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A essência empreendedora de Juracy Neves contada em livro

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Em livro com lançamento no próximo dia 11 Juracy Neves revive seus 86 anos. (Foto: Fernando Priamo)

“O sujeito não nasce humano, mas com potencial humano. Na espécie humana, o nascer antecede o ser. Com os animais é o contrário: o cachorro já nasce cachorro, o gato já nasce gato. O homem não nasce homem. Quem nos ensina a ser homem é o outro. Carregamos o outro dentro de nós, porque é com o outro que aprendemos a andar, a falar, e muitos outros potenciais. Tudo isso é desenvolvido na criança. O homem é totalmente integrado ao outro.” Na segurança do médico, com o tom didático do professor e na intrepidez do empresário, Juracy Azevedo Neves conta sobre os conhecimentos que respondem por sua formação. Aprendeu a ser homem e também a ser empreendedor. Também compreendeu o lugar em sua vida da religiosidade tão ensinada por sua mãe. “Eu era católico por conta da minha mãe e da herança cultural. Tínhamos a formação católica, mas o estudo da antropologia, do processo evolutivo do homem, foi tirando minha fé. Cheguei à conclusão, através de estudos, de que Deus está no imaginário humano. É uma criação do homem por necessidade. Acredito em Deus, que é fruto do imaginário humano. Ele não tem existência real. Mas o mundo ainda não está pronto para viver sem Deus. Há a necessidade da presença de Deus. Não sou ateu. Porque o ateu tem que provar porque não acredita em Deus. Não sou assim. Sou pragmático. Não tenho que provar a existência, nem dizer porque não existe. Não tenho que provar nada. Sou um homem racional, funciono pela razão. Tudo tem uma razão de ser”, comenta o homem, que aos 86 vê a biografia “O homem da planície: Vida, obra e ideias de Juracy Neves” (217 páginas) ter sua razão de ser.

Capa da biografia foi produzida pelo artista plástico Carlos Bracher, que também assina a apresentação do livro. Reprodução

“Como ele é antropólogo, percebe muito bem que um homem se materializa em suas realizações. A gente passa, mas o que realiza permanece. A eternidade está aí”, pontua o autor da obra, o editor geral da Tribuna, Paulo Cesar Magella. Fruto de uma pesquisa e entrevistas iniciadas há mais de um ano, o livro, dividido em capítulos por realizações, conta com passagens e momentos de angústia, como o que relata a amputação de uma perna. Encerrada com uma longa entrevista, na qual o biografado expõe suas ideias nas áreas de saúde, educação, política, economia e sociedade, a obra tem lançamento no próximo dia 11, terça-feira, às 9h, no Premier Parc Hotel.

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Juracy ao lado do então prefeito Agostinho Pestana na inauguração da Galeria Hipólito Teixeira. (Foto: Arquivo pessoal)

Primeiros passos visionários

Atuante em diferentes setores da sociedade juiz-forana, Juracy Neves tornou-se um dos principais nomes da empreendedorismo local nas últimas décadas. “Minha essência, minha alma, é empreendedora”, reconhece. “A Santa Casa é um legado. Iríamos ficar sem ela, não fosse o trabalho dele. O Grupo Solar de Comunicação também é outro legado, porque contamos a história de Juiz de Fora desde 1981, registrando cotidianamente. Ele teve o primeiro cursinho pré-vestibular, junto do Olamir Rossini, com quem também trouxe o primeiro hospital de câncer. Até então as pessoas morriam aqui, ou quem tinha condições saía para se tratar. As obras da construtora dele são vistas em vários pontos da cidade. Ele construiu três bairros e um prédio que parece uma cidade. Imagina fazer isso nos anos 1970, quando o financiamento era único, do BNH (Banco Nacional da Habitação). Realmente a planície é o habitat dele. Ele olha sempre para a frente”, comenta Magella, sobre o homem que, ainda, reúne o título de professor da Faculdade de Filosofia da UFJF, cargo que assumiu no princípio dos anos 1970.

Juracy e seu sócio da vida inteira, Olamir Rossini. (Foto: Arquivo pessoal)

O convite para comandar uma sala de aula, lembra Juracy, partiu do então professor João Villaça. “Aceitei, e a faculdade foi encampada pela UFJF. Comecei a dar aulas sem nunca ter tido o conhecimento em filosofia. Eu só conhecia um pouco da antropologia física, eu estudava os homens. Entrei nos estudos profundamente, então”, recorda-se ele, que naquele tempo já dava seus primeiros passos visionários, criando o curso pré-vestibular Barros Terra. “Tem muito de Arthur Schopenhauer (filósofo alemão), que fala que temos desejos e frustrações, e nossa vida se pauta nisso. Fazemos um projeto, daqui a pouco queremos outro, e outro. O Juracy começou na medicina, montou um hospital, trabalhou naquilo e mais tarde percebeu que aquilo já não era o suficiente para atender a ansiedade que tem. De repente, ele se viu no mundo da comunicação, se relacionou com a política e também estava na construção civil. Houve um tempo em que ele atuava na medicina, construção civil, comunicação e política. Ele é muito ansioso, de realizações, nunca está conformado, quer sempre ir além. Ele é muito determinado”, aponta Magella.

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Acordando cedo com as galinhas


A mãe Acidália com os quatro filhos: Terezinha, Aparecida, José e Juracy (o menor, à direita). (Foto: Arquivo pessoal)

Ainda muito cedo, aos 11 anos, Juracy Neves conheceu o peso da morte. José Antunes, o José Jorge, deixou em silêncio a mulher, Acidália, e os quatro filhos, José, Juracy, Aparecida e Terezinha. “Ele morreu cedo, aos 37 anos. Ele me estimulou muito, pena ter ido embora tão cedo. Depois minha mãe se casou outra vez, e meu padrasto também era bem participativo. Meu pai era um empreendedor nato. Se ele não tivesse morrido, estaria entre os grandes do frango no país, poderia ter sido como a Pif Paf. A essência dele era de fazer alguma coisa. Ele montou um empório de galinha em Lima Duarte, onde ele vendia frango de granja. O frango era comprado vivo, amarrava o pé dele, punha debaixo do braço e ia embora. Ele comprava os frangos na região de Lima Duarte e mandava para Juiz de Fora e para o Rio. A gente tinha uma rotina bem rígida, porque às 17h tinha um volume grande de galinhas chegando. No dia seguinte, pegávamos e colocávamos no trem, que saía de Lima Duarte às 7h45. Dependendo do volume que tinha, a gente acordava às 4h ou 5h. Meu pai é que chamava a gente. Sempre que ele chamava, eu acordava logo. Meu irmão é que era meio malandrão”, conta o homem, dizendo acordar cedo ainda hoje.

Juracy com os filhos Márcia, André, Marcos e Suzana (da esquerda para a direita).(Foto: Arquivo pessoal)

Radicado em Juiz de Fora, para onde se mudou com os irmãos, a mãe e o padrasto Benedito (com quem a matriarca teve outros três filhos), Juracy escreveu sua história pessoal e também é profissional obstinado com o trabalho, como ensinou o pai. “O empreendimento que mais me empolgou foi a Santa Casa de Misericórdia. Quando assumi a provedoria, ela estava falida. Fiz uma reunião com os credores e pedi seis meses para pagar todo mundo. Verifiquei que a receita não dava para manter o hospital, era insuficiente. Precisava pensar num ganho extra para a Santa Casa, e eu criei o plano de saúde. O hospital passou a ter duas rendas. Hoje o Plasc arrecada mais de 50% da receita da Santa Casa. Foi um sucesso. Depois outros hospitais começaram a fazer”, rememora ele, provedor por dois mandatos, nos quais fez com que o plano se tornasse o maior de Juiz de Fora.

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A melhor coisa: se candidatar e perder

Juracy Neves em desfile da Unidos do Ladeira, que o homenageou em 2003. (Foto: Arquivo pessoal)

O admirável gestor, reconhecido em prêmios e honrarias, tornou-se tão logo alvo do ambiente político. “Conclui que a melhor coisa que fiz na vida foi ser candidato a prefeito. E a melhor coisa que me aconteceu foi perder a eleição”, ri. “Quando estava na Santa Casa, o crescimento do hospital foi tão espantoso que insistiram, então, para eu ser prefeito. Entrei naquela euforia, mas demorei a me convencer de que, correndo a periferia de Juiz de Fora, muitos só pedem as coisas. A cidade não estava preparada para ter um grande empreendedor. Eu queria fazer a diferença. Se eu tivesse vencido, teria entrado nos debates de toma lá, dá cá”, observa, em perspectiva, o empreendedor que construiu, para o próprio sonho de ser ator, um teatro com o nome da marca inspirada no rei da França Luís XIV, o Rei Sol.

“O teatro, o jornal e a rádio refletem meu espírito empreendedor”, reconhece. “Naquela época estava muito em voga um estudo sobre a comunicação a longo prazo. Eu era professor de antropologia e me baseei na teoria do ponto ômega, de que toda a humanidade converge para um pensamento único. Eu queria, então, um meio de comunicação que seguisse esse caminho”, conta Juracy. Paulo Cesar Magella, agora biógrafo, lembra de ter conhecido o médico, empresário e professor ainda na metade da década de 1970. “Eu estava num restaurante da cidade, o Faisão Dourado, quando ele chegou com a turma dele. Não cheguei perto, mas soube que aquele ali era o Juracy Neves”, narra o jornalista, que passou a contratado em 1980, quando o empresário assumiu o controle societário da Rádio Sociedade (Super B3), em sua primeira investida no setor de comunicação.

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Juracy neves ao lado do então governador de Minas Gerais, Francelino Pereira, na inauguração da Tribuna, em 1981. (Foto: Humberto Nicoline/Arquivo TM)

“Pelo menos uma vez por mês o Juracy fazia jantares para os editores. Ficávamos até 2h ou 3h da manhã, discutindo a vida, falando sobre tudo, política, economia, inclusive sobre o jornal, é claro. A gente conversava muito e a história dele fui conhecendo. Vi os filhos dele crescerem, eram todos menores de idade quando conheci, e aos poucos foram entrando no mercado de trabalho. Pela história que ouvia, da origem até onde chegou, precisava que alguém contasse essa trajetória”, comenta Magella, editor geral do veículo fundado por Juracy desde 1995.

Juracy e a atual esposa, Maria Helena Zacaron, em viagem à China. (Foto: Arquivo pessoal)

‘Tudo o que pretendia realizar realizei’

Tinha ainda 9 anos quando, sob o testemunho do pai, decidiu-se médico. Juracy e seu José assistiam a conferência do médico Joaquim Otaviano, em pé na boleia de um caminhão. Formado no Rio de Janeiro e atuante em Juiz de Fora,o profissional de renome num determinado momento bradou: “Se preciso for, largarei o bisturi para pegar a baioneta!”. Juracy se recorda: “Aquela frase me marcou tanto que eu falei com meu pai: ‘Vou estudar medicina!’. Infelizmente ele não pode ver, porque a morte poupou-lhe a vida muito cedo. Mantive a força empreendedora dele e mantenho até hoje. Só não dou mais continuidade porque fui vitima de um problema genético. Nasci com as artérias estreitadas nos membros inferiores. Na infância eu sentia muitas dores, dava muitos problemas. Depois vivi bem, até os 83 anos, quando começou a aparecer uma dor intensa nas pernas, coloquei stents nas duas, mas na direita ele não funcionou direito e teve que ser amputada”, lamenta ele. “O que me salva são os livros. Eu era muito ativo, e quando perdi a perna comecei a ler muito mais. Leio de tudo. Mas tem que ser livro de conteúdo.”

Biógrafo e biografado: Paulo Cesar Magella passou o último ano trabalhando na história de Juracy neves. (Foto: Olavo Prazeres)

Para Paulo Cesar Magella, outro evento, vivido oito anos mais tarde, demonstra a obstinação de seu biografado. “Um garoto de 17 anos escrever o que ele escreveu, uma espécie de manifesto de vida, não é para qualquer um”, diz, referindo-se ao texto no qual diz, dentre outras coisas, que promete tirar da vida exatamente o que nela colocar. “Prestarei melhor serviço do que for capaz, porque jurei a mim mesmo triunfar na vida e sei que o triunfo é sempre resultado do esforço consciente e eficaz. Finalmente, perdoarei os que me ofendem, porque compreendo que algumas vezes ofendo os outros e necessito de seu perdão”, redigiu, em seu quarto, enquanto os amigos brincavam na rua, no dia 25 de março de 1950. Passadas quase sete décadas, usando da segurança do médico, da didática do professor e da intrepidez do emp0145resário para Juracy, o homem que escreveu a própria história ajudando a redigir a história de uma cidade, garante: “Tudo o que pretendia realizar realizei. Mas meus sonhos não eram impossíveis.”

SAIBA MAIS

Leia trechos da biografia de Juracy Neves escrita por Paulo Cesar Magella

 

O HOMEM DA PLANÍCIE: VIDA, OBRA E IDEIAS DE JURACY NEVES
Lançamento no dia 11 de junho (terça-feira), às 9h, no Premier Parc Hotel (Avenida Deusdedit Salgado 1805 – Teixeiras)

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