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Belo Horizonte como destino para a folia de carnaval 2018

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Do Rio de Janeiro para Belo Horizonte: Bloco Então Brilha começou em 2011 e na última folia levou mais de 150 mil pessoas da Rua Guaicurus à Praça da Estação (Foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press

Podia Ser Pior, ironizava já no nome o bloco que abriu o carnaval na Belo Horizonte de 2012, ano em que outros 35 blocos foram às ruas da capital, além das seis agremiações que desfilaram numa tímida Avenida dos Andradas, entre os viadutos de Santa Tereza e Floresta. No ano seguinte, o número de blocos mais que duplicou, chegando a 60 grupos. Em 2017, mais de 350 blocos fizeram mais de 400 desfiles para 3,5 milhões de pessoas, 500 mil delas turistas. Para este ano, é esperado um aumento de 20% do público, chegando, portanto, a 4,2 milhões de foliões numa capital antes deserta nessa época do ano.

Segundo dados da Belotur, Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte, no último ano, o carnaval movimentou R$ 530 milhões na economia da cidade, elevando a ocupação hoteleira de 37,5% em 2015 para mais de 60% em 2017. O interesse do público, por sua vez, refletiu na iniciativa privada. Enquanto a cervejaria Skol investiu R$ 1,5 milhão na folia passada, para este carnaval promete injetar, junto da marca Uber, R$ 8 milhões.

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“Existe um impacto real. Se antes ainda víamos muitos restaurantes fechados, hoje vemos Belo Horizonte pulsante, as pessoas entendem como um momento de oportunidades”, comemora o diretor de eventos da Belotur, Gilberto Castro, certo da singularidade de um fenômeno já seguido como exemplo por outras cidades. “Quando a gente fala de festa, sempre lembra do Rio de Janeiro. Pode até ser bairrismo de minha parte, mas acredito que tem algo muito peculiar no carnaval de Belo Horizonte. Este ano teremos 550 blocos e 90% deles acontecem durante o dia, são na rua, tem um contato com o logradouro. Tem algo mineiro na nossa festa”, afirma.

De gente pra gente

Em 2010, um grupo de amigos belo-horizontinos decidiu passar o carnaval no Rio de Janeiro. Vestidos com roupas coloridas e ostentando uma estrela do personagem Mario Bros na testa, os mineiros tiveram uma ideia: criar um bloco. Em meio à folia, recorrem à poesia russa. “Brilhar para sempre,/ brilhar como um farol,/ brilhar com brilho eterno,/ gente é para brilhar”, escreveu Vladimir Maiakovski, inspiração para o já gigantesco Bloco Então Brilha, que em 2011 estreou em Belo Horizonte, no ano seguinte foi incluído na programação da cidade e em 2017 levou mais de 150 mil foliões para o desfile que parte da Rua Guaicurus e chega à Praça da Estação, no Centro da capital.

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“A cada ano o desafio se renova. Lembro do primeiro desfile oficial, quando o pessoal construiu uma carroça de madeira para ser puxada por uma bicicleta. Ela é que levava a caixa de som. Em 2013 tivemos o primeiro trio elétrico. Ano passado tivemos um helicóptero fazendo chuva de purpurina nas pessoas. Esse ano teremos alegorias bem criativas que serão surpresa. Cada ano é um desafio, tanto técnico, para fazer chegar a música a todos que acompanham, quanto artístico. Ano passado incorporamos um coro de vozes formado por 30 pessoas carregando megafones dentro do bloco. Esse ano serão 60 vozes e o corpo de baile, chamado Requebra, também com 60 componentes”, orgulha-se Rubens Aredes, o folião que, em 2014, tornou-se vocalista do bloco, dividindo microfone com a também cantora Michelle Andreazzi.

Blocos se reuniram na Praça da Estação, na capital, formando uma só bateria para encerrar o carnaval de 2017, o maior na história de Belo Horizonte (Foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS

Retrato de um carnaval crescentemente efervescente, o Então Brilha tornou-se, ainda, reflexo de uma cena musical em franca expansão no estado. “Trabalhamos o repertório do axé music dos anos 1990 e o que chamamos de axé das montanhas, feito em Belo Horizonte, por compositores que compõem o bloco”, comenta Aredes, citando artistas como Gustavito, autor de “Corpo de pantera”, criada especialmente para o bloco. “Sim, eu sou filho desse tambor/ que me faz perceber o amor/ alimento da cor/ formoso.”

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Nascido e crescido numa região histórica da cidade, o bloco levantou uma bandeira de resistência onde vivia o descaso. “A Rua Guaicurus tem um histórico interessante de ter sido a zona boêmia. Hoje ela é mais voltada para um comércio popular, ocupada por pessoas mais pobres e onde se encontram muitos prostíbulos. Isso ajudou a criar um estigma. As pessoas costumam olhar para aquele espaço de forma negativa. Nossa ideia é destruir os preconceitos, mostrando que aquela região merece atenção, carinho e respeito como qualquer outra região. Essa rua é nosso ponto de concentração, o lugar que escolhemos como a nossa casa e o nosso discurso”, defende.

Em 2018 o bloco inclui em sua formação uma ala preenchida apenas por garotos e garotas de programa filiados à Associação das Prostituas de Minas Gerais. “Nossa ideia é que gente é para brilhar, então temos o desejo de integrar as pessoas”, observa Aredes, anunciando também a criação da Escola Brilhante de Artes. “A partir desse projeto esperamos acessar o público da periferia, formando percussionistas, bailarinos, artistas plásticos, criando mão de obra para a cidade e para o bloco”, comenta o vocalista do bloco e da banda homônima, que atua no cenário cultural da cidade nos outros 11 meses do ano.

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Com gosto de férias

Resultado de uma demanda criada por artistas do carnaval e foliões, o apoio do Poder Público ao carnaval de Belo Horizonte é apenas uma etapa de um processo ligeiro e predominantemente popular. Segundo o diretor de eventos da Belotur, Gilberto Castro, o crescimento e a sofisticação do carnaval belo-horizontino se deve a uma rede de fatores, dentre eles o enfraquecimento da folia no interior do estado e a característica democrática da festa na capital. “Quando o Poder Público entendeu que a cidade queria um carnaval, a Prefeitura criou canais de comunicação com os blocos de rua e as escolas de samba que nunca deixaram de existir, mas se enfraqueceram nas últimas décadas. Criamos, também, alguns palcos oficiais para incentivar os artistas locais que fazem música o ano inteiro. A receita para que desse certo foi o diálogo, entender o que a população deseja, e isso vai muito além de conversar com os blocos, mas exige conversar com o comércio, com as associações de bairro, hotéis, receptivos e outros órgãos que têm interface com a festa”, comenta o gestor.

Para Léo Lima, violonista e um dos fundadores do Bloco Fúnebre, que desde 2013 desfila na sexta-feira seguinte ao carnaval, a despretensão com que os blocos foram erguidos na cidade contribuiu para o sucesso do evento. “No primeiro ano fizemos um cortejo para 200 pessoas. A TV acompanhou parte do cortejo e em 2015 reunimos mais de 1.500 pessoas. Desde então crescemos muito, mas estamos segurando, porque não temos o intuito de deixá-lo sair do controle, queremos manter a ideia da rua, do lugar democrático. É um bloco de rua”, comenta ele, integrante da Banda de Rock Leonora, cujos integrantes encabeçam a Banda Fúnebre, que dá o tom no bloco. “Por sermos músicos, nossas férias são o carnaval, então tentamos mantê-lo como um refresco.”

Representante da originalidade que se espalha pela folia belo-horizontina, com blocos com homenagens das mais diversas – Volta Belchior e O Beiço do Wando são alguns dos exemplares -, o Fúnebre, que desfila entre as praças da Bandeira e Tiradentes, preza pela excentricidade, inclusive recusando o aporte municipal e lançando mão do apoio de pequenos comerciantes do Bairro Serra. “Pensamos no bloco para remeter à ideia de que os brasileiros enterram todas as suas tristezas para curtir o carnaval. Nos inspiramos muito no Bloco Zé Pereira de Ouro Preto e nos funerais de New Orleans”, contextualiza o músico. “Nosso lema é enterrar as tristezas e ressuscitar a alegria.”

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