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‘Upstate’, segundo romance de James Wood, chega ao Brasil

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James Wood retrata em “Upstate” a difícil relação de uma família, marcada pelo que sempre fica faltando dizer (Foto: Reprodução)

O inglês James Wood é mais conhecido por seu trabalho como crítico literário em publicações como o jornal britânico “The Guardian” e a revista norte-americana “New Yorker”, tendo sido o ganhador em 2009 do National Magazine Award por resenha e crítica. Ele, porém, já esteve no que podemos chamar de “o outro lado do balcão”: seu primeiro romance “The book against God: A novel” (ainda sem tradução em português), foi lançado em 2004; já seu segundo livro de ficção, “Upstate”, é de 2018 e chegou ao Brasil no primeiro semestre deste ano pela Sesi-SP Editora.

A trama tem como base um trio de protagonistas. Alan Querry é um investidor imobiliário do norte da Inglaterra que precisou criar as filhas praticamente sozinho quando elas eram adolescentes, Helen e Vanessa, após a esposa abandoná-lo por outro homem e morrer pouco tempo depois. A tragédia abala a todos, principalmente Vanessa, que passa por crises de depressão.

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A história, entretanto, é passada mais à frente, em 2008, quando as filhas já estão adultas. Alan vive com uma nova companheira e começa a enfrentar problemas financeiros graças a projetos imobiliários mal-sucedidos; Helen, a filha mais nova, é executiva de uma grande gravadora, casada com dois filhos, mas vive um casamento no qual não é muito feliz e já percebeu que a indústria da música nunca mais será a mesma; e Vanessa é professora de filosofia em Saratoga Springs, nos Estados Unidos, onde vive com o jornalista freelance Josh, quase dez anos mais jovem que ela.

Os três se reencontram na cidade localizada ao norte do estado de Nova York (de onde é tirado o título do livro, pois a região localizada ao norte do estado é conhecida como Upstate) quando Josh envia um email comunicando que Vanessa teve uma nova crise de depressão, que culminou com um braço quebrado. Por isso, Alan e Helena decidem visitar a filha e irmã em meio ao rigoroso inverno da América do Norte, com o que Alan chama de “azul-claro e terapêutico dos céus americanos”. Helen só poderá ficar um máximo de três dias antes de voltar para a Inglaterra, enquanto o pai poderia ficar aproximadamente quase uma semana. O objetivo da visita, além de conhecer a casa e o novo namorado de Vanessa, é descobrir o que realmente aconteceu, como ela está e se existe algo que possam fazer para ajudá-la. Ao acrescentarmos, ainda, a preocupação de Alan com a velhice e o fato das irmãs serem tão diferentes em praticamente tudo, fica a expectativa de um livro cujos personagens farão revelações chocantes ou vão soltar todo ressentimento e mágoa de décadas.

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Um tom abaixo do esperado

Porém, “Upstate” é um romance que subverte essas expectativas, o que pode vir a decepcionar alguns leitores. O livro não é marcado por grandes confrontos verbais, ainda que a tensão entre os protagonistas esteja presente em todos os momentos e algumas rusgas terminem com pai e filha ou irmãs se desentendo. O segundo romance de James Wood é marcado, em sua essência, pelos desencontros, o que não é dito, pelo que se deseja perguntar ou desabafar, mas que no último instante é deixado para depois. Se pensarmos bem, é o que acontece com tantas famílias por aí, e nesse ponto o livro pode provocar no leitor um sentimento de identificação mais profundo com um ou outro personagem.

O que se vê, principalmente, são as percepções que cada um faz do outro familiar, além das prolongadas reflexões de Alan Querry sobre sua vida, o passado, a difícil relação desde sempre com suas filhas e entre elas, e os caminhos que as levaram a ser quem são. A história é marcada, ainda, por uma preocupação de Wood com sua prosa, que pode render momentos inspirados, mas também há trechos em que ele parece se encantar tanto com o próprio texto que acaba por deslizar no exagero estilístico.

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A decisão de promover conflitos em que os personagens se expressam de forma contida traz outro problema para “Upstate”: nenhum dos protagonistas chega a cativar, por mais que Helen e Vanessa se mostrem interessantes e tenham potencial para ser melhor desenvolvidas. Entretanto, o retrato mundano de uma família comum, aliado ao talento de James Wood como escritor, são suficientes para fazer de “Upstate” uma leitura válida para quem deseja mergulhar em uma trama de conflitos familiares desde que não tenha maior densidade dramática.

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