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Dionysia Moreira: de cantora do rádio a estrela do ‘The Voice+’

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Dionysia cantou “Gostoso demais”, de Dominguinhos e Nando Cordel (Foto: Reprodução/TV Globo)

Moradora de Juiz de Fora, a cantora Dionysia Moreira, de 90 anos, participa da nova temporada do reality show “The Voice +”, que estreou sua nova temporada no último domingo (30), na TV Globo. Na primeira fase do programa, que é dedicado às audições às cegas, ela cantou a música “Gostoso demais”, de Dominguinhos e Nando Cordel. Ela impressionou os jurados ao revelar sua idade e recebeu muitos elogios de Carlinhos Brown, que foi o único a virar a cadeira no teste às cegas e terá a artista nonagenária em seu time. “Você nos honra com sua presença. Muito obrigado por trazer um tom seresteiro a essa música linda, que é um hino da canção brasileira e que nasce no Nordeste. Você arrasou com seus 90 anos e essa lucidez de cantar a saudade.”

No início da tarde desta segunda (31), Dionysia conversou com a Tribuna por telefone, acompanhada pela sobrinha Ana Paula, que estava com ela na gravação no Rio de Janeiro. Dona Dionisya comentou sobre a oportunidade de ter visibilidade nacional após mais de 60 anos da primeira vez que cantou em uma rádio. “É uma coisa muito diferente. Os produtores foram muito atenciosos, e pisar no palco do ‘The Voice +’ foi muito emocionante. O programa é maravilhoso”, diz a cantora. Apesar da longa carreira, ela não nega o frio na barriga na hora de subir ao palco diante de artistas como Fafá de Belém, Ludmilla, Toni Garrido e Carlinhos Brown. “É um misto de emoções. São pessoas que eu admiro e estavam a 3 metros de distância. Foi uma troca de carinhos”, conta.

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Foi sua sobrinha Ana Paula que fez a inscrição, em fevereiro de 2021. Em setembro, a produção entrou em contato para avisar que ela tinha sido pré-selecionada. Depois, foi preciso passar pelas outras etapas para ficar entre os participantes do reality show. Ana Paula diz que “está sendo um estouro”, tanto em nível local quanto nacional. “Várias celebridades, entre elas o Hugo Gloss e a Thaís Fersoza, comentaram sobre a apresentação dela”, comemora a sobrinha, lembrando que a tia agora tem perfil no Instagram.

“Todo mundo na família está curtindo esse momento, e ela mais ainda. O momento de felicidade dela é nossa felicidade, pois ela está no programa para se divertir e ser feliz, não está vendo como uma competição. E o pessoal do bairro (São Bernardo), sejam amigos ou pessoas que não conhecemos, está procurando por ela, comentando nas redes sociais e externando um carinho e felicidade muito grandes.”

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Mais de seis décadas de carreira

Nascida em Santos Dumont em 1931, numa família de 13 irmãos, Dinoysia Moreira veio para Juiz de Fora com os pais aos 3 meses de idade, para morar no Bairro São Bernardo. A primeira vez que cantou em uma rádio foi em 1950, no programa “Fazenda do Fundão”, do “cumpadre Sebastião de Matos”, na rádio PRB-3, que viria a se tornar Rádio Solar. A primeira música que interpretou na carreira foi “Último desejo”, e logo foi apelidada de “a Professorinha do Arraiá” e seguiu cantando no programa às quartas-feiras, sem receber cachê.

Ainda na década de 1950, ela ficou em segundo lugar no programa “Papel carbono”, programa da Rádio Nacional que foi transmitido pela antiga Rádio Industrial. Foi eleita cantora revelação no programa “Soirée feminina”, do radialista José de Barros, na PRB-3, e recebeu seu primeiro contrato como profissional da emissora em 1954, tendo sido eleita a melhor cantora de Juiz de Fora em 1956 e 1957.

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O reconhecimento de seu talento fez com que Dionysia fosse convidada a abrir shows de alguns dos mais populares artistas brasileiros da época, como os de Maysa, no Clube Juiz de Fora; Ângela Maria, no Cine-Theatro Central; Cauby Peixoto, no campo do Sport; Nelson Gonçalves, em Três Rios. Ao casar-se, em 1958, ela interrompeu a carreira por cerca de 20 anos, até ficar viúva em 1978. A intérprete voltou a cantar em 1979 na TV Industrial, no programa “Casamento na TV”, apresentado por Raul Longras, onde conheceu o segundo marido, o cinegrafista Clóvis Martins de Araújo. Nesse mesmo ano, chegou a receber convite para cantar na Rádio Rio de Janeiro, mas recusou o convite porque teria que se mudar para a capital fluminense.

Tendo escolhido Juiz de Fora, Dionysia Moreira seguiu cantando na noite, acompanhada pelo violonista e guitarrista Paulo Pires e o cantor Luiz Edmundo. Em meados dos anos 80, foi convidada para ser crooner da banda Partido Alto, se apresentando com o grupo por todo o estado até 2001, quando passou a cantar com a orquestra Cassino Royale até 2003. Como reconhecimento por sua contribuição à música e cultura de Juiz de Fora, a cantora recebeu, em 2012, a Medalha Nelson Silva, concedida pela Câmara Municipal. Apesar de ter uma carreira iniciada há mais de seis décadas, Dionysia foi gravar seu primeiro álbum apenas em 2013, com o apoio da Lei Murilo Mendes, em que ela interpretava composições de autores locais, como Nelson Silva, Alfredo Toschi, Roger Resende, Kadu Mauad, Mamão, Djalma de Carvalho, Juquita, Camarão e Toinho Gomes.

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Na torcida

Responsável pela produção do único álbum lançado por Dionysia Moreira, o instrumentista e produtor Márcio Gomes conta que conheceu a cantora por meio do ex-vereador Vanderson Castelar. “Nós marcamos um encontro, conversamos sobre a proposta do disco, e, como o projeto foi aprovado na Lei Murilo Mendes, conseguimos fazer o CD”, relembra. “Eu falei: ‘você foi uma cantora da época da PRB-3, conviveu com muitos compositores de Juiz de Fora, acho importante que grave as músicas desses compositores’, e ela concordou. Fomos lembrando de músicas que ela cantava na época do rádio até chegar ao repertório com compositores contemporâneos de Dionysia, mais alguns nomes atuais.”

Segundo Márcio, ela tinha parado com a carreira de cantora profissional na época do lançamento do álbum, participando mais de eventos no projeto Pró-Idoso, da Prefeitura de Juiz de Fora, ou na igreja do São Bernardo. Dionysia voltou então a participar de eventos maiores, incluindo participações no projeto Ponto do Samba. “Agora, ela está tendo essa visibilidade merecida.”

No palco com Dionysia

Um dos artistas homenageados por Dionysia Moreira em seu único álbum é Roger Resende, que teve sua parceria com Kadu Mauad, “Chora e aceita”, abrindo o disco. Ele também foi o diretor musical do show de lançamento do CD, no ano seguinte, em que também tocou violão. “Conheci a Dionysia através do Márcio Gomes, que me perguntou se tinha alguma música para oferecer, pois estava procurando o repertório para o álbum dela. Ofereci duas composições, e ela escolheu ‘Chora e aceita’. Foi uma das maiores felicidades da minha carreira como compositor quando percebi que ela tinha gostado da música e a escolheu para um álbum com tantos grandes compositores. Eu me impressionei com a qualidade da Dionisya como cantora, sua afinação e vigor em cantar. Quando ela escolhe uma música, você pode ter certeza que ela vai arrasar, foi uma aula vê-la cantar e uma experiência incrível estar ao lado dela num momento importante da carreira.”

Já o cantor e compositor Carlos Fernando Cunha conta que “conhecia” Dionysia Moreira dois ou três anos antes de descobrir que ela era cantora, mas antes disso já percebia que ela tinha algo diferente. “Eu morava no São Bernardo e ela morava perto da minha casa, e às vezes via essa senhora com umas roupas bonitas, cabelo arrumado, parecia cantora de baile, da época das rádios, e isso ficou na minha cabeça, ‘quem seria ela?’ Anos depois, quando a gente tinha iniciado as atividades do Ponto do Samba, o Márcio comentou que estava produzindo um disco da Dionysia, e, para minha surpresa, era aquela figura que eu via de vez quando no bairro.”

Ao conhecer a artista, Carlos Fernando pôde perceber que a cantora tinha tudo a ver com a figura que idealizou quando cruzava com ela pelo bairro. “O que me chamou a atenção na Dionysia foi a lembrança de um timbre de voz, um tipo de canto, os ornamentos que ela coloca na voz que a gente não ouve mais, mas que embalou minha infância quando ouvia rádio e que ouvíamos naqueles cantores mais antigos, que tinham uma preocupação maior com a afinação, um tipo de voz da época da ópera, do bel canto, que era muito forte nas décadas de 1920 e 1930”, analisa. “Ela me lembra de vozes como as de Aracy de Almeida, Francisco Alves, Orlando Silva, que cantavam boleros, serestas, sambas-canção, e isso me chamou muita atenção. É uma voz que está na nossa lembrança da música brasileira, com um repertório que pouco ouvimos hoje em dia, com compositores aqui da cidade, e a história dela me remeteu ao passado da música em Juiz de Fora, dos cantores e cantoras de rádio que ficaram esquecidos.”

A nova edição do “The Voice +”, que vai ao ar aos domingos, às 14h15, dará ao vencedor um prêmio de R$ 250 mil, além de contrato com a Universal Music para gravação de um álbum e gerenciamento de carreira. No total, o reality terá 48 participantes e será dividido em cinco fases: audições às cegas, tira-teima, top dos tops, semifinal e final, sendo as duas últimas fases transmitidas ao vivo. Da primeira fase, Dionysia já passou.

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