Num ano em que sobram distâncias e divergências entre os discursos, e a sete semanas das eleições, a 21ª edição do Rainbow Fest escolhe, mais uma vez, não se calar. O evento que começa na manhã desta sexta, 17, com feira de adoção de animais, reúne diferentes apresentações de DJs, drag queens e comediantes, deixando espaço, ainda, para o debate político. “Queremos ter força política. Então, cada vez mais, vamos conscientizar nosso público para que entenda seu papel como cidadão”, observa o coordenador geral do evento, Marco Trajano. “Vivemos um avanço conservador na política e um crescimento da violência em nossa sociedade. Enfrentamos um momento em que a corrupção grita, e vemos a falência de governos. O Rainbow Fest vem trazer para a comunidade LGBT a importância do voto consciente. Só vamos conseguir a mudança tão necessária se mudarmos o perfil dos políticos que nos representam. A comunidade LGBT luta com suavidade e paz. E não queremos um mundo melhor só para nós, mas para todos”, acrescenta.
Segundo Trajano, desde que o Rainbow Fest desligou-se da Parada do Orgulho LGBT, cuja última edição foi realizada em 2015, o foco voltou-se para outros mecanismos de afirmação, como a cultura, capaz de introduzir, de maneira efetiva e afetiva, discussões sociais urgentes. “A Parada cumpriu seu papel. Já ocupamos os espaços da rua. O que precisamos, agora, é ocupar o Congresso Nacional, precisamos de uma bancada que pense políticas públicas LGBT. Isso só se dá através de um movimento de fortalecimento cultural e educacional, de maneira lúdica e pacífica. Temos que provocar o pensamento crítico. O importante é trazer o debate de forma que as pessoas possam tirar suas próprias conclusões”, defende o militante, que no sábado, por volta das 13h, subirá no palco da Praça Antônio Carlos para representar o orgulho gay dando um beijo em seu marido, Oswaldo Braga, presidente do Movimento Gay de Minas (MGM), com quem está junto há quase três décadas.
Gesto sensível e também político, o beijo tornou-se tradição na cidade. Como também é o canto do hino nacional, este ano na voz da cantora Anna Terra, que demonstra o pertencimento de uma porção da população que ainda carece de direitos. “Temos uma bancada na Câmara Municipal preocupada em construir muros, preocupada com as cores do arco-íris que iluminam a Funalfa, mas se esquece da cidade”, aponta Trajano, referindo-se a um episódio ocorrido no ano passado, quando um vereador criticou a escolha da fundação, que utilizou diferentes cores em suas lâmpadas para iluminar o prédio na esquina da Avenida Rio Branco com o Parque Halfeld, durante a semana do Rainbow Fest.
“Quando tínhamos como proposta, inédita no Brasil, a união civil igualitária, os políticos mais conservadores começaram a distorcer o objetivo do projeto para colocar a população contra a gente. Hoje eles fazem o mesmo ao abordar o Plano Municipal de Educação. Eles agem com muita perversão no debate. Não querem construir pontes, mas reforçar, na política local, a cultura do ódio”, lamenta o militante. Os enfrentamentos, inclusive, fazem parte da história do evento, resistente há mais de duas décadas. “Na época da Parada Gay, os grupos mais conservadores invadiam o desfile com panos pretos. Agora nossa comunidade está mais orgulhosa de si, e conseguimos reagir”, comenta Trajano, pontuando precisar de muito fôlego para a mobilização que o Rainbow Fest representa.
“Vamos aprendendo com os anos. Existe uma homofobia institucionalizada, mas acho que o MGM conseguiu uma legitimidade e uma credibilidade que nos ajuda a negociar. Temos o apoio da Prefeitura e da UFJF, mas ainda assim não é tão simples”, comenta, para logo elaborar uma metáfora. Segundo ele, a vida pode ser comparada a um loteamento onde todos podem comprar seus lotes planos, mas à comunidade LGBT restam os terrenos nos barrancos. “Nesses 21 anos conseguimos terraplanar muitos lotes, mas ainda faltam muitos outros. Ainda estamos fora da escola, ainda somos colocados para fora de casa, ainda vivemos muita violência”, explica ele, reforçando que para 2018 seu plano é retomar a força do evento que, num passado nem tão distante, conseguia atrair públicos na casa das centenas de milhar.
“Há dez anos, tínhamos a maior Parada do Orgulho Gay do interior do Brasil. Em 2006, chegamos a colocar o correspondente a 25% da população de Juiz de Fora na Avenida Rio Branco. Mas as coisas mudam, estamos falando de uma década atrás. Esse ano estamos firmando o nome, a marca, tanto que optamos por não ter um rei ou rainha. O objetivo é fazer com que o evento cresça tanto pela cultura, quanto pelo turismo. Queremos fomentar a economia local”, observa o coordenador geral, apontando que, em 2017, o evento conseguiu atrair R$ 2 milhões para a cidade e, este ano, espera crescer 20% no impacto, recebendo cerca de quatro mil turistas. “Estamos nos reinventando”, resume Trajano.
Mais festas por favor
Revezando-se nas picapes, DJs locais e nacionais dão o tom do evento que reúne, ainda, desfiles de moda, shows de drags queens e humoristas, como as cariocas Suzy Brasil e Karina Karão, que, na tarde de sábado, sobem ao Palco Fernanda Muller, como chama a estrutura na Praça Antônio Carlos durante o evento, homenageando a produtora juiz-forana morta em 2013. À programação são acrescidas festas já tradicionais. Na sexta, a cidade recebe a famosa “Chá da Alice”, balada carioca que convida, para a Avalon, a funkeira Valesca Popozuda. Já no sábado, 18, o Miss Brasil Gay começa às 20h, e, em seu decorrer, acontecem as festas “Funhouse” (com foco em canções pop) e “Stomp” (mais eletrônica). Mais tarde, ainda no sábado, terá a Euphorika (com cinco DJs), no Clube Olímpico. Parado ninguém precisa ficar.