Por trás das noites inesquecíveis. Em um movimento contínuo para fazer as coisas acontecerem. A cena rodar. É suor. Muito trampo, eles dizem. Por vezes longe dos holofotes, na verdade, são eles que garantem que haja luz por ali. Que haja o som. O nome que fica escondido, já que é a empresa que, por vezes, assina a produção, precisa ser descortinado. Trazer à tona. Pois bem: “A Gira sou eu”, diz Stéphanie Fernandes. Ela se entende como produtora desde sempre, pode-se dizer assim. Mas só em 2020, há exatos três anos, decidiu colocar nome no que fazia desde, praticamente, os 14 anos. A Gira nasceu em 13 de março de 2020: a sexta-feira 13 em que eclodiu a pandemia. O começo e o fim ao mesmo tempo. Ou um quase fim. Já que não tardou para que a Gira voltasse a ser a responsável por diversos shows por Juiz de Fora, trazendo nomes da música alternativa nacional sem deixar de colocar luz sobre as bandas da cidade, promovendo um intercâmbio justo que é bom para todos os lados. E, para comemorar esses três anos, a Gira traz, nesta quinta-feira (9), a Sophia Chablau para um show intimista no Muzik, a partir das 21h. Além dela, Amélia e Marizótica garantem a noitada de celebração, comandando o DJ set.
Stéphanie viu a música como caminho, quando ainda era adolescente. Com 14 anos, já tocava em bandas. Mesmo sendo nova, seus amigos mais velhos, que tinham bandas há mais tempo, já tinham ela como referência quando o assunto era pensar em show ou em divulgação. Porque fazer música e tocar é apenas uma das funções que envolve ser músico ou ter uma banda. Já aí, mesmo que não de maneira profissional, ela era produtora. Entre 17 e 18 anos, ela foi para São Paulo para estudar música e, aí, começou a se envolver mais profundamente com a área. Quando viu, estava, oficialmente, assumindo a produção de eventos em geral, sempre atuando, paralelamente, em bandas.
O foco, de certa forma, sempre foi a parte artística, que envolvia estar relacionada diretamente com os músicos e o necessário para fazer com que eles subissem aos palcos com as condições necessárias para um bom show. “E, em paralelo a isso, eu fui produzindo bandas de amigos, fui sendo convidada para fazer a programação das casas em São Paulo. Isso foi uma coisa que sempre andou junto. Começou a virar trabalho. Amigos de fora me pediam dicas e eu ia ajudando, organizando, marcando show. Começou assim e quando vi virou trabalho. Fui fazendo eventos e vendo como funciona. Em Juiz de Fora, eu comecei a produzir algumas bandas, as que eu toco e dos amigos. Comecei a colocar as bandas da cidade com as de fora em contato, fazendo um circuito mesmo, um intercâmbio.”
Ser, ao mesmo tempo, artista e produtora, para ela, a ajuda a ter uma visão 360º dessa cadeia que é a música. “Isso foi bom porque deu um norte 360º: como é ser artista, como é produzir, e como é ser programadora. Isso me dá muita visão do que acontece, tanto em cenas pequeninhas, alternativas em Juiz de Fora, quanto do macro em São Paulo, que é fazer um festival, por exemplo. Então, é uma coisa que me abriu muito os contatos e me abriu muito a visão, me fez ter bastante experiência.”
Colocar Juiz de Fora no mapa
Stéphanie relembra que, dos anos 2000 até, mais ou menos, 2010, Juiz de Fora era um ponto de referência para os artistas com datas em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, por ser uma cidade de passagem. Isso foi se perdendo. E ela acredita que é pelo fato, principalmente, de as casas começarem a focar mais em DJs do que em bandas. “Como eu já fazia essas produções de shows e de artistas, resolvi dar um nome. E a ideia era fazer com que Juiz de Fora voltasse a ser ponto de referência no mapa.” O primeiro passo foi ajudar na produção da Necessaire, casa alternativa da cidade. E, então, em 13 de março de 2020, a Gira nasce, lá, com show da Ana Frango Elétrico com casa lotada e o começo de um sentimento de que a pandemia viria. Ela ficou parada nesse tempo.
Já com a luz no final do túnel, surgiu a oportunidade de ser sócia no Muzik e assumir a programação e curadoria da casa. “Eu nem tinha pensado em voltar com a Gira. Mas eu percebi que as bandas que me procuravam, muitas delas eu não conseguia encaixar no Muzik, era uma coisa além. Porque o Muzik tem noites muito bem desenhadas. Eu pensei que não podia ficar limitada ao Muzik, e quis voltar com a Gira e programar em outras casas também. Foi isso que aconteceu. Tirei o foco de produção de artista, lógico que ajudo os amigos, mas não agencio artista mais, eu não pego para cuidar da agenda e tal. Eu foquei em show e foi rolando.” Nos últimos tempos, Stéphanie trouxe, pela Gira, nomes como Marcelo Gross, Dora Morelembaum, Glue Trip, além de Bala Desejo em parceria com o Sensorial – parceria essa que ela considera rica para a cultura de Juiz de Fora -, entre outras.
Fazer girar
Mas a proposta é sempre o intercâmbio. “As bandas locais muitas vezes são elas que vão trazer o público. Tem um público cativo na cidade. Se a banda de fora é desconhecida, isso ajuda. E eu não gosto de tratar as bandas locais como abertura. Eu gosto que seja da forma para que as duas bandas possam dividir a noite. Eu gosto que seja tratado com o mesmo peso. É importante divulgar, ajudar as bandas que estão começando e têm menos público. A ideia da Gira é, principalmente, essa: fazer esse intercâmbio para que as bandas locais tenham a oportunidade de girar depois. Minha maior dificuldade é divulgar. Juiz de Fora tem um público mais restrito, e são muitos fatores. Mas o mais difícil de trazer bandas diferentonas é convencer as pessoas a irem.”
E, mesmo sendo o nome por trás da Gira, Stéphanie tem, junto com ela, outras pessoas que fazem tudo isso se tornar possível. “Eu cresço e diminuo dependendo do tipo de evento. Eu gosto muito de valorizar as pessoas que estão comigo, marcar todo mundo nos posts. Porque é uma cadeia e sem um o outro não funciona.” E o nome, por exemplo, tem isso de fazer girar tudo. Mas é também “turnê” em espanhol e um ritual na umbanda. “A Gira é o que eu gosto de fazer. Agora eu tô fazendo uma exposição gigantesca (em São Paulo), eu sou uma das principais produtoras. Mas não é o que me dá tesão mesmo. Para mim, a coisa é a música. Eu não seria feliz só tocando ou só produzindo bandas. Eu gosto do todo. De estar envolvida em todos os processos: desde escolher o cartaz até comprar passagem; negociar até subir ao palco. É 360º mesmo. Uma coisa não faz sentido sem a outra”, finaliza.