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Há mais de duas décadas em Juiz de Fora, alemã Dagmar Witt aprendeu a se reinventar todos os dias

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Sob a luminosidade natural que atravessa as janelas delicadas de sua casa, construída de maneira ímpar entre a natureza, o semblante poderoso e corajoso da alemã Dagmar Renate Witt, de 64 anos, decai rapidamente em graciosidade quando indagada sobre a primeira memória da cidade que, há 22 anos, segue conquistando seu coração diariamente. “Foi destino. É apenas o que posso dizer sobre viver aqui em Juiz de Fora. Me lembro muito bem da primeira vez que pisei aqui, porque senti algo tão bom, uma energia e uma luz tão profunda, que é algo que continuo sentindo até hoje”, afirma a aposentada que, atualmente moradora do Bairro São Pedro, não cansa de se reinventar a cada dia. Natural da cidade de Herne, no oeste da Alemanha, Dagmar já trabalhou nas mais diferentes áreas e em profissões extremamente distintas entre si, mas se encontrou ao ensinar a própria língua materna. A característica comum é que sua trajetória sempre foi desenhada pela busca do amor nos mínimos detalhes.

Natural de Herne, na Alemanha, Dagmar Witt se considera juiz-forana de coração (Foto: Felipe Couri)

Sua primeira paixão profissional, por consequência, foi a área da enfermagem, onde cuidou de muitos pacientes até decidir mudar completamente sua rotina e ambiente. “Herne era uma cidade muito industrial e com economia baseada na exploração de carvão. Mesmo assim, concluí minha primeira graduação no curso de Enfermagem no ano de 1977. Daí, atuei na área por exatos sete anos até simplesmente saturar da rotina estressante que vivia. Na Alemanha, existia uma máxima de que, em média, a enfermeira consegue ficar, no máximo, sete anos na profissão, até se esgotar e desistir de trabalhar na área. Eu não sabia disso, mas foi justamente o que aconteceu comigo – ainda mais que trabalhava na UTI. Decidi que precisava de tomar um novo rumo na minha vida.

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Com isso, resolvi visitar um amigo alemão que trabalhava como voluntário na área social aqui no Brasil, construindo postos de saúde e outras edificações no Nordeste. Em 1983, sem falar praticamente nenhuma palavra em Português, viajei para o Brasil sozinha e apenas com uma mochila nas costas. Foi aí que percebi que me apaixonei pelo país e por seu povo. Vivi experiências inesquecíveis e comecei a alimentar um amor muito grande por aqui”, rememora. Após voltar para seu país de nascença, Dagmar mudou de carreira, adentrou no meio industrial e se redescobriu em outras áreas.

Seja coincidência ou mais uma prega do destino, a vinda em definitivo de Dagmar para o país latino-americano que tanto lhe acolheu, todavia, ocorreu apenas alguns anos após, quando, em 1989, recebeu um convite para trabalhar em uma empresa francesa que possuía uma filial no Brasil. “Na época, eu era casada com meu ex-marido. Ficamos por 13 anos em São Paulo, mas eu nunca gostei muito da atmosfera de lá. A adaptação com o Português foi fácil, e em quatro meses já estava falando muito bem. Acho que isso se deve à semelhança do idioma com o Inglês e o Francês, que são línguas que falo fluentemente desde criança. No país, eu trabalhei em diversas empresas, e até mesmo cheguei a trabalhar com publicidade ao vender anúncios. E eu me saía bem nas vendas, por que muitas pessoas achavam aquela situação diferente, era uma alemã vendendo anúncios aqui no Brasil”, confidencia.

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Na mesma época, ela também teve seu primeiro contato com Juiz de Fora, ainda que sem uma mudança definitiva para a cidade. “A primeira vez que estive aqui na cidade foi para comemorar o aniversário de 30 anos de uma amiga que trabalhava no Consulado do Brasil em Berlim, na Alemanha. Ela me indagou: ‘Olha, Dagmar, vou comemorar meu aniversário em Juiz de Fora. É uma cidade que fica entre Belo Horizonte e o Rio de Janeiro. Você vai?’ E aí eu perguntei pra ela, Juiz… o que? Eu não conhecia a cidade nem por nome. Mas quando chegamos aqui, senti algo de diferente, porque a cidade me fascinou. E daí, o destino interveio novamente. Alguns anos depois, meu ex-marido recebeu uma proposta para trabalhar em uma empresa juiz-forana. Desde 2001, estou aqui e me sinto super segura e alegre na cidade. Já morei em diferentes regiões do município e senti isso em todas elas”, afirma.

Logo após sua chegada, Dagmar ingressou no universo das indústrias juiz-foranas, onde também trabalhou como gerente de logística e como diretora de uma empresa. Sendo assim, mesmo após se separar do ex-marido alguns anos depois de sua chegada em Juiz de Fora e novamente na perspectiva de se reinventar, a alemã conseguiu reencontrar o amor em outras nuances, atividades e personalidades.

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Raízes de um novo amor

À Tribuna, Dagmar e Hiram mostraram álbum de fotos que ele montou e que reúne diversos momentos da vida da esposa (Foto: Felipe Couri)

No meio de mais uma de suas aventuras profissionais, Dagmar revela que conheceu o atual marido, o fotógrafo e artista Hiram Azevedo, justamente quando decidiu comprar um restaurante italiano da cidade. “A vida me levou novamente para isso. Isso aconteceu em 2010, quando na época, um amigo me falou: ‘Olha, tem um conhecido meu vendendo um restaurante italiano, com todas as receitas inclusas. O que acha da gente comprar ele?’ E aí compramos o estabelecimento e eu comecei a trabalhar diariamente por lá. O Hiram sempre aparecia por lá, sempre pedia para ver o cardápio… e acabou me conquistando. Nos casamos na Alemanha e hoje vivemos entre essas duas culturas. Eu acho que é só o amor mesmo que permite que a gente entenda o outro, porque ele tem que me aguentar com aquele jeito mais duro, incisivo, objetivo. Mas isso acaba se equilibrando, justamente por causa do lado artístico do Hiram, tendo em vista que ele é mais idealista e eu sou totalmente pé no chão”, avalia.

Ensino como uma maneira de rememorar suas origens

Já estabelecida no município há mais de uma década e com um novo amor, Dagmar recebeu, anos depois, uma outra proposta profissional de outro amigo. A grande diferença, entretanto, é que esta seria uma chamada para aquilo que ela mais detestava até então. “Um amigo meu alemão, que também mora aqui na cidade, me pediu para que ensinasse alemão para seus filhos, para que eu fosse outra referência no convívio deles. Só que isso foi se expandindo com o passar do tempo, e quando eu vi, estava lecionando minha língua natal para diversas crianças na Painera Escola Waldorf. O mais engraçado, entretanto, é que eu nunca gostei de dar aulas, mas conforme fui trabalhando com isso, percebi que ensinar a falar alemão seria uma maneira excelente de me conectar com as minhas raízes e origens. Na pandemia, me aposentei dessa escola e atualmente trabalho dando aulas particulares de alemão, sejam elas presenciais, com alunos daqui de Juiz de Fora, ou on-line, com pessoas das mais diversas regiões do Brasil a até mesmo brasileiros que atualmente vivem na Alemanha e querem aprender melhor o idioma”, ressalta.

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‘Aqui posso ser quem eu sou’

Mesmo entre diversas idas e vindas na ponte aérea de mais de 12 horas, que interliga ambos os países do coração de Dagmar, a alemã avalia que morar no Brasil e em Juiz de Fora permite que ela se encontre em si mesma por completo, em todos os dias e momentos da semana. “Aqui posso ser quem eu sou. É um clima completamente diferente da Alemanha, seja na própria parte das temperaturas, como no comportamento das pessoas. Algumas vezes, entretanto, me senti sozinha aqui. Eu não queria ser a ‘amiga alemã’ das pessoas, mas sim uma amiga comum, sem que a minha nacionalidade fosse realçada como tal. Mas o comportamento do povo brasileiro sempre me encantou e conquistou, então essa questão acabou se equilibrando com o tempo”, rememora. Ainda acima da estigmatização, que pode perseguir estrangeiros, Dagmar realça que uma das melhores partes de retornar da Alemanha para sua nova morada é cantar a famosa música de Elba Ramalho ao pisar em Juiz de Fora: “Estou de volta pro meu aconchego, que bom é estar contigo de novo…”, canta Dagmar.

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