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‘Extremistas não representam a população’, diz vocalista do Biquini Cavadão

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Trinta anos é tempo mais que suficiente para se fechar um ciclo. Foi o que os cariocas do Biquini Cavadão fizeram em 2015, com o lançamento do álbum/DVD ao vivo “Me leve sem destino”. A partir de então, foi hora de seguir em frente e criar uma nova história, que resultou no lançamento, este ano, do apropriadamente intitulado “As voltas que o mundo dá”, o primeiro de inéditas desde “Roda-Gigante”, de 2013. Foi a primeira vez que o Biquini Cavadão gravou um disco com o produtor Liminha, responsável por alguns dos trabalhas mais bem-sucedidos de grande parte do rock nacional – como os Titãs.

Após rodar boa parte do Brasil com a turnê do novo álbum, o Biquini se apresenta neste sábado (14), às 22h, na Avalon, com um show totalmente remodelado em relação à turnê comemorativa. Além das músicas novas, a banda continua a apresentar os sucessos de 32 anos de estrada e ainda promete um set acústico. “Tem bastante novidade, mesmo para quem já foi a vários shows nossos”, promete o vocalista Bruno Gouveia, que concedeu entrevista por e-mail esta semana para a Tribuna.

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Além da turnê, Bruno também respondeu a respeito do novo álbum e do seu significado como um novo ciclo para a banda, os novos parceiros musicais, a perseguição contra a classe artística e – inevitável nos dias atuais – sobre a sensação de saber que um dos maiores hits do grupo, “Zé Ninguém”, continuar com uma letra tão atual mais de 25 anos depois de seu lançamento.

 

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Tribuna – Como tem sido rodar com o show do novo álbum, consolidando as novas composições na estrada?

Bruno Gouveia – É muito bom receber o carinho do público. Sempre. E ainda mais pela forma com que estão envolvidos os fãs do novo disco. Além disso, diante de um reinado de músicas de outros estilos, uma turnê tão extensa tem sido um presente para nós.

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O quanto o repertório se assentou nesse período? Houve músicas que renderam melhor ao vivo, e outras não?

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Passamos seis meses apresentando quatro músicas do novo disco no show. Recentemente percebemos que muitos fãs iam várias vezes nos ver. Decidimos então mostrar outras do disco, não porque não estivessem funcionando, mas para que os fãs reincidentes tenham outras experiências.

 

Este foi o primeiro disco da banda em quatro anos. O que os levou a voltar ao estúdio? O quanto esse tempo ajudou a criar novas ideias musicais?

Na verdade, depois de de dois anos. Em 2015, lançamos o “Me leve sem destino”, DVD comemorativo de 30 anos que já trazia cinco músicas inéditas. Após uma longa turnê, queríamos abrir um novo ciclo depois de 30 anos com novas experiências para nós também. Muitas músicas nossas já estavam prontas há alguns anos, outras foram feitas neste período.

 

O quanto o título do álbum é significativo nessa ideia de ciclos que se fecham e se iniciam?

Sempre falamos sobre o imprevisível, né? “Roda-gigante”, que nos faz perceber o mundo de uma forma diferente a cada volta; “Me leve sem destino” como um pedido para os próximos 30 anos; e agora “As voltas que o mundo dá”, que foi tirado dos versos de “Nossa diferença de idade”, todos falando como não temos controle sobre o futuro.

 

“Zé Ninguém” é um dos maiores sucessos do Biquini e talvez a letra de teor político mais contundente da banda. Qual o sentimento de cantar essa música mais de 25 anos depois e perceber que muito pouco – ou nada – mudou?

É triste, com certeza. Nossa vontade sempre foi a de que a música “Zé Ninguém” perdesse o sentido com o passar dos anos. Mas o país pouco evoluiu, e até hoje a cantamos como se tivesse sido escrita na semana passada. No entanto, permita-me fazer uma colocação: acreditamos que na verdade “Zé Ninguém” seja uma música de cunho social, e não político. Não se coloca a favor deste ou daquele partido ou ideologia. A música tanto foi entoada em passeatas para tirar Collor como Dilma. É um desabafo popular, mais que qualquer outra coisa.

 

Ainda a respeito de “Zé Ninguém”: a música trata de um país em que as leis são diferentes para o “andar de baixo”, sobre uma justiça que tarda e falha, um Congresso desmoralizado. Há um sentimento de frustração de ver, assim como acontece com a Legião Urbana com “Que país é este” e “Perfeição”, que tudo mudou para acabarmos do mesmo jeito que antes? O quanto considera a letra atual? E o que os integrantes do Biquini, sejam como indivíduos ou coletividade artística, podem fazer para não deixar a resignação tomar conta da população?

Vamos começar pensando o seguinte: você citou três músicas escritas entre 1987 e 1995 e que continuam realmente atualíssimas. Agora, se a música fosse o meio para mudarmos a percepção das pessoas e evitar a resignação, outras já teriam sido sucesso ou, melhor ainda, já teríamos mudado a situação do país. Quanto ao Biquini, lançamos “Boquiaberto” em 1998, “Problema” em 2000, “Alguma verdade” em 2007, “Livre” em 2014 e “Coragem” agora. Isso é o que estamos fazendo: sempre colocando o dedo na ferida. O problema é que a música hoje é um mero pano de fundo para baladas, festa, puro entretenimento. Ainda assim, não me aborreço com isso, pois não me cabe discutir o que o povo quer ouvir ou o que os veículos querem tocar. Fazemos a nossa parte.

 

Ao mesmo tempo, a classe artística tem enfrentado nas últimas semanas uma demonização por parte de grupos conservadores e políticos oportunistas a partir de toda a polêmica criada em torno da exposição “Queermuseu” e a performance “La Bête”. Como você encara essa “caça às bruxas” promovidas por estes grupos? O quanto a liberdade artística, de expressão, pode estar ameaçada com essa onda conservadora?

Estou acompanhando tudo isso com cautela. Defendo o direito de existirem as exibições, o que não quer dizer que eu tenha achado válido, pertinente, ou acrescentado algo além de polêmica. O mundo todo tem estado extremista demais. Ou é a favor ou contra, ou é companheiro ou inimigo. Quem discorda da exibição pode ser chamado de fascista, racista, homofóbico ou chamado pelos conservadores de comunista, pedófilo etc… Rótulos! Arma para os que pensam pouco e acham que tudo na vida ou é preto ou é branco. Se esqueceram dos mais de 50 mil tons de cinza. Parece que tudo se resume à celebre máxima de Millôr Fernandes,”democracia é quando eu mando em você. Ditadura é quando você manda em mim”. Nenhum posicionamento extremo é a solução. Extremistas são os que mais fazem barulho, mas não os que representam a população. Eu, por exemplo, não me identifico com ambos os lados. Só espero que a eleição não seja vencida no grito.

 

BIQUINI CAVADÃO
Neste sábado (14), às 22h, no Avalon (Avenida Deusdedit Salgado 3.300)

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