Não deve existir tragédia maior para mães e pais que a dor de perder um filho, não importa a idade. Ter que se despedir deles tão cedo, então, talvez seja devastador. Quem é pai, mãe, convive com este medo diariamente, e por isso mesmo conhecer quem passou por tal situação é de criar imediato sentimento de empatia. Ao mesmo tempo, emociona igualmente saber que é possível criar algo belo a partir da infinita tristeza, fazer da dor uma declaração de amor. É o que faz a dupla Carolina Serdeira e Breno Mendonça com o álbum “Menina dos olhos”, que tem lançamento nesta sexta-feira (13) nas plataformas digitais. O trabalho terá shows de lançamento domingo (15), às 19h, no CCBM, e terça-feira (17), às 20h, na Casa da Mata, em Belo Horizonte.
A ideia do álbum surgiu justamente num desses momentos de dor dilacerante. A filha de Carolina e Breno, Maria, morreu em agosto de 2014 com apenas 50 dias de vida, e eles decidiram então que a melhor forma de lidar com a perda seria gravando um álbum. “Desde então, estamos no processo, se fosse um disco normal ficaria pronto antes. Mas este, em especial, foi concebido e criado durante todo esse tempo por vários motivos, em especial a carga emocional”, explica Carolina.
Muitas obras foram criadas a partir do sentimento do luto, como álbuns, músicas, peças, filmes, livros. Carolina acredita que a música, por si só, já tem esse poder de ressignificar e transformar esses sentimentos em algo novo. “Eu já não considero (a morte de Maria) como uma perda, continuo com essa relação de mãe e filha, mas não convencional. Com o disco, é como se ela estivesse nascendo de novo.”
“Eu trato como um grande ganho que a vida nos deu, e não o contrário; é o grande amor das nossas vidas que permanece nos sentimentos, na música”, diz Breno Mendonça. “Tudo vira música conosco; o maior pesadelo vira algo belo, em que as pessoas podem reconhecer o amor disso, e não a tristeza. (O álbum) é uma exaltação ao amor. O amor por um filho deve ser o maior do mundo, e isso está representando no disco, o amor da Maria representa isso. A partir dela todo o sentimento do amor foi potencializado.”
Apoio coletivo e essencial
Para transformar a ideia em realidade, a dupla de artistas teve o apoio fundamental de amigos, artistas, familiares, até mesmo desconhecidos. Para as gravações, por exemplo, a ficha técnica do álbum tem os nomes de Samy Erick, Paulinho Pedra Azul, Dudu Costa, Ladston do Nascimento e Daniel Silveira, entre outros. Da mesma forma, as canções de “Menina dos olhos” reúnem composições de Breno Mendonça e outras oferecidas por Marcelo Côrrea, Laura Jannuzzi e Juliana Stanzani e outros parceiros. De acordo com Carolina, tem “de tudo um pouco”.
“O Breno compôs especialmente para o disco; já o Marcelo é meu padrinho musical, as músicas dele que entraram já tinha gravado antes, mas colocamos outros significados para elas, que caíram perfeitamente nessa homenagem. ‘Menina dos olhos’ ele tinha feito especialmente para mim, mas quando ouvi falei ‘não sou eu, é a Maria’. ‘Dundun’ ganhamos da Laura e da Juliana logo que a Maria morreu. Eu a considero uma música que consegue transmitir a mensagem do disco. E foi muito engraçado, porque não fizeram a música para a Maria, mas achavam que tinha a ver. No início não conseguia ouvir, de tão homenageada. O Gil Costa fez ‘Agum’ para o filho dele, era instrumental, mas era uma música que nós e a Maria adorávamos, e o Paulinho Pedra Azul colocou letra.”
Outra forma de se entender a ligação de tantos em torno de um projeto com tanta carga emocional pode ser pela bem-sucedida campanha de crowdfunding para finalizar o projeto. Carolina Serdeira aponta o apoio que ambos receberam de gente que sequer conheciam. “Quando começamos a produção, só pensávamos em gravar, transformar o que sentíamos em música. Foi pela forma que estávamos lidando com a perda que percebemos que muitas pessoas estavam se envolvendo. Não imaginava que se sentiriam tão tocadas, os músicos não receberam cachê, tocaram por amor mesmo”, relembra.
Laços de amor e solidariedade
Sobre a participação e apoio de tantos, Breno Mendonça acredita que, além da solidariedade pela dor, foi o amor o principal responsável por essa rede. “Uma das nossas funções como artistas é espalhar os mais profundos e verdadeiros sentimentos. Com a história da Maria isso fica mais aberto, se conecta mais rápido com as pessoas, que tentam se colocar no lugar”, acredita. “Mas elas logo percebem que é algo bom, uma celebração e não um luto, e aí querem participar dessa celebração do amor. Isso ajuda a conectar as pessoas. Somos totalmente gratos a todas elas. O amor depende de muita gente, e não só de nós, é preciso que transborde das pessoas. Tentaremos transmitir essa mistura de sentimentos que a Maria nos trouxe, nos revelou, esses sentimentos muito profundos, com o álbum e o show.”
“A gente vive um momento em que o mundo está tão estranho, em que nos sentimos atacados por todos os lados, e poder vivenciar essas coisas, as pessoas se doando com tanto amor, nem consigo mensurar ou explicar”, acrescenta Carolina. “Isso cura a gente, a nossa dor, essa sensação ruim da perda. Claro que existe a felicidade de ser a mãe da Maria, mas também a perda, e receber gratuitamente e generosamente nos cura de uma forma que não sei explicar. Queremos com o disco e o show compartilhar esses sentimentos, essa sensação, poder curar esse mundo tão doente e dividido.”
“Menina dos olhos”
Lançamento do álbum nesta sexta-feira (13) nas plataformas digitais. Show neste domingo (15), às 19h, no CCBM (Av. Getúlio Vargas 200)