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Magda Tagtachian acerta contas com o passado em ‘Alma armênia’

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Romance da argentina Magda Tagtachian, de ascendência armênia, chega ao Brasil via VR Editora (Foto: Divulgação)

A escritora e jornalista argentina Magda Tagtachian é um dos nomes mais engajados em seu país para que o genocídio armênio – perpetrado pelo antigo Império Otomano (atual Turquia) entre 1915 e 1923 e que pode ter matado até 1,8 milhão de pessoas – jamais seja esquecido. Pois a tragédia humanitária, junto às tensões que ainda existem entre Armênia, Turquia e (atualmente) Azerbaijão, as memórias de seus antepassados, a cultura e tradições do país asiático e sua própria trajetória se cruzam no romance “Alma armênia”, lançado no Brasil pela VR Editora.

Magda mistura essas questões à sua própria experiência como jornalista no “Clarín”, onde trabalhou por 20 anos, para criar Alma, a protagonista da história, que se passa em quatro momentos distintos. Ela faz parte da segunda geração de descendentes de armênios nascida nos Estados Unidos e é editora de cultura no jornal “Boston Times”. Com pouco menos de 40 anos de idade e em dúvida se conseguirá o que dela a sociedade espera – casamento, filhos – e o que ela mesma ainda não conquistou – o amor -, ela se envolve com o fotógrafo Lucciano, filho do dono do jornal e de casamento marcado.

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O conflito entre os princípios jornalísticos e os interesses financeiros do patrão fazem com que Alma peça demissão do jornal e embarque numa viagem até a terra de seus antepassados, para enfim conhecer o país e parentes distantes e possa, assim, entender seu passado e a tragédia vivida pelos avós. Ao chegar à Armênia, porém, ela descobrirá um país ainda mais complexo do que imagina, com culturas e hábitos muito diferentes dos Estados Unidos, e vai viver na pele o drama vivido pelo seu povo. O xadrez, um dos esportes nacionais da Armênia e que Alma aprendeu com o avô Karnig, também marca presença na história.

O xadrez, aliás, é a melhor metáfora para compreender como Magda Tagtachian movimenta as peças no “tabuleiro” que é seu livro, em que cada “movimento” ganha significado mais adiante. É dessa forma que tomamos contato com Alma, inicialmente, no lançamento de seu primeiro livro, já afastada de Lucciano, para depois retornarmos à sua infância, e em seguida avançarmos até o momento em que conheceu e se envolveu com Lucciano, os conflitos éticos-profissionais, a decisão de abandonar o emprego e viajar até Yerevan, a capital armênia.

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Visto sob esse aspecto, “Alma armênia” é um livro envolvente, pois o mergulho nesse universo de um país desconhecido, com suas peculiaridades, seus conflitos, as feridas ainda abertas, é capaz de conquistar o leitor. Ele é apresentado a uma cultura rica, que passa pela religião, a cultura, a arquitetura, os costumes e, principalmente, a culinária.

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Apesar de essencial para amarrar a história, “Alma armênia” tem como ponto fraco a parte do romance, que destoa visivelmente de todo o resto ao colocar sua protagonista – de personalidade forte, capaz de não abrir mão de suas convicções e suportar terrores físicos imensos – como uma figura que se desmancha diante da visão do primeiro abdômen definido e tórax poderoso que aparece à sua frente.

Quando ela se envolve com Hrant, o atormentado jornalista armênio, ainda conseguimos observar alguma afinidade entre os dois, seja pela tragédia de seu povo ou pela ascendência em comum. Lucciano, por outro lado, passa a sensação de ser um clichê ambulante do macho viril, que faz o leitor se perguntar o que Alma viu no sujeito além do corpo sarado, citado em vários momentos.

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Nesse ponto, um personagem e um romance menos estereotipados ajudariam – e muito – a fazer de “Alma armênia” uma experiência ainda mais interessante, pois Alma e toda a bagagem histórica e cultural que carrega, aliadas à ótima prosa da escritora argentina, já valeriam a leitura.

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