Escorre o tempo e permanece a coerência da banda Skank. Distintas, “Algo parecido” e “Beijo na Guanabara” preservam a identidade do grupo formado em 1991. Únicas inéditas na discografia dos mineiros, as músicas integram o álbum duplo “Os três primeiros”, com registro ao vivo da releitura dos três primeiros álbuns da banda: “Skank”, de 1992, “Calango”, de 1994 e “O samba poconé”, de 1996. Enquanto “Algo parecido” é uma balada romântica, de letra poética e estética alinhada ao pop britânico, com forte influência do Clube da Esquina, “Beijo na Guanabara” retoma as raízes do grupo, apostando no suingue do reggae e na leveza de refrões como “Palavras seriam somente palavras de amor/ no corpo descansa a verdade e a dor/ de te amar”. Se não na sonoridade, o Skank conserva seu DNA nas temáticas. E o novo disco confirma a coerência ao reunir canções como “Jackie Tequila”, “Tanto” e “Te ver”.
Resgatando o passado e atentos ao presente, Haroldo Ferretti (bateria), Lelo Zaneti (baixista), Samuel Rosa (vocal, violão e guitarra) e Henrique Portugal (teclado) sobem a Serra de Ibitipoca nesta sexta, 19, às 20h, para show no Alpha Ville Chalés, dentro da programação do Ibitipoca Music Festival, que também leva à serra, no sábado, 20, o rock do Biquini Cavadão. No repertório, estarão as canções do disco gravado no Circo Voador, em 2017, incluindo “Algo parecido”, uma das músicas mais tocadas nas rádios brasileiras. “Independente”, o primeiro álbum, do início dos anos 1990, é marcado pela crítica social e pela escolha do reggae como estilo. O segundo, “Calango”, ganha doses de um pop que ecoa ainda mais forte no terceiro disco, “O samba poconé”, que traz entre suas faixas “Uma partida de futebol” e “Garota nacional”. O Skank não saía das paradas nos 1990. E por isso a escolha de “Saideira” para a trilha da novela global das 19h “Verão 90”.
Representantes da música mineira contemporânea, os belo-horizontinos (Lelo é o único que nasceu em outra cidade mineira, São Domingos da Prata) do Skank souberam se reinventar ao longo da carreira. Autores de diferentes sucessos, adentraram a memória afetiva de inúmeros brasileiros. Prova disso é o sucesso da turnê revival. E de todos os outros shows nos quais o músicos, hoje na casa dos 50 anos, revisaram a carreira, como o do Rock in Rio de 2017. Para o crítico musical Mauro Ferreira, os álbuns “Maquinarama”, de 2000, e “Cosmotron”, de 2003, são obras-primas. “O que a gente sempre buscou foi fazer música interessante para quem gosta do nosso trabalho”, comenta o tecladista Henrique Portugal, em entrevista por e-mail à Tribuna. “A identidade é consequência disso. É uma busca que nunca acaba.”
Tribuna – Quando revisa a trajetória do Skank, o que fica de mais forte?
Henrique Portugal – Revisar uma carreira talvez seja parecido com vasculhar uma antiga caixa de fotografias e se deliciar com alguns fatos de que você não se lembrava mais. Descobri como o tempo nos leva a pensar de forma diferente sobre certos assuntos… Descobri que já fizemos músicas de diferentes formas e que funcionam até hoje…
“Descobri que já fizemos músicas de diferentes formas e que funcionam até hoje…”
Passados 27 anos da gravação de “Skank”, 25 anos de “Calango” e 23, de “O samba poconé”, como é cantar essas músicas?
Esses três álbuns têm uma coerência em termos de referências musicais. Escutávamos muita música jamaicana naquela época. É importante comentar que são álbuns distintos que mostram uma evolução entre eles. O primeiro foi gravado de forma independente, para o segundo contamos com uma estrutura de gravadora, e no terceiro tivemos um ótimo orçamento para fazê-lo. Em termos de composições, as experiências vividas na estrada foram ampliando o nosso horizonte, e no terceiro álbum tivemos músicas em português, espanhol e até um rap em francês. Criamos uma bela história e continuamos com a vontade de inovar e pensar novas misturas.
Vocês fazem parte da história recente da música mineira. Como Minas faz parte das suas músicas?
Minas Gerais tem uma cultura muito forte apesar de sermos influenciados de vários lados, por estarmos localizados no “meio” do país. Independentemente do tanto que viajamos, sempre levamos a nossa cultura junto. Seja pela paixão pelos nossos clubes de futebol, seja pela música local. O mineiro já foi mais fechado, mas atualmente está aberto para o que acontece no mundo. Metaforicamente falando, as montanhas mineiras sempre nos protegeram, mas os satélites nos conectam ao que acontece no mundo sem precisarmos sair de casa. Isso acaba gerando novas misturas culturais.
“As montanhas mineiras sempre nos protegeram, mas os satélites nos conectam ao que acontece no mundo sem precisarmos sair de casa.”
Desde que surgiram na cena nacional, o pop rock (e toda a cena musical!) mudou bastante, ganhou novos nomes e perdeu outros tantos. A música de vocês, no entanto, permaneceu. Havia em vocês uma preocupação em estabelecer uma identidade?
O que a gente sempre buscou foi fazer música interessante para quem gosta do nosso trabalho. A identidade é consequência disso. É uma busca que nunca acaba. Seja dentro ou fora do Skank. O Samuel fez o projeto com o Lô Borges, e eu e o Lelo criamos o Nie Myer junto com o DJ Anderson Noise para experimentar novas misturas. Esses encontros acabam criando novas referências para o grupo.
“Algo parecido”, lançada ano passado, é mais uma canção de amor na longa lista de músicas de amor que o grupo canta e que o público faz coro. A música também fala de tempo. Essas são temáticas que representam o Skank? O que essas temáticas dizem intimamente a vocês?
As músicas e suas letras, em sua maioria, retratam momentos vividos por cada artista. Com o Skank não é diferente. Falamos de momentos específicos do país, como em “Multidão”, do álbum “Velocia”, ou de relacionamento como em “Esquecimento” ou “Ainda gosto dela”. A canção “Algo parecido” retrata isso (o amor) também. O mais importante é que ao escutar a música as pessoas sintam que aquela letra faz sentido em suas vidas.
“O mais importante é que ao escutar a música as pessoas sintam que aquela letra faz sentido em suas vidas.”
Quando “Algo parecido” foi lançada, o crítico Mauro Ferreira afirmou que a música “mostra que a canção está viva”. Onde mais percebe a canção viva?
Estamos vivendo um momento onde tudo é muito rápido. Eu costumo dizer que haja ansiolítico pra tanta pressa! No universo musical é a mesma coisa. Algumas músicas que tocam no rádio são praticamente posts de rede social, amanhã ninguém se lembrará delas. Fico feliz de escutar comentários como este do Mauro. Continuamos a acreditar na qualidade, foi o caminho que escolhemos.
Como reagiu à passagem do tempo a amizade de vocês?
O tempo é uma referência interessante. Parece que ele tem medidas diferentes. Quando se gosta de alguma coisa ele passa rápido, quando se detesta o tempo se arrasta. Vivemos experiências e momentos incríveis. Parece que começamos ontem. O mais importante para manter uma amizade e sociedade durante tanto tempo é o respeito mútuo e gostar do que faz. As nossas vidas mudaram, mas a música continua sendo o nosso grande elo de ligação.
SKANK
Nesta sexta, 19, às 20h, no Alpha Ville Chalés (Sítio Cachoeirinha 10 – Conceição do Ibitipoca).