é às dez, por que tem que parar às nove? A própria Polícia Militar aceitava, mas a Comissão do Carnaval não aceitou.”
Basileu Tavares também reclamou do horário de término da folia, dando como exemplo o dia em que houver dois blocos, que ficariam assim prejudicados pelo pouco tempo para desfilar. “Não tem como terminar às nove, então fomos pedir para prorrogar. Daqui a pouco o carnaval vai ser das seis às sete”, protestou, afirmando ainda que “quem está fazendo o carnaval de rua é a Aesbloc. Quando foi avisado que a Funalfa não teria dinheiro, mudamos toda nossa organização. Temos que sentar à mesa e conversar sobre 2020”.
Zé Kodak voltou a atacar a Funalfa. “Não pode uma festa como a de sexta-feira (22) na Câmara Municipal passar 15 minutos do horário, e chegar um diretor com a polícia mandando parar.” Zezinho Mancini rebateu: “No ano passado o ex-superintendente da Funalfa quase recebeu voz de prisão porque tentava negociar uma prorrogação, mas o representante da PM disse que tinha que respeitar o prazo. Podemos melhorar em tudo, queremos sempre melhorar, conversar mais.”
“O superintendente tinha que ter uma verba só para a Banda Daki, que é tombada. A Banda tem 48 anos; em 43 anos, só eu paguei por ela”, continuou Zé Kodak.
Diálogo possível
Depois do debate na CBN Juiz de Fora, a Tribuna conversou com Zezinho Mancini e Basileu Tavares. “Tudo o que queremos é que, se não tiver dinheiro, o poder público nos ajude a procurar quem pode nos dar apoio. Queremos que o carnaval cresça, e para isso precisamos conversar, ter certeza com antecipação de que vai haver recursos, não pode avisar em cima de hora. Não queremos briga, e sim ajudar”, destacou Basileu.
Zezinho Mancini disse que foram realizadas reuniões no último trimestre de 2018 não apenas com a Banda Daki, mas também com as escolas de samba, entre outros protagonistas do carnaval, para que procurassem soluções. “Tivemos uma primeira reunião com a Banda Daki ainda em outubro para saber de suas demandas e explicar que o orçamento deste ano do município repete o de 2018, incluindo a Funalfa. É um total de R$ 7 milhões, dos quais apenas R$ 1 milhão ‘sobra’ para eventos. Se repetíssemos o ano passado, quase metade desse valor (R$ 460 mil) iria apenas para o carnaval, e é preciso democratizar os recursos”, argumenta, lembrando que em 2017, quando foi realizado pela última vez o desfile das escolas de samba, esse valor chegou a R$ 1,7 milhão.
Zezinho Mancini deu mais um exemplo sobre a questão do diálogo do poder público não apenas com blocos e escolas de samba, mas também com a população. Ele cita como exemplo o Bloco Arteria, que aconteceu no último dia 17. Após posicionamento contrário dos moradores da realização do evento na praça do bairro, foi feita uma nova reunião em que se chegou a um acordo para minimizar os transtornos e o baile ser realizado de forma tranquila. Quanto à possibilidade de outros blocos desfilarem na Av. Getúlio Vargas além do Parangolé Valvulado, ele disse que o assunto foi tema de discussão na Comissão de Carnaval. “Alguns blocos que passam pelo Calçadão da Rua Halfeld estão crescendo muito, e pensamos em mudá-los para a Getúlio. Como estava em cima da hora, é uma possibilidade que estudamos para 2020.”
Ainda de acordo com o superintendente da Funalfa, houve o entendimento de que a Prefeitura trabalharia na estrutura do carnaval, fornecendo, por exemplo, os banheiros químicos. “Apesar das dificuldades, o número de blocos diminuiu pouco. Em 2018 foram 60, e este ano estavam programados 50. No futuro, quando a situação econômica estiver melhor, teremos uma base para um carnaval melhor”, acredita.