Dentre as fases iniciais da preparação de um espetáculo teatral, a leitura do texto com os integrantes da peça pode ajudar com que atrizes e atores comecem a criar o entrosamento que será fundamental para o momento em que a memória precisa assumir de vez o lugar do papel. Mas e se essa etapa se tornar não apenas uma parte, mas essencialmente o produto final? Pois esta é a proposta dos atores Paulo André, Alexandre Hugo, Marcelo Castro e Vinicius Souza, de Belo Horizonte, que apresentam pela primeira vez em Juiz de Fora, no Espaço OAndarDeBaixo, a peça Três Tigres Tristes. As apresentações acontecem sábado (24), às 20h, e domingo (25), às 19h, dentro do Festival Teatro em Movimento, que está em sua 17ª edição. Além da peça, Marcelo Castro realiza uma oficina no mesmo local também no sábado e domingo.
A apresentação em Juiz de Fora é a primeira do espetáculo fora de Belo Horizonte, onde estreou oficialmente em junho. A leitura, porém, de “Três tigres tristes” acontece desde 2014, quando Vinicius Souza apresentou o texto no projeto Janela de Dramaturgia, criado por ele há mais de sete anos para promover a leitura de textos inéditos de dramaturgos da capital mineira. “Desde 2014 começamos a ler, mudamos um ator ou outro, e aí neste ano começamos de fato a fazer temporadas regulares após um grande volume de ensaios até chegarmos nesse elenco e entender a coisa de uma forma mais dramática”, conta Marcelo Castro, acrescentando que a leitura do texto, mesmo após tantos ensaios, se tornou uma proposta da encenação, que adotou uma estrutura de teatro-leitura-performance.
“O fato de a leitura ser parte da linguagem do trabalho potencializa uma série de jogos. Ela, na verdade, dificulta para o ator, depois de tanto tempo você fica preso à exatidão das palavras, e isso exacerba o jogo teatral. O fato de estar preso ao texto, ao mesmo tempo que busca a liberdade do jogo, é a provocação do Vinicius: até que ponto é possível a leitura se dar o tempo todo? É difícil continuar lendo quando a interpretação, a dramaticidade vão aumentando. O espetáculo é performático nesse sentido, pois a plateia esta dentro desse jogo de leitura e não-leitura.”
Ali, na mesa
A proposta fica evidente desde o início, quando o aviso é dado logo na primeira frase: “Esta peça é a leitura de uma peça”. Sentados ao redor de uma mesa, três amigos discutem – na ausência do quarto amigo – como será o bar que pretendem montar, a solução que encontraram para enfrentar a crise. “O problema é que fica praticamente impossível montar um bar porque eles mesmos colocam uma série de dificuldades, pois cada um tem sonhos diferentes. Sem contar que eles vão ‘bebendo’ o dinheiro que tinham para montar o negócio”, adianta Marcelo.
Entremeada pelas rubricas (indicações cênicas dentro de um texto teatral), a história vai aos poucos mostrando os conflitos entre eles a respeito do amor, da arte e do trabalho. O próprio uso da rubrica serve para alterar o rumo da narrativa, revelando um final não esperado a princípio. Durante esse crescimento das tensões, os atores aos poucos vão se soltando, trocando de lugares, se movimentando pelo cenário minimalista, num processo imersivo que arrasta o público junto – que ri ou acompanha os tensos silêncios dependendo do momento.
Unidos pela primeira vez
Outro desafio para o elenco é o fato de ser a primeira vez que trabalham juntos, mesmo conhecendo os trabalhos alheios por viverem na mesma cidade. Os quatro são de gerações e experiências teatrais diferentes: Paulo André integra o Grupo Galpão; Marcelo Castro é ex-integrante do Grupo Espanca!; Vinícius Souza, além de idealizador da Janela de Dramaturgia, assinou diversos espetáculos em Belo Horizonte; e Alexandre Hugo é fundador da Cia. 15 de Teatro e passou pelo Teatro da Vertigem (SP).
“É muito legal trabalhar com pessoas diferentes, é preciso encontrar novos jeitos de fazer, torna-se muito rico”, diz o ator. “Ao mesmo tempo dá um frescor para o trabalho, pois como os personagens têm um embate (em cena), torna-se um embate real para os atores. Apesar de trabalharmos e ensaiarmos juntos, somos muito diferentes.”
Oficina
Além de integrar o elenco de “Três tigres tristes”, Marcelo Castro ministra no sábado (24), às 13h, e domingo (25), às 10h, a oficina Viewpoints, técnica de improvisação com origem na dança criada pela coreógrafa Mary Overlie e desenvolvida por Anne Bogart com a SITI Company, de Nova York, e que o ator estudou quando esteve com a companhia americana em 2010. “É uma técnica de improvisação e criação conjunta que passo por meio da oficina desde 2011. Potencializa o trabalho de um grupo sem que alguém precise dirigir, uma ferramenta de criação coletiva bem intuitiva que se aproxima muito da dança e de uma ideia de composição no teatro”, explica.
TRÊS TIGRES TRISTES
Sábado (24), às 20h, e domingo (25), às 19h, no Espaço OAndarDeBaixo (Rua Floriano Peixoto 37 – Centro)