2022 foi um ano marcado por mudanças. Uma melhora nos casos de covid-19 fez com que o setor cultural, finalmente, visse uma luz no final do túnel. Casas foram, aos poucos, sendo reabertas. Com isso, outras tantas surgiram dando ainda mais possibilidades ao cenário artístico de Juiz de Fora. Os eventos presenciais voltaram a acontecer e possibilitaram os novos encontros que fortalecem tanto a produção artística. Teatro, música, cinema e artes plásticas voltaram a receber o público de peito aberto. Apesar das dificuldades, foi possível viver de arte e produzir arte. 2023 chega com a expectativa de ainda mais mudanças, respaldadas, sobretudo, com a volta do Ministério da Cultura, com Margareth Menezes à frente da pasta: outra luz no fim do túnel que é, por isso, um recomeço. Artistas e produtores que viveram na pele o que foi 2022 para o setor relembram os desafios desse ano que passou e projetam novos caminhos para esse outro que se inicia com vontade de, cada vez mais, viver de arte.
Bruna Schelb, diretora e roteirista
“Apesar de estarmos diante de um quadro de esperança depois de tanto tempo de incertezas e cortes, vejo que ainda há muito a ser feito pelo cinema nacional. Ainda que seja um sonho distante, um movimento importantíssimo seria o de ver mais filmes brasileiros ocupando as salas de cinema. Não só isso, mas também uma formação de público poderia ser uma prioridade por parte dos órgãos de cultura. Os curtas-metragens estão aí e um alcance maior desses produtos seria de bom proveito para todos. É sempre bom falar de sonhos.
No âmbito municipal, acredito que a divisão de recursos de leis como a Murilo Mendes poderia ser mais bem dividida para alcançar mais produções audiovisuais com orçamentos que remunerem as equipes de forma justa. Gostaria também de ver os festivais locais se preocupando em premiar as categorias técnicas das produções de Juiz de Fora e não só o que vem de fora.
Falando da minha produção, este foi um ano em que pude realizar uma série documental e em torno de 15 curtas metragens de ficção com muita liberdade criativa. Pude pensar cinema e executar cinema devido a pequenos incentivos locais e internacionais mas, sem dúvida, uma grande alegria foi poder produzir um filme em homenagem aos 100 anos da Semana de Arte Moderna através de um edital realizado pela Funalfa. ‘Klaxon e o Espírito Moderno’ foi produzido pela Filmes do Mato na locação esplêndida que é o jardim botânico da cidade e teve depois uma estreia no MAMM.
O que espero para 2023 é ver não só cinema sendo feito na cidade e no país, mas sendo visto e apreciado – tanto pelo público quanto pelos órgãos de cultura e membros da própria classe.”
Hussan Fadel, produtor, diretor, dramaturgo e um dos sócios do Beco
Para 2023, a expectativa é voltar a produzir muito. Fazer do Beco, que hoje é mais uma casa de show, uma casa de curtição e balada, muito mais que isso: um centro cultural, que é um grande desafio. Fazer ele ser polvilhado, permeado por outras atividades culturais, além da música e do show. E fazer os shows, os projetos de música, terem cada vez mais impacto através de articulações, elaborações de projetos. Conseguir projetar os artistas que participam da programação do Beco. Fazer com que eles se sintam cada vez mais parte do Beco, e fazer o Beco ser cada vez mais um farol, de impulsão e propulsão para esses projetos que a cidade tem.
Juiz de Fora tem muita gente produzindo muita coisa. É uma cidade que tem muita potência. Acho que a pandemia trouxe muita gente de volta para a cidade. Então, o Beco vem como espaço de articulação para essa potência se encontrar e pegar impulso para alçar voos maiores. A gente espera que a prefeitura tenha uma política de cultura mais efetiva. Ela acontece, mas ainda é insipiente. A gente espera mais espaços de diálogo. Acho que é conseguir estreitar a relação com o poder público de todos os níveis, para conseguir fazer essas articulações de forma mais proveitosa de forma geral, para a cidade e para os agentes culturais. E mostrar que as pessoas podem, sim, viver de arte em Juiz de Fora. Que a cidade pode ser, sim, um celeiro de artistas onde eles não precisam mais sair daqui, eles podem ficar na cidade por escolha e exercer aqui sua profissão e seu ofício. A gente espera a consolidação de tudo o que a gente veio plantando no pós-pandemia.”
Luiz Cláudio Ribeiro (Cacáudio), diretor do Cine-Theatro Central
Para o ano de 2023, as expectativas já são bem melhores. Nós aproveitamos o final de ano para lançar o edital do ‘Palco Central’, para incentivar as produções locais. Ele tem aquele formato em que público e artistas compartilham o espaço do palco. A plateia do Cine-Theatro Central se transforma no cenário das apresentações. Serão 19 datas disponibilizadas aos artistas das diversas modalidades: música, teatro, dança, literatura e multisegmentos. Além desse projeto, que foi de grande sucesso, a gente tem ainda outro edital, o “Luz da Terra”, que é para a ocupação do teatro como um todo por produções locais, que já exige delas um público maior. Em breve, a gente lança ainda o edital de ocupação geral do teatro a partir de março. Então, nós esperamos que grandes eventos, também em nível nacional, eventualmente até internacional, se apresentem na cidade, visto que o Cine-Theatro é considerado um dos principais palcos de espetáculos do Brasil. A gente espera que grandes eventos aconteçam.
Além dos editais, nós continuamos com o projeto de visita guiada, que tem tido procura grande para as visitas, que são gratuitas e podem ser agendadas no nosso site. Continuamos, também, com os projetos virtuais, através das nossas redes sociais.
Outra questão importante é que há uma tentativa nossa de aproximar cada vez mais o Cine-Theatro Central da população de Juiz de Fora, da comunidade toda da cidade. E, nesse sentido, a gente procura apoiar e incentivar a ocupação do teatro por parcelas que, comumente, não costumam frequentá-lo para assistir aos espetáculos que são pagos, às vezes por não ter condições econômicas para isso. Mas a gente procura estimular a ocupação do teatro, que é público, mantido com recursos públicos. A gente quer fazer mais essa aproximação com toda comunidade para fazer com que ela sinta que o teatro pertence a ela.”
Nara Pinheiro, musicista e compositora
“Como parte da classe artística, comecei 2022 agradecendo por estar viva, de corpo e alma, depois de um período histórico, que afetou músicos e toda a rede da cultura de uma maneira nunca vista antes. Muitos se perderam no caminho, não conseguiram sustentar e nutrir sua arte, foram privados de existir enquanto artistas e, no patamar do meu privilégio, reconheço que foi um ano de muita colheita, de muita esperança e de muitas realizações.
Posso dizer que muitas das coisas mais importantes da minha carreira profissional aconteceram este ano. Voltei a dar aulas de flauta transversa presencialmente no Conservatório de Música de Juiz de Fora; ingressei no Mestrado profissional em Música da UFRJ; venci o 21º prêmio BDMG Instrumental (sendo a única mulher e representando a produção musical do interior do estado em Belo Horizonte); fui finalista do Prêmio da Música de Minas Gerais; fiz uma campanha de financiamento coletivo para realizar os shows de lançamento do meu disco, com o apoio de 180 pessoas; realizei o pré-lançamento do meu disco no importante festival Jazz de Montanha; lancei meu primeiro single ‘Despertar’ nas plataformas de música, financiando pela Lei Murilo Mendes. Foram muitas conquistas que, para mim, retratam o reconhecimento do trabalho árduo e compromissado com a arte e a cultura. Fecho este ciclo com o lançamento do meu segundo single ‘ mago’ agora em dezembro.
Chegado o fim do ano, volto a agradecer e planejar os próximos sonhos. Eu adoraria ter mais visibilidade, reconhecimento e oportunidades na minha própria cidade. Juiz de Fora pode e deve ser um polo cultural, que valoriza os artistas locais ao mesmo tempo que proporciona intercâmbios com artistas de renome. É necessário ocupar as praças, os teatros, fomentar festivais, formar público. Não de maneira pontual, mas com ações contínuas que possibilitem a atuação e existência dos artistas na cidade, desmistificando o pensamento de que para viver de arte precisamos migrar para os grandes centros. Essas ações aliadas fortalecem a cena local, movimentam o turismo cultural na região e conectam a cidade com outros polos importantes, criando pontes entre artistas, públicos e festivais.
Em janeiro de 2023 lanço meu primeiro disco ‘Tempo de Vendaval’. Em março, me apresento no SESC São Paulo para gravação ao vivo do Instrumental SESC Brasil. Ainda não tenho datas em Juiz de Fora, mas pretendo produzir, de maneira independente, um show no Teatro Paschoal Carlos Magno e seguir um ano de dedicação à música, podendo me firmar cada vez mais, em âmbito regional, nacional e internacional como compositora, instrumentista e cantautora.”
Vinícius Cristóvão, ator e produtor cultural
Foi um ano de muitas transformações e inquietações, pelo menos no meu caminho, de reajustes de rotas e trabalhando com novidades, inclusive em relação aos shows musicais. Teve uma marca grande para mim, inclusive no teatro, porque eu estreei o espetáculo ‘EspaçoNave’, do Corpo Coletivo, que foi agraciado pela Lei Murilo Mendes. E ele foi estreado em um espaço novo, que foi o estacionamento do Moinho Zona Norte. E esse espetáculo é ainda minha grande aposta para 2023, com a intenção de fazer temporadas em outras praças, sobretudo no Rio de Janeiro. Foi o ano do teatro musical também. Em parceria com a Ana Paula Neves, eu fui o diretor do espetáculo “Godspell”, que também é um projeto para 2023, que continua forte. Vieram os shows: eu produzi shows de vários artistas, e eles foram muito fortes. Além do lançamento do filme ‘Predestinado’.
Foi a primeira vez que eu ofereci a ‘Jornada da Coragem’. A minha oficina ‘Coragem’ já tem seis anos e ela tem três módulos. E foi a primeira vez que eu ofereci esses três módulos. Foi um ano importante na minha pesquisa pessoal. E já em 2023, em janeiro, eu vou começar de novo com essa jornada.
Um dos grandes prumos neste ano, além do ‘EspaçoNave’ e da ‘Jornada da Coragem’, foi a produção do espetáculo ‘Ficções’, da Vera Holtz, que me fez reacender uma vontade muito forte de trazer novos espetáculos para Juiz de Fora, de maneira que as pessoas não vão precisar ir ao Rio de Janeiro ou São Paulo para assistir.
Eu espero muito que em 2023 eu possa estabelecer novas e ricas parcerias, porque eu vejo 2023 um ano de muita colaboração próspera, para que todas as pessoas tenham prosperidade em suas habilidades. Eu acredito que 2023 vai ser ainda difícil, mesmo com as mudanças e a volta do Ministério da Cultura, com esperança de que realmente as coisas melhorem. A gente tem a possibilidade da Lei Paulo Gustavo, que é uma realidade para nós, e da Aldir Blanc que vem de novo. Espero um ano mais colaborativo, nessa questão da rede, e mais potente, para entregar cada vez mais qualidade para o público.”